Notícia exclusiva por Josué Leonel, com a colaboração de Alex Lima.
A Argentina vive o efeito “Cristina pelas costas”, diz o economista Fábio Giambiagi. Desde um ano atrás, investidores vinham dizendo que voltariam a apostar nos ativos do país, que são vistos como baratos, assim que tivessem certeza de que Cristina Kirchner deixaria o governo. Para o Brasil, com o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff já iniciado, movimento semelhante é esperado, mas não já.
A bolsa Argentina subiu 30% em dólar este ano, antecipando o efeito-Macri, 3º maior ganho entre 93 principais índices mundiais acompanhados pela Bloomberg . No mesmo período, o Ibovespa caiu 38% em dólar. No mercado de títulos, enquanto as taxas dos papéis brasileiros de 10 anos seguem em alta com a deterioração fiscal, as dos papéis argentinos caem desde meados de agosto, quando chegaram a passar de 10%.
Investidores no Brasil também contam com uma transição política que injete ânimo na economia e nos mercados, diz Vladimir Caramaschi, estrategista-chefe do Crédit Agricole no Brasil. A possibilidade de o vice-presidente Michel Temer substituir Dilma passou a ser vista com maior otimismo depois que ele divulgou o programa “Uma Ponte para o Futuro”, com propostas de reduzir a carga tributária e rever as regras da Previdência. Para Caramaschi, o programa foi “música para os ouvidos do mercados”.
A possibilidade de o STF adiar a definição do processo de impeachment não agrada o mercado, pois o prolongamento da tensão significa também adiamento da retomada dos investimentos. Uma definição do cenário, deve gerar um aumento forte da confiança, diz Caramaschi, com a perspectiva de mudança falando mais alto do que a crise da economia.
Juan Jensen, sócio da consultoria 4E em São Paulo, considera uma desvantagem do Brasil hoje em relação à Argentina a falta de unidade na equipe econômica, com disputas entre a Fazenda e o Planejamento. Isso poderá se resolver, observa ele, se forem confirmadas as especulações de que Henrique Meirelles poderá ir para Fazenda, seja em um eventual governo Temer ou substituindo Levy, caso Dilma permaneça no poder. A expectativa é de que Meirelles só assumiria a Fazenda se pudesse ter comando total da área econômica.
O otimismo com Macri tem razão de ser, mas seu desafio será “hercúleo”, diz Giambiagi, brasileiro que viveu na Argentina até os 14 anos. O novo presidente conta com a boa vontade dos investidores, mas terá de reverter políticas populistas com medidas que, ao menos inicialmente, devem ser impopulares, como reduzir subsídios de energia, mudar a política fiscal, combater uma inflação “que ninguém sabe quanto é” e mudar o câmbio.
As incertezas sobre possível mudança no regime cambial têm impedido que o peso acompanhe o rali da bolsa Argentina. Há uma expectativa de que a moeda se desvalorize assim que o governo Macri retirar os entraves a uma maior flutuação, o que poderia afetar o Brasil, maior parceiro comercial do país.
Jensen, da 4E, projeta que o dólar pode subir para entre 13 e 14 pesos contra o nível atual pouco abaixo de 10. O fato de a desvalorização ainda não ter ocorrido no início do governo, como se esperava, já é um sinal do tamanho dos desafios. Com as reservas baixas, o novo governo precisa antes fechar acordos com os credores e exportadores de grãos para atrair dólares e evitar que o câmbio, ao ser liberado, saia do controle.
Após a posse ontem, Macri deve aos poucos começar a ser julgado pela sua capacidade de reverter as frustrações de um país que convive com baixo crescimento e alta inflação. Por ora, diz Giambiagi, prevalecem a esperança com a imagem “market-friendly” do novo presidente e a superação do que ele qualifica como “intervencionismo absurdo” do kirchnerismo.
Jensen vê a possibilidade de o mercado no Brasil também viver uma onda de otimismo quando a questão do impeachment se definir, independentemente do desfecho, o que reduziria o elevado nível de incerteza que hoje trava os investimentos. Esse movimento, contudo, não deve ocorrer no curtíssimo prazo. Com a paralisia das decisões no Congresso, o impeachment segue como um “processo doloroso”, que ainda pode custar novos rebaixamentos de rating do Brasil, diz o consultor.
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