Por Lisa Abramowicz.
Neste ano, os investidores despejaram US$ 19,2 bilhões em fundos dedicados a dívidas de mercados emergentes denominadas em moeda local, o maior volume de entradas desde 2010, o que ajuda a embalar algumas das maiores taxas de retorno em registro.
Existem algumas razões fundamentais para os compradores de títulos darem preferência a esses papéis. Por exemplo, a desaceleração da inflação em alguns desses países, como Brasil e Colômbia, abrindo espaço para os bancos centrais cortarem juros, o que costuma impulsionar os mercados de renda fixa.
Porém, por trás dessa valorização ampla e do maior fluxo de recursos para esses mercados, há um motivo bem mais simples: o dólar desvalorizado, que faz com que as moedas de nações emergentes pareçam bem mais fortes. As oscilações cambiais são responsáveis por boa parte do retorno de 10,9 por cento apurado no acumulado do ano, segundo o índice Bloomberg Barclays Global EM Local Currency Government Universal. Vale lembrar que uma cesta de moedas de países emergentes avançou 9,6 por cento em relação ao dólar em 2017.
Ou seja, esse segmento cada vez mais popular do mercado de títulos se tornou uma aposta de bilhões de dólares baseada na moeda americana. A valorização do dólar poderia facilmente corroer essas taxas de retorno e provocar a reversão desses fluxos. Afinal, os investidores têm motivos de sobra para preocupação quando avaliam cuidadosamente os fundamentos de países que representam boa parte dos índices que acompanham títulos de mercados emergentes denominados em moeda local. E esses papéis são negociados com menor frequência do que os títulos dos mercados desenvolvidos, tornando-os mais suscetíveis à volatilidade.
Tomando como exemplo a China, que representa 31 por cento do índice acima. A segunda maior economia do mundo segue crescendo de modo consistente, mas faz isso às custas da maior alavancagem do sistema financeiro. Se a classificação de risco da China for rebaixada, os efeitos se espalhariam por toda a Ásia, incluindo países como a Malásia, responsável por 3,3 por cento das dívidas que compõem o índice. Já a Índia, responsável por 18,4 por cento, enfrenta alta da inflação — o que pressiona seus títulos — e seus bancos se deparam com o aumento dos créditos de recebimento duvidoso.
O argumento central não é que esses países e suas dívidas são aposta fracassada, mas sim que os riscos não foram embora. Além disso, os investidores estão recebendo menos para deter esses ativos: o rendimento médio caiu de 4,9 por cento em maio para 4,7 por cento, segundo dados da Bloomberg Barclays.
Paralelamente, as nações emergentes estão emitindo dívidas em ritmo recorde para aproveitar a queda dos custos de captação. A quantia em títulos de mercados emergentes denominados em moeda local mais que dobrou nos últimos sete anos, chegando a US$ 4,4 trilhões. Isso torna esses países mais vulneráveis a dificuldades caso sejam forçados a refinanciar suas dívidas quando as condições de empréstimo forem menos generosas.
Boa parte do dinheiro fluindo para títulos de mercados emergentes simplesmente está perseguindo a apreciação das moedas dos países emissores. Essa situação pode se reverter bem mais rápido do que a conjuntura econômica. Os investidores podem estar jogando em um cassino sem se darem conta.
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