O pesadelo de um dono de pizzaria de Nova York e a bagunça que ele expôs

Por Christiana Sciaudone e David Biller.

Sei Shiroma é, para ser sincero, uma pequena parte da economia de 2 trilhões de dólares do Brasil. Imigrante nova-iorquino de 29 anos, ele é dono de uma pizzaria que fica no térreo de um prédio residencial próximo do centro do Rio de Janeiro.

O lugar tem capacidade de receber, quando muito cheio, cerca de dez pessoas. Ocorre que a saga de Shiroma como um empreendedor iniciante e a visão de mundo amargurada que essa experiência incutiu nele deixa claro um dos principais problemas que ainda incomodam a maior economia da América Latina. Pode ser extremamente doloroso abrir — e, claro, operar — uma empresa no Brasil.

Shiroma conta que os meses nos quais ele passou, no ano passado, supervisionando a construção e caçando os documentos de que precisava para abrir o restaurante foram os piores da sua vida. E ele aprendeu tanto que dá um veredicto: quando for expandir seu negócio, é bem capaz que ele vá para algum lugar na Europa em vez de tentar abrir outra pizzaria no Brasil. “Ainda estou me recuperando emocionalmente,” afirma Shiroma.

Por mais que a longa queda do Brasil na sua pior recessão em 25 anos tenha um grande número de causas macroeconômicas, a incapacidade do governo de resolver a confusão burocrática também desempenha um papel fundamental nisso, atuando como um impedimento ao investimento. É uma das diversas reformas estruturais que o país falhou em fazer durante os anos de boom na década passada, quando o preço ascendente das exportações de commodities foi capaz de cobrir os buracos na economia.

103 dias

No relatório do Banco Mundial Doing Business 2015, o Brasil está na posição 120 entre 189 nações. Isso coloca o país atrás de nações como Nicarágua, Suazilândia e Líbano. São necessários 103 dias para abrir uma empresa em São Paulo, afirma o relatório. Na Cidade do México são necessários seis dias, número que cai para 4 dias em Nova York. Já para conseguir uma licença para construir, por outro lado, o número de dias salta de 103 para 400 dias em São Paulo, mais que o quádruplo do que é necessário na Cidade do México e em Nova York.
 

pag07

 
A burocracia tem várias consequências: em 2013, os investimentos chegaram a apenas 18 por cento do PIB do Brasil, a taxa mais baixa entre as principais economias em desenvolvimento e menos da metade do valor registrado na China, de acordo com o Banco Mundial.

No coração da burocracia brasileira está a rede de mais de 13 mil cartórios, que devem assinar de tudo — de certidões de nascimento a transações do mercado imobiliário. Shiroma rapidamente caiu nessa teia.

Despachantes

Ele chegou ao Rio no fim de 2012, um ano depois de conhecer uma estudante brasileira de graduação que se tornaria sua esposa. A comida sempre esteve no sangue de Shiroma, já que ele passou boa parte da sua infância no restaurante japonês dos seus pais, no centro de Manhattan.

Ele decidiu usar essas habilidades nas ruas do Rio, criando um forno móvel que ele levava para vários lugares. Quando foi pedir uma licença de vendedor de pizzas ambulante, os órgãos da prefeitura disseram que não havia nenhuma licença para emitir e o mandaram ir embora com um conselho: só não seja pego!

Isso ficou cada vez mais difícil conforme as pizzas “Fixer” de Shiroma — com coberturas que vão de confit de alho a couve — rapidamente se tornaram mais e mais populares. Os clientes encaravam filas de 30 minutos e a multidão chamou a atenção das autoridades. A polícia do Rio fechou seu carrinho várias vezes. Estava na hora de ter uma estrutura mais formal.

No início, Shiroma tentou encarar sozinho a papelada necessária para abrir seu restaurante, contando com o auxílio dos sogros, quando necessário. Mas, na sua experiência, os tipos de documentos necessários mudavam, dependendo do órgão do governo com o qual ele estava tratando ou dos cartórios. Frustrado, ele contratou um despachante, um serviço que auxilia a navegar na burocracia.

“No início, achei que era algo meio ilegal”, disse Shiroma, com seus óculos pretos e usando um cavanhaque, enquanto tomava café no Rio no mês passado. “Mas, com o tempo, percebi que é algo cultural.”

O restaurante Shiroma’s Ferro & Farinha abriu com dois meses de atraso, no fim de novembro. Em uma tarde recente, ele cuidava do forno enquanto os clientes se espremiam em um bar em forma de L ou se sentavam nas mesas de plástico. Muitos outros esperavam do lado de fora por uma mesa.

Shiroma disse que sentiu um grande alívio no dia em que recebeu seus primeiros clientes no restaurante. “Gratificante é pouco para descrever”, ele disse. “Eu quase desisti de viver durante a construção.”

Agende uma demo.