Delfim Netto não tem tempo para ceticismo e prevê recuperação

Por Gerson Freitas Jr. e Daniela Milanese.

Antônio Delfim Netto não tem paciência para o ceticismo em relação ao futuro do Brasil.

Em seus 88 anos ele foi testemunha – e algumas vezes, fez parte – de muitos períodos de instabilidade. Um regime militar, várias mudanças de moeda, um calote da dívida soberana, hiperinflação, o chamado milagre econômico brasileiro e a profunda recessão que veio depois. Agora, quando todo mundo está hesitante, ele está otimista.

O ex-ministro da Fazenda e durante muito tempo assessor econômico de importantes políticos brasileiros tem certeza de que o vice-presidente Michel Temer, que deverá assumir o País após o provável afastamento da presidente Dilma Rousseff, será capaz de recuperar a confiança de investidores e consumidores, acabando com a recessão mais longa em um século. Temer, que Delfim chama de velho amigo e com quem se encontrou nas últimas semanas para discutir estratégia, tem uma visão clara sobre o que é necessário para consertar a economia e conseguirá reunir apoio político para implementar reformas, disse o economista.

“O Temer é e sempre foi um político muito eficiente”, disse Delfim em uma entrevista em seu escritório em São Paulo. “Mas ele recebeu a chance de ser um estadista, e ele não vai jogar isso fora.”

‘O Único’

Para ele, a falta de poder político para implementar medidas foi o que fez com que Nelson Barbosa e Joaquim Levy – ambos “competentes” e com bons planos – falhassem como ministros. Henrique Meirelles, ex-presidente do banco central e provável ministro da Fazenda de Temer, é descrito por Delfim como determinado e focado. Mas a chave para a resposta que os investidores estão esperando é a habilidade política de Temer.

“Temer é o único que pode salvar os economistas”, afirma Delfim. “Não há nenhuma divergência muito importante no Brasil sobre o diagnóstico.”

Essas medidas, que visam reduzir o déficit primário quase recorde e liberar investimentos, deveriam incluir reformas no sistema previdenciário e na legislação trabalhista, além de tornar o orçamento do País mais flexível. Temer também deveria promover a desvinculação das receitas da União e do salário mínimo, disse Delfim.

Como ministro da Fazenda de 1967 e 1974, Delfim esteve por trás do que ficou conhecido como milagre econômico brasileiro, no início dos anos 1970, quando o PIB cresceu a um ritmo anual médio de 10 por cento, que continua sendo o mais rápido já registrado. Ele também atuou como ministro da Agricultura e do Planejamento nos últimos anos da ditadura militar, que durou de 1964 a 1985, ajudando a negociar a reestruturação da dívida externa do País.

Delfim era visto como o civil mais poderoso do regime militar e era chamado de superministro. Suas políticas incluíram a defesa de projetos caros de infraestrutura, o fomento da indústria com uso intensivo de mão de obra mais do que de capital e também o congelamento do salário dos trabalhadores. Ele atuou como parlamentar nas duas décadas seguintes e foi assessor do ex-presidente Lula durante seus oito anos no poder. Delfim apoiou publicamente as políticas de Dilma até o fim de 2012, quando a criticou por manobras contábeis que agora estão sendo investigadas no processo de impeachment.

Embora o mercado tenha reagido positivamente a uma possível mudança de governo, Temer deverá enfrentar vários desafios. Uma pesquisa do Datafolha no mês passado mostrou que apenas 2 por cento dos brasileiros votariam nele em uma eleição presidencial e 58 por cento acreditam que ele também deve ser afastado. Para Delfim, isso deveria ser mais uma bênção mais do que uma maldição, pois assim o apoio popular não influenciaria suas decisões.

“A Dilma estava no auge da sua popularidade quando estava no auge dos seus erros”, disse Delfim, citando a aprovação da presidente em 2012, após ter cortado pela metade o preço da conta de luz.

O risco de uma transição mais complicada ficou claro na segunda-feira, quando o presidente interino da Câmara pediu uma nova votação sobre o impeachment de Dilma, um movimento surpresa que provocou queda nos mercados.

Em 1992, depois que o presidente Fernando Collor de Mello renunciou em meio ao julgamento do seu impeachment, a economia se recuperou rapidamente, crescendo uma média de 5,4 por cento nos dois anos seguintes – mesmo com a hiperinflação, que atingiu o pico em 1993 a 2.477 por cento ao ano. Agora, Delfim diz que o Brasil provavelmente vai começar a se recuperar logo que o novo governo consiga reverter a queda de confiança. Ele estima que a economia pode se expandir 3 por cento ao ano, em linha com a taxa de crescimento global.

“Economia é expectativa”, disse Delfim. “A sociedade foi tomada pelo ceticismo. Mas eu tenho 88 anos. Não tenho tempo de ser cético.”

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