Escândalos no Brasil ensaiam retorno e ameaçam rali de ações

Por Julia Leite, Paula Sambo e Aline Oyamada com a colaboração de Gerson Freitas Jr., Ney Hayashi e Eduardo Thomson.

Os escândalos de corrupção já viraram uma constante para quem investe no Brasil.

A Carne Fraca voltou a virar o estômago dos investidores na segunda-feira, quando surgiram acusações de que funcionários da BRF alteraram laudos de exames para esconder contaminação por salmonela e condições sanitárias inadequadas. A nova operação veio dias após de a Lava Jato envolver a CCR em sua 48ª fase (sim, você leu corretamente: 48ª).

As notícias derrubaram as ações das empresas afetadas e mostraram que os esforços para desarraigar a corrupção ainda fazem vítimas, anos depois de abalarem o governo e a Petrobras. E para algumas companhias, os efeitos são duradouros. Os bonds da Odebrecht, que admitiu participação em um esquema de propinas na Lava Jato, caíram para novas mínimas históricas.

A volta das investigações coincide com a melhora da economia e com a bolsa brasileira em um movimento de valorização que é dos mais fortes no mundo todo. Até agora, os investidores deram de ombros, mas os escândalos podem alimentar a volatilidade esperada em antecipação à eleição presidencial, em outubro.

“No Brasil, a regra é não entrar em posições muito grandes”, disse o gestor de recursos James Gulbrandsen, que trabalha no Rio de Janeiro para a NHC Capital, que supervisiona US$ 3,5 bilhões. “Convicção mata.”

BRF desaba

Para a BRF, o ressurgimento da Carne Fraca não poderia ter vindo em pior hora. A empresa, que teve quatro diretores-presidentes em cinco anos, se vê as voltas com uma briga de acionistas, que não conseguem decidir sobre um plano para reerguer a companhia e tentam substituir os membros do Conselho de Administração. A ação perdeu 20 por cento do valor na segunda-feira, a maior queda desde 1998.

A BRF afirmou em comunicado que as questões investigadas pela polícia não representam ameaça à saúde e que a companhia segue todos os regulamentos nacionais e internacionais de segurança alimentar.

A nova operação ocorreu quase um ano após a investigação original sobre a segurança da carne produzida no Brasil, o maior exportador mundial do produto. Na época, diversos países proibiram temporariamente as importações de aves e carne bovina depois de acusações que incluíam a distribuição de comida estragada e a presença de ácido e papelão na carne vendida. Concorrentes não foram mencionadas na operação que veio à tona na segunda-feira, porém as ações de Marfrig Global Foods e Minerva chegaram a cair mais de 4 por cento. A JBS – empresa que não sai das manchetes, a mais recente sendo o pedido de rescisão do acordo de delação premiada de seu ex-presidente — recuou 5,9 por cento.

A ação da Triunfo, uma rival menor da CCR, perdeu mais de um terço do valor desde 22 de fevereiro, após ser citada na Lava Jato por irregularidades encontradas na execução de um acordo de concessão rodoviária feito pela subsidiária Econorte. Em comunicado, a companhia afirmou que forneceu todas as informações solicitadas e que vai cooperar com as autoridades.

A CCR foi citada na mesma investigação, acusada de facilitar propinas por meio do patrocínio de projetos e eventos esportivos. A empresa pode ter que prestar mais esclarecimentos aos investidores para recuperar o prêmio de governança que sempre esteve embutido no preço das ações, de acordo com relatório de analistas do Safra. A firma negou que tenha cometido qualquer crime e disse que encerrou um contrato com um fornecedor após encontrar uma possível violação de seu código de conduta.

Veteranos

Enquanto novas empresas são envolvidas em escândalos, a Odebrecht – um dos primeiros alvos da Lava Jato – ainda tenta superar suas consequências. O conglomerado está negociando empréstimos bancários no valor de R$ 3 bilhões para honrar dívidas da divisão de construção civil que estão para vencer, pessoas com conhecimento da situação disseram na semana passada.

Apesar do nervosismo em determinados setores, o Ibovespa acumula valorização em dólares de 14 por cento neste ano, o maior ganho entre os principais índices acionários do mundo. Investidores apostam na melhora dos lucros das empresas agora que o País está saindo da recessão.

“Investidores que venderam ou ficaram underweight estão voltando porque o momentum da economia está melhorando e, portanto, eles querem se envolver, sejam quais forem as notícias sobre corrupção”, disse o gestor de carteiras Patrik Kauffmann, da Solitaire Aquila.

“Talvez os investidores estejam começando a se acostumar com o ruído. Pelo menos, eles sentem menos medo.”

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