De políticos para políticas: Guia para mercados da América Latina em 2019

Por Aline Oyamada e Ben Bartenstein.

Os dois maiores mercados da América Latina começarão 2019 nas mãos de novos presidentes populistas que prometem derrubar décadas de políticas de consenso em um esforço para revitalizar o crescimento e aumentar a confiança dos investidores.

No México, os operadores estão observando se o presidente Andres Manuel Lopez Obrador transforma a retórica da campanha em realidade política após sua opção por referendos para decidir projetos de investimento provocar um selloff no peso. Em contraste, Jair Bolsonaro, no Brasil, cortejou os mercados quando escolheu Paulo Guedes como seu consultor econômico, levando o Ibovespa a um recorde histórico. No entanto, persistem preocupações sobre a sua capacidade de aprovar uma reforma do sistema previdenciário no próximo ano, o que será fundamental para a continuação do rali.

Ações e moedas da América Latina estão caminhando para o pior ano desde 2015, juntando-se a um selloff nos mercados emergentes, já que a preocupação com as perspectivas para o comércio global e a desaceleração econômica pesaram sobre o sentimento dos investidores. Enquanto a escalada das tensões comerciais ameaça aumentar ainda mais a volatilidade dos ativos de risco, as perspectivas de um dólar mais fraco e uma pausa no ciclo de aperto do Federal Reserve podem trazer alívio para os mercados locais. A questão-chave para 2019 continua sendo se os líderes regionais promoverão medidas para impulsionar o crescimento.

É bem mais provável haver disparada dos mercados emergentes no começo de 2019 do que mais para o final do ano, quando as atenções começarão a se voltar para um possível desaquecimento da economia americana, segundo o economista-chefe do Goldman Sachs Group para a América Latina, Alberto Ramos. Para ele, haverá recuperação para a maioria dos ativos de nações em desenvolvimento após a turbulência de 2018, porém o retorno será baixo. Os investimentos favoritos dele em 2019 incluem ações de países em desenvolvimento com hedge contra ações de países que não os EUA, além do peso colombiano e do real.

Para Ramos, “a maior questão” no Brasil é a governabilidade. No México, ele espera que López Obrador não “balance o barco e em vez disso pense em como aumentar o potencial de crescimento no longo prazo.”

Brasil

A prioridade para os investidores é a reforma da previdência e qualquer decepção neste sentido inevitavelmente azedará o humor nos mercados. A reforma é considerada essencial para reduzir o déficit e conter o aumento da dívida pública, quadro que levou à perda do grau de investimento em 2015. Bolsonaro quer que o Congresso vote uma proposta no primeiro semestre.

A expectativa é que o novo governo venda dezenas de estatais, desregulamente vários setores e reduza impostos para atrair capital e criar empregos. O otimismo dos investidores em relação à agenda de Bolsonaro aumenta a cobrança sobre a equipe recém-formada por Guedes, que tem bastante credibilidade entre os profissionais do mercado financeiro.

“Se houver reforma da previdência já em fevereiro ou março, como alguns dizem, isso seria extremamente positivo para os mercados”, disse Laurence Bensafi, gestor de fundos da RBC Global Asset Management, em Londres. Ele comprou ativos brasileiros depois que conheceu Guedes, em setembro. “Assim que a votação ficar para trás, poderemos ver muitos investimentos que ficaram basicamente paralisados durante quatro anos.”

México

López Obrador é o primeiro líder de esquerda a comandar o país em décadas. Para os gestores de carteiras, ele representa o maior risco e o maior potencial de retorno. Mesmo antes de assumir o cargo, ele abalou os mercados ao anunciar que, após consulta pública, cancelaria um projeto já em andamento de US$ 13 bilhões para construção de um aeroporto. Ele seguiu adiante com essa abordagem e realizou referendos sobre 10 outras propostas, incluindo uma refinaria de US$ 8 bilhões, o trem da rota maia e programas sociais que, segundo analistas, podem prejudicar a posição fiscal do país. Negociações com detentores de títulos da dívida do aeroporto também são acompanhadas com atenção por investidores, que tentam entender como serão tratados pelo novo governo.

Mas o ruído talvez signifique oportunidade para investidores interessados em entrar em um dos países mais estáveis da América Latina. A queda de 16 por cento do mercado acionário neste ano criou valor e, se López Obrador cumprir a promessa de estimular o crescimento após décadas de medidas ortodoxas, os investidores podem ter surpresas positivas. No entanto, os primeiros dias da presidência sugerem um caminho tortuoso adiante.

Argentina

Mauricio Macri encara uma eleição em outubro, enquanto o país enfrenta sua segunda recessão em três anos e provavelmente outro período de intensa depreciação cambial. A queda do apoio político antes da votação pode impedir que o Congresso aprove as mudanças que os mercados pedem.

Se a popularidade da ex-presidente Cristina Fernandez de Kirchner aumentar e a aprovação a Macri diminuir mais, investidores exigirão prêmio ainda maior para deter ativos argentinos, alertou Josephine Shea, gestora de carteiras da Standish Mellon Asset Management, em Boston.

Venezuela

Para quem investe na Venezuela, o consolo é saber que as coisas não podem piorar tanto após o quinto ano de recessão — o pior desempenho por qualquer país fora de um período de guerra. Mas nada indica que o sofrimento vai terminar. O presidente Nicolás Maduro inicia um novo mandato de seis anos em janeiro, após o governo dar calote de mais de US$ 7 bilhões. Comentários sobre a possibilidade de intervenção militar — por oficiais da reserva, por Donald Trump e até pelo filho de Bolsonaro — criaram a perspectiva de alguma figura favorável ao mercado assumir o comando. No entanto, com emigração em massa, repressão e colapso econômico, há menos críticos de Maduro capazes de participar.

Colômbia

Investidores esperam para ver se Iván Duque conseguirá estabilizar a dívida pública e cumprir a meta para o déficit. Segundo Lisa Schineller, diretora-gerente de notas soberanas da S&P Global Ratings, o governo precisa implementar uma combinação de aumento de impostos ou corte de gastos até 2020.

“O maior risco na Colômbia é o governo não gerar crescimento econômico suficiente para lidar com os déficits gêmeos”, disse Shea. “Em última instância, pode ser forçado a enfrentar antes do esperado uma reforma de verdade na previdência e na seguridade social. Na maioria dos países, reformas desse tipo são politicamente difíceis.”

Chile

Os riscos todos no Chile se resumem à China, destino de metade do cobre e de quase um terço das exportações totais do país sul-americano. A China ultrapassou os EUA e hoje é a maior parceira comercial do Chile. Se a guerra comercial entre EUA e China se agravar e limitar o crescimento da economia chinesa, o preço do cobre vai cair e reduzir a renda gerada pelo metal que responde por quase metade das exportações. A demanda externa por outros produtos tradicionais chilenos – vinho, frutas, salmão e celulose – também diminuiria.

Peru

A cruzada contra a corrupção pode abrir novas frentes no ano que vem, se o acordo pendente com a Odebrecht envolver mais políticos e empresários. O presidente Martin Vizcarra lidera a luta contra esquemas de propina e ganhou apoio popular, mas se a opinião pública não ajudar, ele não tem partido político ou base eleitoral na qual se apoiar, o que pode abalar a confiança dos investidores. A retomada dos protestos contra mineradoras ou uma queda no preço do cobre podem ameaçar esses investimentos, que seriam o motor do crescimento econômico nos próximos anos.

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