Crise da saúde nos EUA é mina de ouro para crowdfunding

Por Suzanne Woolley.

Plataformas de financiamento coletivo, como GoFundMe e YouCaring, transformaram a compaixão por americanos afogados em despesas médicas em uma indústria caseira. Agora, as iniciativas do Partido Republicano no Congresso para revogar e substituir o Obacamare poderiam elevar o número de pessoas sem planos de saúde e estimular o negócio de ajudar pessoas a coletar doações pela internet para pagar a assistência médica.

Mas o crowdfunding médico não precisa esperar que o Congresso entre em ação. O negócio já prospera, e seus líderes projetam que o crescimento continuará acelerado independentemente do que acontecer no Capitólio.

“Seja Obamacare ou Trumpcare, o peso dos custos da assistência médica para a população só vai aumentar”, disse Dan Saper, CEO da YouCaring. “Isso levará mais pessoas a tentar descobrir como pagar suas contas médicas, e o crowdfunding está começando a funcionar como um meio de ajudar essas pessoas.”

Na líder do setor, GoFundMe, a saúde é uma das categorias que mais fundos arrecada. O CEO Rob Solomon disse que isso é o que “ajudou a definir e a dar fama à GoFundMe” e descreveu a empresa, fundada em 2010, como “uma rede de segurança digital”.

Essa rede se expandiu neste ano quando a GoFundMe adquiriu a CrowdRise, cofundada pelo ator Edward Norton. A transação amplia os negócios da empresa a ajudar pessoas a arrecadar fundos para instituições de caridade e leva quem precisa de fundos para “gastos em saúde, a taxa de matrícula de um amigo, uma viagem grupal para fazer voluntariado ou qualquer causa pessoal” à GoFundMe.

Crescimento

O crescimento tem sido veloz. Em uma publicação de setembro de 2015 no LinkedIn, Solomon escreveu que um milhão de campanhas abertas nos 12 meses anteriores tinha arrecadado US$ 1 bilhão de quase 12 milhões de doadores. Em fevereiro de 2016, o total era de US$ 2 bilhões. Em outubro de 2016, US$ 3 bilhões, com 25 milhões de doadores. Um estudo da NerdWallet sobre crowdfunding médico afirmou que a GoFundMe havia informado que US$ 930 milhões dos US$ 2 bilhões arrecadados no período analisado pelo estudo vieram de campanhas de saúde.

Por sua vez, a YouCaring adquiriu neste ano a GiveForward; as campanhas de arrecadação de fundos para problemas de saúde representaram 70 por cento das campanhas da GiveForward. Juntas, as empresas têm 8 milhões de doadores, que contribuíram com US$ 800 milhões para diversos tipos de campanhas. Grande parte do total foi doado para campanhas de saúde, segundo a empresa. Essa parte estava se aproximando de metade das campanhas de arrecadação da YouCaring antes da aquisição, e a taxa de crescimento deve triplicar neste ano, disse Saper.

Com suficiente volume, o negócio de ajudar pessoas a arrecadar dinheiro para pagar despesas médicas tem muito potencial de lucro. A GoFundMe fica com 5 por cento de cada doação, 2,9 por cento vão para o processamento do pagamento e há uma taxa de US$ 0,30 por transação. Sites menores, como Fundly e FundRazr, cobram mais ou menos o mesmo. Doadores da YouCaring pagam apenas uma taxa de processamento de 2,9 por cento e os US$ 0,30.

Projeto de lei

Para uma quantidade cada vez maior de americanos, participar de um concurso de popularidade para conquistar uma determinada quantia de dinheiro e compaixão talvez seja a única forma de pagar os médicos e se manter à tona. No mês passado, os deputados republicanos aprovaram um projeto de lei para substituir a Lei de Cuidados Acessíveis, ou Obamacare (ACA, na sigla em inglês). O Escritório Orçamentário do Congresso estima que, se o projeto não for modificado, mais 23 milhões de americanos ficarão sem plano de saúde em 2026, em contraste com a ACA. Até mesmo uma lei parecida com o projeto provavelmente aumentará o custo da assistência médica para os americanos mais idosos e doentes e para aqueles com condições pré-existentes, o que fortalecerá os negócios do crowdfunding médico.

O setor ainda representa apenas uma fração das centenas de bilhões de dólares que os americanos gastam do próprio bolso em saúde anualmente, disse Saper. O crowdfunding médico pode “crescer muito e tem muito espaço para avançar”, disse ele. “A taxa de crescimento do setor mostra que isto pode ser uma rede de segurança importante para que muitos indivíduos e comunidades se ajudem.”

Um estudo publicado neste ano pela Universidade de Washington/Bothell, “Producing a Worthy Illness: Personal Crowdfunding Amidst Financial Crisis”, oferece uma perspectiva impressionante de algumas dessas comunidades. Campanhas de saúde pessoais na GoFundMe tinham mais chances de ser abertas por pessoas que moram nos estados que optaram por não expandir Medicaid na ACA, mostraram resultados preliminares do estudo. Cinquenta e quatro por cento de 200 campanhas em uma amostra aleatória do ano passado vieram desses estados, apesar de abrigarem apenas 39 por cento da população dos EUA. O Trumpcare reduziria drasticamente a expansão do Medicaid promulgada no Obamacare.

“Hoje o crowdfunding está sendo tratado como uma espécie de plano de saúde coletivo”, disse Daryl Hatton, CEO da FundRazr, uma plataforma de crowdfunding com sede no Canadá.

Inadequação

Contudo, o modelo de negócios do crowdfunding é pouco adequado para os custos enormes e intermináveis de muitos que fazem campanhas na internet. Alguns recebem apenas entre 10 e 20 por cento do que pedem, disse Jeremy Snyder, professor de Ciências da Saúde da Simon Fraser University no Canadá, onde há necessidades apesar da existência de um sistema de saúde nacional. A pesquisa de Snyder, que inclui análises de questões éticas levantadas pelo crowdfunding médico, se concentrou nas pessoas que buscam recursos para tratamentos de câncer nos sites canadenses de financiamento coletivo.

“Será que isso vai solucionar a falta de planos de saúde?”, disse ele. “De jeito nenhum.”

Os pesquisadores da Bothell perceberam que os doadores tendem a financiar problemas solucionáveis. “Injeções que custam US$ 10.000 a cada seis meses são um problema mais solucionável do que uma campanha para uma família que menciona muitos desafios, como contas de serviços públicos que não estão sendo pagas porque a família está pagando pela assistência médica”, disse a professora Lauren Berliner, uma das autoras do estudo. A utilização inteligente de redes sociais e digitais ajuda muito a atrair doações. As campanhas com hashtags, imagens e elementos chamativos recebem mais apoio financeiro, concluiu o estudo.

Um site que se manteve longe de tudo isso é Kickstarter, onde os doadores financiam projetos criativos.

“Se tivéssemos campanhas de saúde pessoais, poderia surgir uma equivalência ética estranha”, disse Justin Kazmark, vice-presidente de comunicações da empresa. “Se você vir documentaristas tentando obter US$ 10.000 para um filme junto de um projeto de alguém cujo cachorro precisa de cirurgia dental ou de ajuda para desastres, a mentalidade muda e tudo é categorizado de outra forma.”

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