Por Josue Leonel e Patricia Lara.
Duas semanas após o susto com a divulgação do áudio de uma conversa entre o presidente Michel Temer e um dos donos da JBS, que fez o dólar superar R$ 3,40, a moeda está de volta ao nível de R$ 3,20. A volatilidade do real contra a divisa americana retomou o mesmo patamar que exibia antes do escândalo. Isso apesar de a crise política que ameaça o governo seguir sem solução e as incertezas com as reformas terem sido reconhecidas pelo próprio Banco Central, que acendeu a luz amarela sobre o ritmo de queda dos juros.
Um dos motivos de o real estar pouco volátil mesmo em meio a tanta incerteza política é o fato de as contas externas continuarem saudáveis, diz o ex-diretor do BC Luiz Fernando Figueiredo, CEO e fundador da Mauá Capital. “O câmbio é o melhor fundamento que o Brasil tem hoje. Não teve choque cambial muito grande com o imbróglio”, diz Figueiredo referindo-se às turbulências políticas.
Figueiredo lembra que o investimento direto do país está resiliente e, do ponto de vista estrutural, o balanço de pagamentos está superavitário. “O mercado não está frágil, apostado em dólar”, diz o ex-diretor que esteve no BC num ano de alta volatilidade, durante a eleição de Lula, em 2002. Outra razão apontada para a calmaria no câmbio é que os estrangeiros, que detinham 21% da dívida local, hoje têm cerca de 13%.
Um motivo adicional da força do real é o fato de os juros brasileiros, mesmo após o Copom cortar a Selic para 10,25%, continuarem muito elevados para os padrões internacionais. Assim, considerando os riscos, valeria a pena para o estrangeiro aplicar no país.
Luciano Rostagno, estrategista-chefe do banco Mizuho, considera surpreendente o comportamento do câmbio após a turbulência inicial causada pela delação da JBS. Ele reconhece que a sinalização de corte menor dos juros dada pelo Banco Central no comunicado da decisão do Copom na quarta-feira pode favorecer a moeda brasileira ao sinalizar que a condição continuará favorável por mais tempo para o investidor carregar o real. Por outro lado, alerta Rostagno, a mensagem dura do Copom, ao alertar sobre o risco enfrentado pelas reformas, tem um aspecto negativo para a percepção de risco e para a moeda.
Além de causar surpresa em parte do mercado, a baixa volatilidade do real também pode trazer contrapartidas negativas. Uma delas é passar uma “mensagem perigosa de que está tudo bem”, diz Luis Otavio Leal, economista-chefe do Banco ABC Brasil. “Esse otimismo do mercado, com juros caindo, dólar voltando a R$ 3,20, atrapalha a solução da crise. É como se o mercado pensasse que, no final, vai tudo dar certo, e se não deu certo ainda é porque não chegou no final.”
Em parte, o fluxo de investimentos e de dólares vendidos por exportadores pode estar ajudando a amaciar o impacto da crise no câmbio, diz Leal. Entretanto, a avaliação de alguns investidores de que, independente do futuro do presidente Temer, as reformas acabarão sendo aprovadas, pode ser uma aposta baseada num quadro ainda incerto. “Talvez as reformas passem, mas, nesse momento, não dá para ter tanta certeza de que isso vai acontecer”, diz o economista do ABC.
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