Por Raymond Colitt e André Soliani.
Durante boa parte deste ano, enquanto o Brasil mergulhava em uma crise econômica e política, a presidente Dilma Rousseff parecia acuada em seu bunker. Ela raramente deixava o Palácio do Planalto e preferia se debruçar sobre os relatórios de infraestrutura, focando no lado técnico das medidas de austeridade.
Mas nos últimos meses, à medida que os esforços da oposição para cassá-la ganharam impulso, algo visivelmente mudou. Dilma, uma ex-guerrilheira urbana que não cedeu nem sob tortura prolongada, saiu de seu estado de paralisia. Com a crise se aproximando, ela reagiu e avisou que não será fácil tirá-la do poder.
“Eu não vou renunciar”, disse ela ao jornal Folha de S.Paulo, em julho. “Se tem uma coisa que eu não tenho medo é disso”.
Explosiva de novo
Desde então, Dilma intensificou suas aparições públicas, negociou apoio pessoalmente com parlamentares, reorganizou seu ministério e fez algumas das defesas mais enfáticas do seu governo. Seu famoso temperamento voltou e ela passou a explodir com assessores por atrasos ou falhas, segundo um funcionário próximo a ela que pediu anonimato.
A tenacidade que levou Dilma, 67 anos, a lutar contra a ditadura militar quando jovem agora faz com que ela se agarre ao poder com uma notável serenidade. Isso apesar da expectativa de que o Brasil entrará na mais longa crise econômica desde a Grande Depressão, dos índices de aprovação mais baixos já enfrentados por um presidente e das acusações de que ela financiou sua campanha eleitoral ilegalmente e usou truques contábeis para encobrir os números do orçamento.
“Ela não acha que fez nada de errado e a renúncia, para ela, seria a admissão de uma culpa que ela não tem”, disse João Augusto de Castro Neves, diretor da consultoria de risco político Eurasia Group para a América Latina. “Ela irá até o fim”.
Em apenas dois dias da semana passada ela compareceu a tantos eventos públicos quanto em alguns meses do início do ano. Após ser criticada por ignorar as celebrações do Dia do Trabalhador, em 1º de maio, para evitar possíveis vaias, ela proferiu um de seus discursos mais inflamados em 13 de outubro, durante evento da Central Única dos Trabalhadores, principal confederação sindical do Brasil.
“Eu me insurjo contra o golpismo e suas ações conspiratórias e não temo seus defensores”, disse Dilma para a multidão de sindicalistas que a aplaudia em São Paulo. “Pergunto com toda a franqueza: quem tem força moral, reputação ilibada e biografia limpa suficientes para atacar a minha honra?”.
Tentativas de golpe
Seu argumento é uma referência indireta às acusações que pesam contra alguns de seus rivais. Mais de um quarto dos deputados federais enfrenta processos criminais ou investigações no Supremo Tribunal Federal, segundo o Congresso em Foco, publicação especializada em notícias legislativas.
Os ataques a Dilma não resgataram apenas seu espírito de luta. Eles também parecem tê-la reanimado. Ela continua em uma dieta rigorosa que já a fez perder 15 quilos e pedala pelas ruas de Brasília quase todos os dias pela manhã. Ela pode estar sob pressão, mas poucas vezes teve uma aparência melhor ou mais saudável.
Dilma tem histórico de dar a volta por cima quando as coisas ficam difíceis. Um ano depois de enfrentar o tratamento de um linfoma, ela ganhou a eleição presidencial em 2010. Seu pai era um imigrante búlgaro bem-sucedido e ela cresceu com uma vida relativamente confortável, cercada de livros. Quando ainda era estudante secundarista, ela se uniu ao movimento armado na luta contra a ditadura. Esses grupos clandestinos executaram roubos a bancos e sequestros de políticos como parte de um plano para derrubar o regime militar.
Após sua detenção e o que ela disse ter sido uma “tortura barbárica” durante cerca de três anos de prisão, Dilma se formou em economia e iniciou uma longa carreira no serviço público em empregos tradicionalmente ocupados por homens, como o de secretária municipal da Fazenda, ministra de Minas e Energia e ministra-chefe da Casa Civil no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Indagada sobre sua imagem de dama de ferro, ela disse certa vez, com um humor atípico: “É verdade: sou uma mulher dura cercada de homens meigos”.
Não está claro se essa mudança de última hora será suficiente para salvá-la. Proferir discursos em eventos de sindicatos e inaugurar casas para a população de baixa renda poderá ajudar a aumentar um pouco seu índice de aprovação, mas não muda o quadro geral, diz Carlos Manhanelli, consultor de marketing eleitoral em São Paulo. Ela continua sendo uma tecnocrata com dificuldades para recolocar a economia nos trilhos, disse ele.
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