Deslize do real pode forçar o Brasil a elevar taxas no primeiro trimestre

Por Marco Maciel.

A política das taxas de juros do Banco Central do Brasil deve permanecer agressiva até o final deste ano e em todo o ano de 2016. A manutenção das elevadas taxas de juros reais será importante no esforço de refrear o aumento das pressões de preços e as expectativas de inflação relacionadas à deterioração da situação fiscal.

De acordo com o relatório de inflação do terceiro trimestre do país, divulgado em 24 de setembro, o Banco Central pretende manter a taxa básica em 14,25 por cento; entretanto, as novas rodadas de desvalorização do real, que já está a 4 para 1 em relação ao dólar, nos próximos seis meses pode forçar o Banco Central a retomar a escalada da taxa básica no primeiro trimestre do ano que vem, começando por 50 pontos-base.

A taxa Selic atual já está bastante alta em termos nominais. Quando comparadas à inflação projetada de 5,3 por cento para 2016 e de 4 por cento para o terceiro trimestre de 2017, as taxas de juros reais seriam de 8,5 por cento e 9,9 por cento, respectivamente.

A taxa de juros real ex-post no Brasil – resultado da taxa Selic nominal de 14,25 por cento comparada ao IPC de 2015, de 9,3 por cento, é de apenas 4,5 por cento. Ainda assim, isso não terá influência no controle da inflação entre o quarto trimestre de 2016 e o terceiro trimestre de 2017.

Na verdade, o Banco Central declarou, no relatório de inflação, estar relativamente despreocupado com a inflação este ano (que, segundo a instituição, é resultado de uma concentração de choques de preços transitórios que deve se restringir a 2015), o que significa que o comitê de política monetária está procurando controlar os efeitos dos choques de preços deste ano sobre a inflação projetada em 2016 e, principalmente, em 2017.

Essa seria uma narrativa adequada se o IPC acumulado nos últimos 12 meses pudesse convergir com tranquilidade e confiança para algo em torno de 5,0 por cento em 2016 e de 4,0 por cento no terceiro trimestre de 2017. No entanto, esse não parece ser o caso do quarto trimestre de 2016 e do primeiro semestre de 2017 ,por duas razões principais.

Em primeiro lugar, o poder executivo estabeleceu uma meta ruim e pouco convincente de superávit primário de 0,7 por cento do PIB em 2016, o que, na verdade, é menor do que o número adotado pelo Banco Central em seu modelo de meta de inflação; portanto, ele é inflacionário.

Em segundo lugar, a Standard & Poor’s rebaixou o Brasil ao lixo em 9 de setembro (e outras agências devem fazer o mesmo), em parte devido à confusão fiscal que causou mais deterioração ao spread CDS de cinco anos do Brasil e ainda mais desvalorização do real em relação ao dólar.

A taxa de câmbio brasileira deve permanecer relativamente desvalorizada e volátil, levando a choques inflacionários que farão com que a inflação dispare ainda mais do que as projeções do Banco Central para 2016 e 2017.

Além disso, com o canal de desvalorização da taxa de câmbio, um possível aumento nas taxas dos fundos federais norte-americanos, mesmo que gradual, contribuiria ainda mais para um desvio já acentuado em relação ao caminho ideal de inflação simulado pelo Banco Central.

Nesse cenário, não há outra opção para o Banco Central do Brasil a não ser garantir pelo menos a estabilidade da Selic ao longo do próximo ano, a fim de garantir a convergência do IPC para o centro da meta até 2017.

Como uma ilustração do ambiente confuso esperado para a política monetária brasileira de 2015 a 2017, os gráficos abaixo mostram a expectativa de contribuição do ajuste fiscal insuficiente e da desvalorização da taxa de câmbio para o desvio positivo do IPC em relação ao caminho de inflação ideal simulado pelo Banco Central no relatório de inflação de setembro.

Vistos juntos, os gráficos também exibem a necessidade de taxas de juros nominais elevadas, de pelo menos de 14,25 por cento ao ano, para refrear a atividade econômica e combater os choques inflacionários que a economia brasileira enfrenta atualmente.

O segundo gráfico mede as contribuições trimestrais da política fiscal e da consequente mudança na taxa de câmbio comparada à política de taxas de juros entre 2014 e 2017. Os caminhos da inflação entre o terceiro trimestre de 2015 e 2017 são simulações.

É importante perceber que, ao longo de 2015 a 2017, nossa replicação do modelo de meta de inflação do Banco Central mostra que os desvios negativos do IPC – em relação ao caminho ideal do modelo – produzidos pela alta da taxa Selic e por sua constância em 14,25 por cento são suficientes para contrabalançar os desvios positivos da inflação em relação ao caminho ideal, oriundos da deterioração fiscal e da desvalorização da taxa de câmbio.

O segundo gráfico soma o efeito líquido sobre a inflação projetada resultante dos choques sobre as três variáveis e o desvio da inflação projetada em relação ao caminho ideal simulado no modelo do Banco Central. Note que a inflação projetada se mantém acima do ideal ao longo de quase todo o período, entre o quarto trimestre de 2015 e o segundo trimestre de 2017.
 

Real_1

 

Real_2

 
Os dois gráficos abaixo descrevem os caminhos reais e projetados do balanço fiscal, a cotação R$/US$ e a taxa Selic entre 2014 e 2017 usados para gerar todas as simulações do IPC mostradas anteriormente.
 

Real_3

 

Real_4

 
Portanto, é inevitável que as elevadas taxas de juros reais e nominais no Brasil sejam realmente necessárias para produzir o desvio negativo da inflação em relação ao caminho ideal para contrabalançar a frustração com a política fiscal ruim e seus efeitos negativos.
Pior de tudo, em função das sucessivas rodadas recentes de maxidesvalorização do real em relação ao dólar, é provável que as curvas futuras de taxas de juros sejam precificadas nas altas da taxa Selic em curto prazo durante 2016. O custo econômico e social das taxas de crescimento negativas do PIB e do aumento dos níveis de desemprego neste ano e em 2016 já é esperado pelos investidores e analistas, mas a piora do cenário de inflação só aumentaria a deterioração da economia brasileira.

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