Por David Fickling.
Nós erramos nas previsões sobre o carvão.
A queda dos estoques nos portos chineses pode não ser suficiente para incendiar o mercado, afirmou o Gadfly em fevereiro. Mas, ao contrário, depois de os preços subirem cerca de 42 por cento, no mês passado as autoridades econômicas da China ordenaram o aumento da produção de suas minas locais para comprimir o boom. A perspectiva de um cartel de compradores deveria conseguir fazer com que os preços voltassem a cair para uma faixa entre US$ 50 e US$ 60 por tonelada, afirmou o Gadfly.
Pois é…
É bastante simples ver o que aconteceu: a enxurrada de oferta interna prometida não está ocorrendo, e provocou um aumento da demanda e dos preços do produto importado.
A maior mineradora de carvão do país, a China Shenhua Energy, conseguiu aumentar a produção em 14,4 por cento em setembro em relação ao ano anterior, revertendo um declínio registrado nos oito meses anteriores, mas o resto da indústria doméstica não foi tão ágil.
A China Coal Energy, a segunda maior mineradora em vendas, viu uma redução de 11 por cento nos volumes de produção em setembro. Na Shaanxi Coal Industry, a produção nos três trimestres encerrados em setembro caiu quase 18 por cento. Na Yanzhou Coal Mining, o volume caiu 6,8 por cento, apesar de uma pequena recuperação no trimestre terminado em setembro para uma queda de 2,9 por cento em relação ao ano anterior.
Ao todo, em setembro a produção doméstica de carvão bruto foi de apenas 244 milhões de toneladas, a quantidade mensal mais baixa, com exceção da temporada do Ano-Novo Lunar, desde 2009. Os carregamentos de carvão dos vagões de trem são ainda mais sombrios, tendo atingido os níveis mais baixos registrados desde 2005 – fato que sugere que o carvão que está sendo vendido é aquele que está mais perto das usinas de energia e que muitas vezes pertence à própria companhia.
Para aumentar a produção de carvão não é só girar uma chave ou apertar um botão. As mineradoras chinesas estão presas a restrições sobre o número de dias que têm autorização para operar e basicamente pela geologia: se você está extraindo carvão de um filão estreito, não é possível fazer aparecer um filão mais grosso na rocha como por encanto.
Em princípio, isso parece uma excelente notícia para quem vende carvão para a China e uma má notícia para o clima global. As emissões do carvão por unidade de energia são as mais altas entre as dos combustíveis fósseis, porém, ele foi o material sujo cujo preço mais subiu após a conferência de Paris no ano passado ter, finalmente, conseguido elaborar um acordo para limitar as emissões.
Desde o encerramento da conferência em 12 de dezembro, o carvão térmico no porto australiano de Newcastle aumentou 89 por cento e o petróleo bruto Brent subiu 32 por cento, ao passo que o preço dos contratos japoneses de importação de GNL caiu 23 por cento e os módulos solares recuaram 29 por cento.
No entanto, é preciso fazer uma ressalva importante. Preços altos nos mercados de commodities são um sinal ainda menos confiável de desempenho futuro do que as ações. Na maioria das vezes, eles indicam desequilíbrios de curto prazo entre a oferta e a demanda, que serão eliminadas quando produtores e consumidores começarem a reagir aos sinais de preços dos traders.
Sob uma perspectiva de consumo, e não de preços, o petróleo vai bastante bem. Os 96 milhões de barris por dia extraídos em julho foram um recorde nos 13 anos de dados do Departamento de Energia dos EUA.
O cenário do carvão não é tão promissor. Na China, o declínio da produção doméstica em setembro acarretou uma queda de 20 por cento da demanda aparente em relação a um ano antes. Nos primeiros nove meses deste ano o país consumiu cerca de 311 milhões de toneladas a menos do que no mesmo período de 2015 – quantidade equivalente a quase um quarto do comércio global de carvão, o que coloca Pequim na rota para cumprir sua meta de cinco anos de reduzir 500 milhões de toneladas por ano até 2020. O país está parando as obras de novas usinas a carvão que começaram a ser construídas neste ano e impondo restrições em todas as suas províncias, menos em quatro, para conter o excesso de capacidade projetado.
O cenário em outros grandes importadores é parecido. A demanda na Coreia do Sul caiu neste ano e o país espera que esse padrão continue, o ministro de Energia da Índia está pressionando para que as usinas de energia parem de importar carvão e a demanda mais saudável do Japão está sendo apoiada somente por demoras na reativação de suas usinas nucleares após o desastre de Fukushima em 2011.
Afinal de contas, a característica de um mercado de commodities maduro é ter preços estáveis, e não aumentando. A natureza global do petróleo e sua rede de operadores, produtores, tanques de armazenamento e reservas estratégicas significam que ele não oscila tanto quanto commodities menos negociadas, como o lítio ou as terras raras – ou o carvão.
À medida que a demanda pela fonte de energia mais suja diminuir – primeiro como fatia do mix de energia mundial, mas logo em termos absolutos – é muito provável que as defasagens entre oferta e demanda se tornem mais frequentes e provoquem quedas e aumentos de preços como o que estamos vendo agora.
A volatilidade é uma boa notícia para os traders e provavelmente haverá uma janela nos próximos meses, quando os preços se mantiverem altos antes de a demanda chinesa cair por volta do Ano-Novo Lunar e a oferta das minas domésticas finalmente chegar ao mercado. Mas aguente firme, porque o caminho está cheio de buracos.
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