A primeira edição do Fórum de Combustíveis aconteceu no escritório da Bloomberg em São Paulo, em uma iniciativa conjunta com a Platts, divisão da S&P Global focada em avaliações independentes e referências de preços de commodities. Em evento lotado, participantes do Brasil e do exterior tiveram discussões elaboradas sobre os fatores determinantes do mercado doméstico e internacional de combustíveis e sobre as grandes mudanças e oportunidades que estão surgindo no curto prazo.
O pano de fundo global foi profundamente transformado desde a suspensão da proibição das exportações de petróleo pelos EUA no final de 2015, que coincidiu com a grande expansão da indústria de xisto (shale) naquele país, com características particulares que permitem alterações mais dinâmicas nos níveis de produção para reagir a oscilações de preços e demanda. Desde o ano passado, as exportações de combustível americano deram um salto de 70 por cento. Segundo a Platts, existe uma Nova Ordem do Petróleo depois que os EUA passaram a exportar petróleo produzido internamente, em dezembro de 2015. Os EUA são hoje o maior exportador mundial de refinados e vendem esses produtos no mundo inteiro. Essa Nova Ordem do Petróleo causou maior eficiência de preços nos mercados de petróleo e refinados, como se observa na exportação recente de óleo da qualidade medium sour do Golfo do México, mostrando que os produtores precisam aderir a valores de mercado para permanecer no negócio. Essa dinâmica tende a se acentuar a partir do segundo semestre de 2018, quando o Porto Offshore de Louisiana (LOOP) puder exportar em navios dos tipos VLCC e ULCC.
No lado técnico, foi debatido o aumento da complexidade do mercado, com a predominância de algoritmos e a saída de fundos de hedge. Neste contexto, Julio Aparecido, especialista de commodities para América Latina, apresentou ferramentas do terminal Bloomberg que facilitam a navegação nesse mercado, como funções de acompanhamento de navios e estoques e de execução de operações de hedge físico e financeiro. Julio também detalhou a formação de preço que permitiu a arbitragem de importação de gasolina e diesel, oriundos do Golfo do México e da Europa, mediante a nova política de preços da Petrobras.
O evento também discutiu outra grande mudança de curto prazo na dinâmica global do petróleo: a adoção, pela Organização Marítima Internacional, da regra que reduz o teor de enxofre no combustível dos navios de 3,5 por cento para 0,5 por cento. A adoção é prevista para 2020, mas o cronograma final será decidido em 2019 e terá impacto sobre os planos de refinarias no mundo inteiro e sobre a demanda por distintas qualidades de petróleo.
A migração da demanda para tipos de petróleo menos poluentes favorece o Brasil, que produz principalmente a variedademedium sweet crude. No entanto, para tirar vantagem desse aumento na procura, o País precisa de mais infraestrutura e transparência de preços, o que exigiria redefinição do papel da Petrobras. Na visão da Platts, a impossibilidade de calcular o valor justo ou projetar o preço futuro do produto brasileiro atrapalha o desenvolvimento dessa indústria internamente e afasta companhias petrolíferas e investidores estrangeiros.
O panorama interno do mercado de combustíveis e a influência do cenário externo também foram discutidos no evento. O Brasil se tornou neste ano importador líquido de etanol e o terceiro maior comprador de combustível dos EUA. Existe grande demanda brasileira pelo produto americano e europeu devido à diminuição da produção das refinarias nacionais, uma vez que planos de expansão elaborados há uma década não foram em frente. No caso do etanol, a Platts vê recuperação da competitividade, mas entende que a demanda vai demorar algum tempo para aumentar porque o consumidor se acostumou a abastecer o carro com gasolina, na ausência de uma estratégia para sustentar a demanda por etanol e a produção desse segmento.
Outro tema do fórum foi o Renovabio, programa do governo federal para expansão da presença dos biocombustíveis na matriz energética, que ainda não foi aprovado e pode dar um novo rumo ao setor nacional de energia. Quanto ao carro elétrico, a avaliação de participantes do evento é que não representa uma ameaça à demanda por combustíveis nem no médio prazo, visto que não há planos para montar uma rede de abastecimento de eletricidade no Brasil. No entanto, um dos palestrantes alertou para o grande impacto sobre a procura futura por metais, que são usados em menor quantidade nesses veículos.
Os participantes do evento também ouviram uma avaliação aprofundada do ambiente macroeconômico no Brasil, com ênfase na taxa de câmbio, variável crucial para empresas que atuam no setor de energia. Segundo Marco Maciel, economista sênior da Bloomberg Intelligence, é essencial separar a volatilidade do câmbio de sua tendência, que é determinada pelo preocupante quadro fiscal. Na visão dele, embora o real esteja valorizado neste momento, a moeda está à mercê do avanço de propostas do governo para reduzir o déficit primário, como a reforma da previdência e a privatização da Eletrobras.
No ano que vem, a tendência é de mais volatilidade cambial porque ainda não surgiu um presidenciável capaz de atrair mais de um terço das intenções de voto, criando espaço para uma surpresa na eleição ao cargo máximo do País.