Bill Gross penetra na mente do Fed para explicar ânsia por aumentar taxas de juros: Noah Smith

Por Noah Smith.

O mercado acionário da China desmoronou. O calote da Grécia é uma certeza. O euro aparenta instabilidade. Os dados econômicos dos EUA estão fracos. A inflação está abaixo da meta. Então, como é possível que o Federal Reserve (Fed) esteja caminhando para elevar as taxas de juros, uma medida que normalmente visa desacelerar uma economia sobreaquecida?

Segundo um discurso recente pronunciado pela presidente do Fed, Janet Yellen, o aumento das taxas é iminente:

“Acredito que será adequado dar o primeiro passo para aumentar a taxa de fundos federais em algum momento deste ano e assim iniciar a normalização da política monetária”, disse Yellen, em comentários preparados. “Quero enfatizar que o rumo da economia e da inflação continua extremamente incerto, e acontecimentos imprevistos poderiam adiar ou desacelerar este primeiro passo”.

Bill Gross, o ex-rei dos bonds da Pimco, tem uma teoria sobre por que isso está acontecendo. Ele diz que o Fed, basicamente, precisa elevar as taxas de juros apenas para demonstrar que a economia dos EUA não precisa de taxas baixas para funcionar.

Talvez Gross tenha razão em algo. Enquanto o Fed avalia se vai aumentar as taxas, uma discussão muito mais teórica está ocorrendo nos salões do âmbito acadêmico. A questão principal é: “O que aconteceria se um banco central fixasse as taxas de juros em um determinado patamar para sempre?”.

A resposta tradicional à essa pergunta – a resposta adotada pelos neokeynesianos, a escola dominante dentro da macroeconomia – é que a economia se tornaria instável. Se o Fed estabelecer uma taxa de juros muito baixa, acabaremos tendo uma inflação desenfreada. Se fixar a taxa muito alta, a economia vai acabar colapsando e teremos uma deflação descontrolada.

Agora, isso não soa tão louco, se você parar para pensar. Um vínculo com a taxa de juros é um controle dos preços, pois as taxas de juros são o preço pago por tomar dinheiro emprestado. Não é uma loucura pensar que se o governo tentasse preservar um preço fixo em um mercado pela eternidade, ele acabaria produzindo distorções ou que esse mercado deixaria de funcionar.

Mas suponha que a economia não exploda. Então o que aconteceria? Um pequeno grupo de macroeconomistas, entre eles John Cochrane, da Universidade de Chicago, vem argumentando que um atrelamento permanente à taxa de juros deve acabar fazendo com que a taxa de inflação se mova na direção da taxa de juros. Em outras palavras, se o Fed mantiver as taxas de juros baixas para sempre, a inflação vai acabar baixando e ficando baixa. Esta ideia, chamada neofisherianismo (porque se baseia na equação de Fisher), ameaça virar de cabeça para baixo tudo o que sabemos sobre políticas monetárias. Se as taxas baixas de juros provocam uma inflação baixa, em vez de uma alta, isso significa que o Fed – e todos os bancos centrais do mundo – estão fazendo tudo errado.

No Summer Institute, do National Bureau of Economic Research, a ideia foi rejeitada por uma figura muito importante. Michael Woodford, tal vez o economista monetário mais influente do mundo, deu uma palestra para explicar porque ele acredita que os neofisherianos estão errados.

Basicamente, o argumento de Woodford é o seguinte. A ideia neofisheriana se baseia muito na noção de que as pessoas na economia são hiper-racionais – que elas são capazes de fazer uma sequência infinita de cálculos nas suas mentes. Woodford mostra que se a capacidade das pessoas de processar informação for até mesmo minimamente limitada – mesmo que apenas um pouquinho! – o resultado neofisheriano se inverte, e não há forma de que o Fed mantenha uma taxa de juros fixa durante toda a eternidade. Ele mostra que se as expectativas forem ajustadas às mudanças da realidade com um grau até mesmo mínimo de imperfeição, então o resultado neokeynesiano – que uma taxa fixa acabaria fazendo com que a economia desmoronasse – é o único possível (pelo menos, dentro da classe de modelos com os quais os bancos centrais trabalham hoje).

Isto não satisfez Cochrane. Ele, como muitos macroeconomistas, acredita que as expectativas perfeitamente racionais e infinitamente inteligentes sejam o único caminho possível na macroeconomia. Mas a maioria das pessoas provavelmente acha que a economia não é infinitamente inteligente nem infinitamente racional. Vai ser interessante ver como Cochrane e os neofisherianos vão responder a Woodford.

De qualquer modo, essa polêmica acadêmica provavelmente nos permita entender melhor a ânsia do Fed por elevar as taxas de juros acima do zero. Na verdade, não sabemos o que de fato acontecerá se tentarmos manter as taxas de juros fixas em um determinado patamar para sempre. Se os neofisherianos estiverem certos, obteríamos uma inflação permanentemente baixa ou até a deflação, como a que o Japão já tem há duas décadas. Se Woodford e os neokeynesianos tiverem razão, isso provocaria uma inflação explosiva. Ambos os resultados são ruins.

Portanto, o Fed não vai esperar para descobrir quem está certo. Melhor, na concepção dos altos funcionários do Fed, é levar as taxas de novo para o território positivo, onde eles têm margem para modificá-las em qualquer direção. Em outras palavras, a interpretação de Gross sobre o Fed não parece nem um pouco desvariada.

Esta coluna não necessariamente reflete a opinião do conselho editorial da Bloomberg LP nem de seus donos.

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