Por Paul Barrett.
Pode parecer improvável para alguns, mas a indústria de armas de fogo está se preparando para apoiar uma campanha de prevenção do suicídio. Só para deixar claro, o aspecto improvável é que este setor fabrica os produtos que possibilitam quase a metade dos casos de suicídio nos EUA.
Steve Sanetti, presidente da Fundação Nacional de Tiro Esportivo (NSSF, na sigla em inglês), a associação do setor, não vê nada de surpreendente que fabricantes de armas e munição tentem reduzir essa estatística preocupante. “Passamos anos analisando esse assunto”, disse ele em uma entrevista recente na sede da NSSF em Newtown, Connecticut (cidade onde estudantes do ensino fundamental foram massacrados em 2012). “Suicídios com armas de fogo correspondem a dois terços do total das mortes provocadas com armas”, acrescentou Sanetti, portanto este é um foco natural para fabricantes e portadores responsáveis de armas.
Os Centros para Controle e Prevenção de Doenças informam que ocorrem cerca de 11.000 homicídios e de 21.000 suicídios com arma de fogo por ano. Avaliando apenas a mortalidade, o suicídio com armas é um problema maior que o homicídio com armas.
A NSSF, disse Sanetti, teve dificuldades para encontrar um grupo especializado com que pudesse trabalhar em relação a esse assunto delicado: “O problema foi que, como grande parte da comunidade médica, as organizações de prevenção do suicídio se opõem às armas por natureza e seu mantra é: ‘Somente uma casa sem armas é uma casa segura’. Obviamente não podíamos apoiar isso”.
É inegável que a probabilidade de que um suicídio com arma ocorra em uma casa onde não há armas é menor. Mas os proprietários de armas, e as empresas que fabricam e vendem armas, acreditam que os benefícios da posse de armas sob sua perspectiva (segurança contra intrusos, esportes e a recreação, exercício dos direitos garantidos pela Segunda Emenda da Constituição dos EUA) compensam alguns riscos negativos. Para essas pessoas, a questão é como minimizar esses riscos.
No ano passado, a NSSF começou a conversar com a Fundação Americana para a Prevenção do Suicídio (AFSP, na sigla em inglês), com sede em Nova York. “Eles não deixam que a política interfira. Nós não deixamos que a política interfira” disse Sanetti. O CEO da AFSP, Robert Gebbia, disse que seu grupo abriu as portas para conversar com o setor de armas porque este é um modo de chegar às pessoas que possuem armas e que poderiam estar suscetíveis ao suicídio. “A política tem muito peso nesse assunto — a Segunda Emenda — mas isso não é problema nosso”, explicou Gebbia. “Para cumprir nossa missão, precisamos trabalhar com pessoas que fazem parte desse universo”.
“Embora qualquer iniciativa de esclarecimento em relação ao suicídio tenha seu mérito, a NSSF erra o alvo no momento de admitir os fatores de risco provenientes da posse de uma arma em casa”, disse Dan Gross, presidente da Campanha Brady para Evitar a Violência com Armas, por email. “O lobby desse setor passou anos gerando uma atmosfera de histeria e medo, criando um mundo assustador onde seu produto é a única esperança para garantir a segurança — e o resultado foi fatal. O mito em que eles baseiam seus negócios, de que de algum modo uma arma deixa você mais seguro, está custando vidas, literalmente”.
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