Excesso de oferta de qualidade cria paradoxo no setor petroleiro

Por Javier Blas.

O boom do xisto criou um mundo repleto de petróleo bruto, o que limitou os preços e reduziu notavelmente a dependência dos EUA em relação à importação de energia. Mas um problema está se tornando cada vez maior: os EUA estão produzindo o tipo errado de petróleo.

O Texas e outros estados ricos em xisto estão produzindo uma enorme quantidade de petróleo bruto de alta qualidade – leve e doce, no jargão do setor -, o que alimenta uma abundância crescente que está distorcendo a indústria global de petróleo.

As refinarias que investiram bilhões para lucrar com o processamento de petróleo barato e de baixa qualidade estão pagando prêmios sem precedentes para encontrar o petróleo pesado e azedo de que necessitam. Esse descompasso é uma notícia mais favorável para os produtores da Opep, como Iraque e Arábia Saudita, que não produzem muito petróleo leve e doce, mas extraem em abundância a variedade de menor qualidade.

A crise na Venezuela, junto com os cortes de produção da Opep, vai agravar o descompasso. O produtor sul-americano exporta alguns dos tipos de petróleo mais pesados do mundo, e as sanções impostas pelo governo Trump, anunciadas nesta semana, vão dificultar muito mais o processamento e a exportação desse petróleo. Refinarias americanas estão buscando ofertas alternativas em um prazo muito curto.

“Ainda temos alguns furos em nosso plano de abastecimento” para os próximos 30 dias, disse Gary Simmons, executivo sênior da Valero Energy, a maior refinaria dos EUA, a investidores na quinta-feira. “Não estamos pegando nada da Venezuela.”

O petróleo não é igual em todos os lugares: o tipo extraído dos poços de xisto do oeste do Texas parece óleo de cozinha – fino e fácil de refinar. Na região do Orinoco, na Venezuela, o petróleo tem um aspecto mais parecido com o de uma geleia, espesso e difícil de processar. A densidade não é a única diferença – o teor de enxofre também é importante e divide o mercado em doce e azedo. O petróleo pesado tende a ter mais enxofre do que o petróleo leve.

Como a Arábia Saudita, a Rússia e o Canadá diminuíram a produção e as sanções impostas pelos EUA forçam a redução das exportações venezuelanas e iranianas, o mercado de petróleo bruto de baixa qualidade está sentindo o impacto.

“O mercado físico de petróleo continua forte, por causa da escassez de petróleo bruto”, disse Amrita Sen, analista-chefe de petróleo da consultoria Energy Aspects em Londres, ecoando uma visão comum no mercado.

Para os consumidores e políticos concentrados no preço do petróleo Brent e West Texas Intermediate, que são as referências mais populares, isso talvez não tenha muita importância. Os motoristas de carro poderiam até se beneficiar, porque a abundância de petróleo leve e doce geralmente leva à abundância de gasolina e, consequentemente, a preços mais baixos. Por outro lado, os caminhoneiros podem enfrentar uma escassez, já que as refinarias preferem o petróleo pesado e azedo para produzir diesel.

Para traders de petróleo no mercado físico, existem oportunidades de lucrar com as variações do diferencial de preço entre as variedades de petróleo bruto.

“A Opep está conseguindo gerar o impacto que desejava no mercado físico, que está ficando mais apertado”, disse Marco Dunand, CEO da trader de commodities Mercuria Energy Group.

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