Alternativas SOFR avançam, apesar de alertas regulatórios

Artigo escrito por Helen Bartholomew para Risk.net e licenciado pela Bloomberg.

Bancos e fornecedores de índices ainda planejam oferecer um conjunto de alternativas para substituir a LIBOR que poderão ser utilizadas em empréstimos e contratos de derivativos, apesar das recentes críticas regulatórias contra alternativas sensíveis a crédito que poderiam ser utilizadas em vez da taxa de financiamento overnight garantida, ou SOFR.

Supervisores sênior dos EUA protestaram contra o uso de benchmarks sensíveis a crédito em contratos de derivativos durante reunião do Financial Stability Oversight Council no dia 11 de junho. O presidente da Comissão de Câmbio e Valores Mobiliários (SEC, na sigla em inglês), Gary Gensler, assumiu uma posição particularmente crítica sobre o índice Short Term Bank Yield, da Bloomberg (BSBY), o qual afirmou sofrer de “muitas das mesmas falhas” da LIBOR.

Gensler alertou sobre a reprodução da “pirâmide invertida” da LIBOR – na qual US$ 200 trilhões em contratos de derivativos repousam sobre apenas US$ 1 bilhão em transações subjacentes – o que, segundo afirmou, torna a situação vulnerável à manipulação.

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Umesh Gajria, head global de produtos atrelados a índices da Bloomberg, rejeita a ideia de que benchmarks sensíveis a crédito sejam suscetíveis à manipulação. Gajria ressalta que as novas taxas dispensam o “julgamento de experts”, o que prejudicou a LIBOR, pois são construídas, em grande parte, primariamente a partir de transações de financiamento bancário, como papéis comerciais e certificados de depósito.

“Considerando que o BSBY não foi projetado para depender de informações subjetivas, é extremamente difícil manipular o índice”, afirmou. “Uma de nossas maiores exigências foi garantir que esta taxa fosse altamente robusta”.

Gajria também não acredita que a investida dos reguladores dissuadirá credores e tomadores de adotar alternativas à SOFR. “Nossos clientes estão analisando seus próprios clientes e investidores e tentando fazer a coisa certa. Para muitos, o uso do BSBY nos mercados de empréstimos é o caminho correto e está dentro das regras estabelecidas, como vimos”, afirma Gajria.

Os bancos também parecem indiferentes. Um trader sênior de taxas de um grande banco dos EUA afirmou que sua empresa continuará a apoiar pelo menos alguns benchmarks sensíveis a crédito “contanto que as taxas sejam robustas e tenham boa governança, o que acreditamos ser verdadeiro”.

Um trader de taxas de um segundo banco dos EUA afirmou que o “discurso duro” dos reguladores não deve anular a demanda dos clientes por taxas sensíveis a crédito que se assemelhem mais com a LIBOR: “É um pouco cedo para dizer, mas a impressão, até agora, é que o comportamento não está mudando sensivelmente”.

O trader sênior de taxas do primeiro banco dos EUA mencionado acima acredita que os comentários dos reguladores serviram apenas para injetar “mais confusão e incerteza no mercado a menos de sete meses até que seja necessário abandonar a LIBOR”.

Embora a LIBOR em dólares norte-americanos continue a ser publicada até junho de 2023 para uso em contratos existentes, os reguladores têm exigido que não sejam realizadas/fechadas novas operações atreladas à LIBOR após o final deste ano. Algumas fatias do mercado, porém, têm demorado a adotar a SOFR, substituta da LIBOR preferida dos reguladores, com muitos credores expressando preferência por alternativas sensíveis a crédito que reproduzem o spread do financiamento bancário e a estrutura de prazos futuros característica da LIBOR.

“Do ponto de vista da gestão de ativos e passivos (ALM, na sigla em inglês), é muito mais fácil para bancos e empresas administrarem o balanço patrimonial com taxas altamente correlacionadas com a LIBOR”, afirma Navin Rauniar, sócio da TCS, consultoria para transição da LIBOR. “Os reguladores podem fazer o barulho que quiserem, mas a menos que promulguem algo como lei federal e estadual para proibir o uso dessas taxas, nada vai mudar”.

O interesse pelo BSBY tem crescido constantemente desde seu lançamento em março, especialmente entre os grandes bancos. O Bank of America emitiu um título de seis meses de US$ 1 bilhão referenciando a taxa em abril e liderou o primeiro empréstimo sindicado vinculado ao benchmark – um crédito rotativo de US$ 150 milhões para a marca de vestuário Duluth Holdings – no mês seguinte.

O primeiro derivativo BSBY – um swap de base de US$ 250 milhões entre BSBY e SOFR – foi negociado pelo Bank of America e JP Morgan em maio. Na sequência dessas transações, foram negociados mais de US$ 1 bilhão de valor nocional em transações de swap, incluindo instrumentos flutuantes e fixos, por até 10 anos.

A Ameribor, um benchmark com base em empréstimos overnight sem garantia negociados na American Financial Exchange (AFX), também vem ganhando tração junto aos bancos regionais dos Estados Unidos. Richard Sandor, fundador e presidente-executivo da AFX, não acredita que as críticas regulatórias dirigidas aos benchmarks sensíveis a crédito vão mudar esse cenário.

“Tudo caminha como de costume”, diz ele. “Representamos todos os bancos, grandes e pequenos; todos os dias, o volume é alto e a amplitude é grande. Críticas têm sido feitas, mas nada foi imposto a bancos regionais, de médio porte, comunitários ou minoritários, aos quais a Ameribor atende”.

