Por Fabiana Batista e Rachel Gamarski.
Em meio à superação dos escândalos de corrupção, o impeachment de um presidente e a recessão, os brasileiros estão discutindo ainda a importação de café, enquanto é o maior produtor do mundo da commodity.
A ideia não tem sido bem recebida pelos produtores do sudeste, responsáveis pelo império do café no Brasil. “Eles querem nos matar”, disse Antonio Joaquim de Souza Neto, fazendeiro de segunda geração no Espírito Santo. Algumas regiões do Brasil foram fortemente atingidas por anos de seca, mas ainda há abundância do produto para ser ofertado ao mercado interno, argumenta. “Não vamos permitir que esse café entre no Brasil”, disse.
Os produtores de café robusta, que está em questão, não tiveram a mesma sorte dos fazendeiros que produzem café arábica e tiveram uma excelente safra no ano passado.
O café robusta é usado para fazer café instantâneo como os que a Nestlé e outras empresas fabricam e exportam para o mundo. Enquanto o governo discute com o setor se irá permitir ou não a importação da matéria prima, essas companhias se preocupam com os efeitos da seca nas produções de robusta e pressionam o Ministério da Agricultura para que o Vietnã possa vender o produto ao Brasil.
Após pressão por parte dos produtores, o presidente Michel Temer chegou a suspender o processo temporariamente um dia depois de anunciar a importação, em fevereiro. Em meio a dois poderosos lobbies por parte da indústria e dos produtores, Temer ainda não se posicionou sobre qual decisão irá tomar, mas pessoas familiarizadas com o tema afirmaram, na semana passada, que o governo deverá liberar a compra do produto do Vietnã.
O governo ainda conversa com os dois lados, mas a alta cúpula do Brasil precisa administrar diversos problemas como a operação Lava Jato, que atingiu diversas esferas do poder.
No mês passado, mais de 40 países restringiram temporariamente ou proibiram a importação de carne do Brasil após denúncias de corrupção por parte dos funcionários responsáveis pela inspeção das proteínas, que chegaram a ser acusados de liberarem a venda de produtos contaminados.
Enquanto isso, o governo tem trabalhado para seguir com os projetos de recuperação econômica. “É uma pena que o País perca tempo nisso quando tem vários problemas”, disse Evair Vieira de Melo, congressista do Espírito Santo e aliado dos produtores de café robusta do seu estado. “Durante meses, tenho realizado reuniões em ministérios para tentar corrigir essa ideia absurda de importar café no Brasil”.
As políticas protecionistas do Brasil colocam, de fato, seus fabricantes em desvantagens em relação aos concorrentes estrangeiros, que podem comprar grãos de qualquer país que escolherem, disse Pedro Guimarães, diretor comercial da Cia. Cacique de Café Solúvel, fabricante de café instantâneo. Segundo ele, os agricultores de robusta do Brasil não serão capazes de entregar o que é necessário na safra nova safra que começa em maio. “A safra de robusta brasileira ficará fraca este ano pela terceira temporada consecutiva”, disse. “A escassez continuará a ser um problema”, garantiu.
Do outro lado, os produtores rebatem. “Temos estoque e garantimos que vamos entregar o café exigido aos mesmos preços oferecidos pelo Vietnã”, diz Melo, congressista do Espírito Santo, maior estado produtor de robusta do Brasil. No ano passado, a produção de robusta caiu para patamares que não eram verificados há 12 anos, menos de 8 milhões de sacas de 60kg. O governo prevê para 2017 uma produção 21% maior, resultado que ficará, no entanto, abaixo da média registrada desde 2010.
A história mais uma vez se repete. No ano passado, o governo tentou importar café do Peru para blends especiais. Os produtores não precisaram de muito tempo para ganhar essa batalha. A decisão foi revertida poucos dias depois.
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