Por Monica de Bolle, pesquisadora do Peterson Institute for International Economics.
As excessivamente altas taxas de juros do Brasil têm gerado, há tempos, muita perplexidade. Após a estabilização econômica, em meados dos anos 1990, e a adesão às metas de inflação, responsabilidade fiscal e taxas de câmbio flutuantes nos anos 2000, a maioria esperava que a taxa de juro brasileira iria caminhar para a média dos mercados emergentes até o fim da década.
As taxas de juro do real brasileiro realmente caíram de 9 por cento, no início dos anos 2000, para cerca de 5,5 por cento, em 2010. Elas, contudo, seguiram substancialmente maiores que a média dos mercados emergentes. Uma tentativa de resolver essa anomalia foi feita pelo Banco Central, em 2011. Entre 2011 e 2013, a principal autoridade monetária do Brasil cortou as taxas nominais em mais de 500 pontos base, tentando evitar as consequências da crise financeira global e “reiniciar” as taxas de juro em patamares muito menores.
A tentativa falhou e o Brasil continua enfrentando altas taxas de juros reais e nominais. Com a inflação chegando perto de 9 por cento ao ano e com a expectativa de que vai crescer nos próximos meses, há pouca esperança que as taxas de juro brasileiras vão chegar a níveis “normais”. As taxas reais de juros – a diferença entre a taxa nominal e a expectativa de inflação para os próximos 12 meses – estão de volta aos 6 por cento, o nível mais comum antes do afrouxamento monetário substancial de 2011.
Diversas teses tentaram explicar as altas taxas de juro brasileiras, e algumas delas passaram por grande escrutínio, como a hipótese de que as baixas taxas de poupança perpetuam um ciclo de alto custo de financiamento, investimento deprimido e baixo crescimento. Por mais que o papel dos bancos públicos, em particular o estatal banco de desenvolvimento BNDES, tenha sido citado como causa adicional para altas taxas de juro no Brasil, há poucas evidências para justificar essa linha de argumentação.
Os bancos públicos no Brasil são responsáveis por mais de 50 por cento do mercado de crédito, enquanto o BNDES sozinho é responsável por mais de 20 por cento. Diferentemente de outros bancos públicos, o banco de desenvolvimento estatal empresta recursos exclusivamente sob juros subsidiados. As suas taxas estão diretamente ligadas à Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) brasileira, que é definida pelo Conselho Monetário Nacional a cada três meses. Assim, as taxas do BNDES não são determinadas pelo mercado.
Há duas maneiras principais pelas quais o BNDES cria distorções perversas no mercado. Por um lado, a segmentação causada por empréstimos substanciais subsidiados acaba enfraquecendo os canais de transmissão da política monetária, o que efetivamente prejudica os esforços do Banco Central no combate à inflação. Por outro lado, a ampla presença do BNDES — particularmente pelo seu foco em grandes corporações que não estão com acesso restrito a recursos financeiros e, portanto, seriam capazes de se financiar no mercado privado de crédito — culmina em seleção adversa.
O BNDES mantém as corporações com menor risco, enquanto as empresas de maior risco buscam as instituições privadas. Em tais circunstâncias, as instituições financeiras privadas não têm outra escolha além de cobrar mais por conta do maior risco de crédito. A análise de regressão dos dados da última década mostra que o BNDES colocou uma pressão significativa sobre as taxas reais no Brasil. Grande parte das taxas indevidamente elevadas no Brasil está refletida na participação excessiva do BNDES no mercado de crédito, assim como na sua capacidade de capturar empresas que teriam acesso a outras fontes de capital e que possuem baixo risco de empréstimo, o que aumenta o custo geral de financiamento.
Maiores custos de financiamento reduzem a capacidade das empresas de investir, o que culmina, em última análise, em prejuízo para o crescimento. Resolver essas questões exigiria uma redução significativa nos empréstimos do BNDES, assim como em uma revisão completa das suas operações. O período para fazer isso não poderia, contudo, ser menos favorável: o Brasil está à beira de uma grande recessão e o crédito para o setor privado está encolhendo. Na ausência de outros instrumentos para crédito de longo prazo, reduzir as operações de financiamento do banco estatal implicaria a ausência de recursos para programas como o recentemente anunciado plano para renovar a infraestrutura do país.
Por fim, grandes empresas que se beneficiaram dos empréstimos subsidiados estariam bastante relutantes em abandoná-los. O banco estatal brasileiro foi fundado em 1952 com o objetivo explícito de oferecer crédito de longo prazo a projetos de infraestrutura. Desde então, evoluiu em uma instituição que oferece crédito de longo prazo a corporações muito grandes e bastante lucrativas, auxiliando a manter um ciclo de altas taxas de juro com taxas de investimento relativamente baixas. Chegou o momento de repensar o seu papel.