Fusão Baosteel-Wisco na China é uma gigantesca má ideia

Por David Fickling.

Pobre Baosteel. Ela passou décadas erguendo a mais rara das criaturas, uma siderúrgica estatal chinesa que de fato gera lucros e que não está se afogando em dívidas. Ela sobreviveu, e até prosperou, durante um colapso do mercado de aço que ocorre uma única vez em uma era. As margens se ampliaram no trimestre de março graças a uma recuperação dos preços, de acordo com Yi Zhu, da Bloomberg Intelligence.

E aí vem o governo e força uma fusão com uma das perdedoras.

A proposta de vincular a Baoshan Iron & Steel e a Wuhan Iron & Steel — Baosteel e Wisco — certamente criará uma força impossível de ignorar. Com um total combinado de cerca de 61 milhões de toneladas de produção no ano passado, ela provavelmente vai ser a maior fabricante de aço do mundo depois da ArcelorMittal.

A Wisco acumulou 7,5 bilhões de yuans (US$ 1,1 bilhão) em perdas no ano passado, mas parece estar virando a página. Ela é uma das pouquíssimas siderúrgicas chinesas de grande porte a registrar um modesto lucro no trimestre mais recente, e os analistas estimam que ela ficará no azul até 2018 – então, com sorte, a aliança não vai apenas torrar a receita da Baosteel.

Existe até a perspectiva de sinergias. Ambas as empresas têm fábricas de produtos planos para fabricantes de automóveis, eletrodomésticos e outros clientes de alto valor em uma faixa do leste e do sul da China, o que limita a exposição delas ao comércio no setor de construção, que agora está quente, mas é mais volátil e tem uma margem baixa.

A cidade natal da Wisco fica rio acima da base da Baosteel em Xangai às margens do rio Yangtze, uma das principais artérias de transporte da China continental. Suas operações no sul do país poderiam ajudar a consolidar a exposição da Baosteel à poderosa economia de manufatura de Guangdong. A empresa menor tem até algumas participações em minas offshore de minério de ferro que poderiam ajudar a integrar a cadeia de abastecimento do grupo.

Mas esse é o último aspecto positivo. E, infelizmente, a lista de aspectos negativos também é longa.

A receita da Wisco durante os últimos 12 meses foi de cerca de um terço dos 157 bilhões de yuans gerados pela Baosteel, mas sua dívida líquida de 41 bilhões de yuans equivale a quase três quartos dos 56 bilhões de yuans devidos pela Baosteel. Adicionar a Wisco elevará a dívida da Baosteel para cerca de 64 por cento dos ativos líquidos, em comparação com os 45 por cento atuais — uma deterioração substancial, mesmo que a empresa continue fora da zona de perigo. Tanto a Moody’s quanto a S&P declararam na terça-feira que esse plano é negativo para o crédito da Baosteel.

Além disso, os lucros da Wisco parecem, na melhor das hipóteses, incertos. Embora os analistas não projetem nenhum prejuízo para os próximos três anos, eles também mal preveem lucros — apenas 1,9 bilhão de yuans durante o período, cerca de 1 por cento dos 183 bilhões de yuans em receita estimada. Bastaria uma pequena mudança nos preços do ferro, do carvão ou do aço para empurrar a empresa de novo para o vermelho.

Essas minas de minério de ferro também não são lá grande coisa. Na verdade, não seria condenável pensar que os empreendimentos da Wisco relativos às matérias-primas foram enfeitiçados por algum tipo de maldição ancestral: as unidades de mineração no Brasil e no Canadá, pelas quais pagou em 2009 um total combinado de US$ 640 milhões para participar, quebraram desde então, e seu plano de exportar rocha das montanhas da Libéria, ricas em minério, iniciou as remessas em fevereiro de 2014, dias antes que toda a região se tornasse o epicentro da epidemia de ebola na África Ocidental.

É provável que a Baosteel tenha força para absorver esse golpe, mas ela estaria melhor sem a Wisco. O tamanho não é o mais importante no setor siderúrgico, onde as unidades centrais das grandes produtoras parecem estar comprando e fechando fábricas. A ArcelorMittal, apesar de todo o seu peso, caminha para o sexto ano consecutivo de prejuízos. A nova campeã da China terá um caminho acidentado pela frente.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião da Bloomberg LP e de seus proprietários.

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