Por Mohamed A. El-Erian.
À medida que o Federal Reserve gradualmente normaliza sua política monetária, os participantes do mercado vão ouvir falar muito mais sobre a r*, a “taxa de juros neutra”, que ajuda a equilibrar os mercados financeiros quando a economia está em crescimento potencial e a inflação permanece controlada e estável.
Se os bancos centrais elevarem as taxas de juro muito acima desse nível, prejudicarão o crescimento, correrão o risco de provocar recessão e inflação, e acabarão impondo custos evitáveis à sociedade. Se mantiverem as taxas abaixo desse nível por muito tempo, eles vão superaquecer a economia, a inflação vai devorar o poder aquisitivo das famílias, e também haverá o risco de que a instabilidade do mercado financeiro afete o bem-estar social.
Essa possível corda bamba entre a expansão a retração também explica por que a r* é importante para os mercados. Uma convergência gradual da taxa básica de juros para esse nível permitiria, para adaptar uma frase de Ray Dalio, da Bridgewater Associates, uma “linda normalização” das políticas monetárias, coerente com a estabilidade e solidez do mercado.
Se superestimarem a r*, os bancos centrais prejudicarão a melhoria dos fundamentos econômicos necessários para validar os preços de ativos existentes, portanto, correndo o risco de provocar uma instabilidade no mercado à medida que os preços acabem por convergir novamente às condições econômicas mais fracas. E se, em vez disso, se subestimarem a r*, correm o risco de alimentar condições financeiras semelhantes às de uma bolha que tornam os preços dos ativos insustentáveis a médio prazo e também ameaçam a economia real à medida que os mercados posteriormente colapsam na que, julgando pela história, poderia ser uma repentina e desordenada tendência.
A seguir, 10 aspectos importantes deste conceito:
1. Como a r* atua como um guia para a normalização das taxas básicas de juro, também ajuda a ancorar as expectativas de mercado sobre o destino do início da curva de rendimento, mas não do caminho exato e nem da forma exata da curva inteira.
2. Os determinantes da r* são principalmente domésticos e incluem variáveis seculares e estruturais tais como produtividade, demografia, regulação e aprofundamento financeiro. No entanto, as influências internacionais têm desempenhado um papel maior em um mundo de grande globalização financeira e fatores globais comuns se tornaram mais importantes. Também é relevante um posicionamento de política monetária que foi forçado nos últimos anos a tentar compensar déficits em outros lugares (da relativa paralisia das reformas fiscais e estruturais à piora da desigualdade que diminui a propensão marginal da economia ao consumo).
3. Essa combinação de fatores domésticos, internacionais e de políticas tem um impacto importante na relação entre as taxas de juro e de câmbio. Quanto maiores as influências domésticas, mais forte a relação entre os movimentos na r* e nos mercados de câmbio.
4. Antes considerado relativamente constante, incluindo sob a Regra de Taylor que guiou o pensamento de muitos presidentes de bancos centrais ao longo dos anos, acredita-se que o nível da r* tenha diminuído significativamente desde a crise financeira global. Isso foi destacado no estudo de Richard Clarida, meu ex-colega na PIMCO e professor da Universidade Columbia, e por outros como Thomas Laubach e John Williams, bem como pelo Fundo Monetário Internacional e pelo sistema do Federal Reserve. Mas sua precisa especificação continua sendo objeto de muito debate, intensificando a ainda mais polêmica discussão sobre a conveniência e viabilidade de uma mudança de regime para uma política monetária baseada em regras.
5. Para aumentar ainda mais os desafios analíticos, a r* não é diretamente observável. A taxa precisa ser deduzida de modelos que incorporam variáveis financeiras e econômicas que abrangem os setores privados e públicos, domésticos e estrangeiros.
6. Outro desafio é a noção de que a r* provavelmente varie com o tempo. Com isso, bancos centrais e mercados podem se ver tentando deduzir e buscar um alvo em movimento.
7. Uma queda muito forte da r* confronta os bancos centrais com o problema do “limite inferior efetivo”— ou seja, um limite prático de quão baixas/negativas as taxas nominais de juro podem ficar. E uma complicação adicional é que muitos dos fatores estruturais e seculares que derrubam a r* estão fora da influência da política monetária.
8. Se outras ferramentas de políticas permanecerem marginalizadas pela polarização política, como tem sido amplamente o caso nos últimos anos, os presidentes de bancos centrais ativistas devem continuar se sentindo compelidos a experimentar outras ferramentas, especialmente indicadores de balanço (compras de ativos) e orientação de política antecipada. Isso tornará a r* mais instável e difícil de inferir.
9. Na medida em que a r* tenha caído materialmente, e a vasta maioria dos indicadores sugere que este seja o caso, a adaptação sistêmica levará tempo. Aspectos importantes do sistema financeiro, e os contratos implícitos e explícitos que estão associados a eles, foram construídos com base em uma r* mais alta. O mais visível deles é a estrutura institucional para fornecer produtos de proteção financeira de longo prazo às famílias, tais como seguro de vida e aposentadoria.
10. Embora o conceito da r* seja mais relevante para países avançados com sistemas financeiros maduros, muitas economias emergentes não podem evitar as consequências de déficits relacionados às políticas, mesmo que estes estejam muito além de suas fronteiras. Subestimar a r* provocaria ondas de entrada de capital que podem desestabilizar os sistemas financeiros de economias emergentes. Em contraste, um nível alto demais provocaria o risco de saídas de capital disruptivas.
Por todas essas razões, a r* tem consequências para o bem-estar social geral, bem como para os lucros e prejuízos do setor privado nos EUA e em outros lugares. Esses potenciais resultados tornam a busca pela taxa de juros neutra particularmente interessante, já que o sucesso é importante e, pelo menos até agora, elusivo.
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