Crise política faz cor da roupa gerar brigas nas ruas do Brasil

Por Sabrina Valle e David Biller.

Raquel Varjão, publicitária de São Paulo, tinha acabado de pegar sua filha de 7 anos na escola quando foi xingada por três pessoas que passavam de carro. Seu pecado: vestir uma camiseta vermelha.

“Eles se sentiram no direito de me agredir verbalmente e na frente dela”, disse a mãe de 35 anos de idade, por vestir a cor associada ao PT, partido da presidente Dilma Rousseff. “Por que as divergências ideológicas precisam chegar a este ponto?”

A discussão sobre o impeachment de Dilma está mudando o cotidiano da população no Brasil, um País com reputação de pacifismo e tolerância política desde o seu retorno à democracia, em 1985. Em bares, na Internet e acima de tudo nas ruas, o debate sobre sua possível remoção é cada vez mais hostil e traz à tona divisões partidárias e de classe.

“O País está polarizado”, disse Ricardo Ribeiro, analista político da MCM Consultores Associados em São Paulo.

No centro da crise estão um escândalo de corrupção com envolvimento de políticos e a pior recessão em pelo menos um século, com retrocessos a uma nova classe média na maior economia da América Latina.

Mais protestos

Dilma ficou em situação ainda mais difícil depois que o PMDB, maior partido do País, deixou formalmente a base do governo. Protestos pró-governo estão previstos para quinta-feira em Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Porto Alegre – após marchas antigoverno que atraíram milhões apenas algumas semanas atrás.

Mesmo para os desinteressados em política, escolher a cor errada pode atraí-los sem querer para a briga.

Apesar do arco-íris de ideologias, o vermelho tem sido a cor associada a petistas, movimentos sindicais e ativistas de esquerda que defendem não haver razão para impedir Dilma sem a comprovação de um crime. O Partido dos Trabalhadores está no poder desde 2003. Já o verde e o amarelo tem sido associado à elite rica, branca e educada, já que este é o público dominante em protestos contra o governo.

“Quando eu saio para uma caminhada no calçadão fico com medo de usar vermelho”, disse João Studart, funcionário público que se descreve como militante do Partido dos Trabalhadores, por telefone do Rio. “Eu tenho 60 anos de idade. Não sou só eu; as pessoas ficam temerosas de serem agredidas”.

No último fim de semana, Studart presenciou um homem jogar um copo de chope no rosto de uma senhora em um bar. Studart e a senhora estavam de vermelho após participar de um ato contra o impeachment e pró-democracia. Um vídeo postado na Internet mostra Studart segurando o homem pelo braço e exigindo desculpas, em meio a gritaria. O homem foi expulso do local.

Insultos, brigas

Larissa Grutes, professora de Inglês de 31 anos, disse que usou vermelho intencionalmente por três dias seguidos no início deste mês em Ipanema e no Leblon, na zona nobre do Rio. Foi hostilizada todos os três dias. Não apenas por motoristas, mas também por um homem que se aproximou e gritou “piranha” e “corrupta”, disse.
“Não liguei. Mas se viesse me atacar eu também iria para a briga, não deixaria barato”, contou por telefone.

Até agora, o País foi poupado do tipo de turbulência social que tem atormentado os vizinhos, como a Venezuela. Mas a raiva está gerando mais violência. Houve brigas no Congresso esta semana, e gás lacrimogêneo foi lançado contra os manifestantes de rua este mês com ambos os lados endurecendo suas opiniões.

Vários escritórios regionais do PT foram saqueados e depredados por todo o País, como o prédio do Instituto Lula, fundação iniciada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Confrontos físicos ocorreram fora de um campus universitário em São Paulo.

“O Brasil está passando por uma grande transição”, disse Priscila Minervino, 25, psicóloga que participou de uma demonstração no dia 23 de março em Brasília pedindo uma resolução pacífica.

Histórias de pessoas sendo arrastadas para o conflito estão se espalhando em redes sociais como o Facebook, uma mudança que tem seus prós e contras, disse Priscila.

“As pessoas estão mais informadas e têm mais capacidade de se expressar, elas podem entender e pensar”, disse ela. “Ao mesmo tempo, é um muito conflito, muito ódio e briga. Em vez de unir, isso divide. ”

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