Por Mohamed A. El-Erian.
Depois do alívio inicial dos mercados com o fato de o eleitorado francês ter rejeitado a candidata presidencial Marine Le Pen, da Frente Nacional, em meio a uma onda sem precedentes contra o status quo na Europa e nos EUA, o foco passará para como o relativamente novato Emmanuel Macron conseguirá governar um país acostumado à política tradicional. E as questões não envolvem somente revigorar a economia francesa e cooperar com a Alemanha para liderar a modernização da Europa. Também existe uma questão maior e com consequências mais amplas: até que ponto as rupturas políticas endógenas abrirão caminho para melhora da governança econômica no Ocidente ou criarão o terreno fértil para um choque político maior.
Além das reações imediatas, muito dependerá das consequências da chacoalhada no “establishment” que reflete a profunda satisfação dos mais jovens. Metade deles votou no primeiro turno em candidatos extremistas: Le Pen na direita e Jean-Luc Melenchon na esquerda.
Isso destaca os desafios adiante de Macron, que, há poucos meses, tinha poucas chances de se sobressair entre tantos presidenciáveis. Ele herda um país dividido que, embora tenha rejeitado o extremismo, continua bastante insatisfeito com um sistema que há muitos anos produz crescimento econômico baixo, desemprego elevado entre os jovens e desigualdades alarmantes.
Eleito Macron, os mercados agora vão ficar de olho na capacidade dele de superar impasses domésticos e no continente. Antes das eleições parlamentares, em junho, o primeiro-ministro que ele escolher vai sinalizar como ele pretende conviver neste meio, tentando reativar as forças da França em uma Europa que ele deseja ver mais coerente e focada na expansão econômica. Macron precisará cooperar com uma Assembleia Nacional cujos partidos tradicionais acabaram de sofrer derrotas humilhantes nas urnas.
É um desafio parecido com o enfrentado por outros líderes do G7 que chegaram ao poder surfando a onda contra o sistema: o presidente americano, Donald Trump, e a primeira-ministra britânica, Theresa May. Esses três líderes concordam que a economia pode – e deve – se beneficiar de alíquotas tributárias menores para as empresas e da redução do tamanho do Estado. Eles também concordam que a regionalização e a globalização – assim como a evolução da identidade nacional — precisam dar mais atenção a quem saiu perdendo na economia (tanto de fato quanto apenas em sua percepção), mesmo que esse número de pessoas seja menor do que o dos beneficiários.
De modo mais amplo, a ascensão de Macron-May-Trump faz parte de uma ruptura histórica no funcionamento da política tradicional no mundo desenvolvido. E faz parte da tendência de diminuição da confiança, credibilidade e eficácia do sistema — e não só no setor público.
Ninguém sabe se esses três líderes conseguirão trabalhar com parlamentares para aumentar a produtividade, o crescimento e criar economias de mercado mais inclusivas. Muito dependerá da reação das instituições que mantêm o controle de boa parte do setor público e do setor privado.
A vitória de Macron não é uma derrota decisiva do movimento contra o sistema, mas apenas uma parada em uma jornada cujo destino permanece incerto.
Se a ruptura política que a França e outros países ocidentais atravessam produzir crescimento maior e mais inclusivo, isso marcaria a revitalização das democracias liberais em uma relação amigável com o mercado. Se não der certo, é questão de tempo até a França estar lidando com uma Frente Nacional aceita por uma parcela grande da população, com forças mais arraigadas contra o sistema e com mais gente acreditando que a zona do euro é coisa do passado, não do futuro. Tal desfecho desestabilizaria os mercados.
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