O Zions Bank, com sede em Utah, que possui mais de US$ 80 bilhões em ativos, comprometeu-se a começar a usar uma versão de 30 dias da Ameribor para empréstimos comerciais ainda este ano. Outras instituições regionais planejam a adoção a partir do terceiro trimestre deste ano.

Em fevereiro, o presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, disse que a Ameribor era “totalmente apropriada” para bancos que se financiam por meio da AFX ou têm custos de financiamento semelhantes aos que o fazem.

Medidas anti-manipulação

A nova geração de taxas sensíveis a crédito é sustentada, principalmente, por transações de financiamento bancário “de atacado” não garantidas, como papeis comerciais e certificados de depósito. A emissão desses instrumentos de money market caiu pela metade desde a crise financeira de 2008, pois as instituições financeiras reduziram sua dependência de financiamento de curto prazo sem garantia.

Dada a escassez de transações, os provedores de benchmarks sensíveis a crédito têm recorrido a janelas de lookback multi-day para preencher seus volumes de entrada. A versão de três meses do BSBY usa uma média móvel de três dias para atingir um limite de volume de US$ 10 bilhões. Esses dados são complementados com cotações executáveis. O período de lookback também pode ser estendido para cinco dias em momentos de baixa liquidez para dar melhor embasamento ao cálculo.

Verificações adicionais também foram incorporadas para eliminar a possibilidade de manipulação. Por exemplo, nenhum dos 34 bancos que contribuem para o BSBY pode representar mais de 20% dos volumes totais utilizados para calcular a taxa. Pontos fora da curva também são desconsiderados.

Em um cenário de teste hipotético, no qual a Bloomberg moveu as ofertas executáveis de dois dos cinco principais bancos contribuintes em 20 pontos base, o impacto foi pequeno. No lado negativo, a taxa de três meses foi alterada em menos de 1pb; no lado positivo, a alteração foi de menos de 0,4pb.

Especialistas em benchmarks afirmam que a manipulação do BSBY e de índices semelhantes exigiria conluio não apenas entre vários bancos, mas também entre traders e departamentos de tesouraria responsáveis pela emissão primária. Mesmo assim, os preços usados para calcular os benchmarks refletiriam transações de financiamento reais, em vez de cotações indicativas.

“Mesmo que vários bancos realizassem grandes transações off-market, isso não manipularia a taxa”, diz Gajria. “Se todos os bancos do mundo estão emitindo papéis comerciais a uma taxa específica, esta é a taxa de mercado”.

Críticas mais intensas

Alguns representantes do mercado suspeitam que o tom áspero na reunião do FSOC (Financial Stability Oversight Council) pode ter tido como objetivo evitar a adoção de benchmarks sensíveis a crédito até que uma taxa SOFR de prazo futuro esteja disponível.

Em março, o Alternative Reference Rates Committee (ARRC), grupo apoiado pelo Fed e encarregado de fazer a transição dos mercados dos EUA rumo ao fim da LIBOR, declarou que não seria capaz de cumprir a meta, prevista para junho, quanto à recomendação de uma taxa SOFR a prazo. Menos de dois meses depois, o grupo CME foi confirmado como fornecedor oficial dessa taxa. Agora, há um endosso previsto para agosto, coincidindo com a “SOFR first”, iniciativa destinada a fazer com que os dealers utilizem a SOFR ao cotar swaps de dólar no mercado de corretagem.

No entanto, ainda não está claro quão amplamente uma SOFR a prazo poderá ser utilizada nos mercados à vista, ou se estará disponível para instrumentos de hedge de derivativos.

“Resta uma porção significativa do mercado que precisa de uma taxa a prazo e, se a SOFR não oferecer uma que possa ser amplamente utilizada, as pessoas procurarão alternativas”, afirmou o primeiro trader de taxas mencionado acima.

As críticas aos benchmarks sensíveis a crédito também surgem à medida que os reguladores se inquietam diante da fraca liquidez da SOFR. Em maio, apenas 6,9% do volume de swaps de dólar americano por risco negociado tinha como referência a taxa substitutiva favorita dos reguladores. Este número pode até ser exagerado em comparação com a atividade real, uma vez que os swaps de base SOFR/fundos fed constituem uma grande parte dos volumes atuais.

Embora os reguladores dos EUA tenham apoiado firmemente a SOFR, algumas autoridades tiveram o cuidado de não descartar alternativas. Em 11 de maio, durante simpósio sobre a SOFR, John Williams, presidente do Federal Reserve Bank de Nova York, declarou que os reguladores se sentiriam confortáveis com um ambiente de taxas múltiplas, contanto que fosse construído sobre uma base SOFR sólida. “Com essa base firmemente instituída, podemos construir uma ‘casa’ com uma variedade de taxas de referência que podem atender às necessidades específicas de tomadores e credores específicos”, afirmou.

Em seu documento oficial de FAQ’s (perguntas frequentes), o ARRC também afirma seu apoio a um “mercado vibrante e inovador com taxas de referência robustas, em conformidade com a International Organization of Securities Commissions (Iosco) e disponíveis para uso antes do final de 2021”.

Matt Hoffman, diretor da Chatham Financial, diz que embora os reguladores tenham intensificado as críticas, seus comentários recentes são consistentes com a postura mais ampla que adotaram até agora. “Embora tenha havido um reconhecimento de que pode haver cenários variados nos quais diferentes taxas farão sentido, especialmente porque as taxas sensíveis a crédito continuam a se desenvolver, não é surpreendente ver o ARRC gradualmente intensificando a mensagem de que é realmente a SOFR que eles acreditam ser a referência mais apropriada”.

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