Guerra comercial pode aumentar presença do euro em reservas

Por Katherine Greifeld.

Pela primeira vez em uma década, bancos centrais do mundo inteiro não olham somente para o dólar para montar suas reservas cambiais.

Com a ascensão do protecionismo nos EUA, estrategistas de Wall Street afirmam que o euro raramente foi uma alternativa tão boa quanto agora. As crises existenciais da moeda única preocupam menos e a retomada da economia abre espaço para reversão das medidas de estímulo que derrubaram o rendimento de títulos denominados em euros para abaixo de zero. E enquanto o presidente americano, Donald Trump, ameaça iniciar uma guerra comercial com a China, a União Europeia se empenha em acordos de livre comércio pela Ásia e América Latina.

É claro que o dólar ainda representa uma parte imensa dos US$ 11,3 trilhões em reservas internacionais do mundo inteiro e a expectativa é que o quadro se mantenha. Porém, mesmo uma pequena variação – seja para proteção contra a política comercial de Trump ou como forma de diversificação – pode ter enormes consequências. O euro foi rejeitado durante anos por causa dos juros negativos e dos problemas persistentes na zona do euro. Agora, gestores das reservas de alguns dos principais bancos centrais pretendem ampliar os ativos denominados na moeda comum, de acordo com dois estrategistas de câmbio que conversam regularmente com as autoridades.

“Muitos países estão se voltando para a Europa para aumentar a parceria comercial’’, disse Jens Nordvig, que ocupou o topo do ranking de estrategistas de câmbio de Wall Street durante cinco anos seguidos e montou a firma Exante Data. “Não é loucura achar que isso também vai acontecer em termos de mercados de capitais e alocação de reservas. No fim das contas, essa postura comercial dos EUA agora não ajuda a tornar o dólar atraente” para bancos centrais que têm bilhões em reservas.

Nordvig estima que meio trilhão de dólares podem migrar para o euro nos próximos dois anos. Segundo ele, países em desenvolvimento e exportadores de petróleo do Oriente Médio serão os mais inclinados a ampliar as alocações em euros. Seis emergentes — China, Arábia Saudita, Taiwan, Índia, Coreia do Sul e Brasil – detêm quase metade das reservas mundiais, segundo dados compilados pela Bloomberg. Só a China tem mais de US$ 3 trilhões, graças principalmente às exportações baratas para os EUA.

As ramificações são significativas. Por mais de meio século, o dólar tem sido a moeda de reserva favorita dos bancos centrais por causa de seu alcance nos mercados globais e sua estabilidade.

Atualmente, 64 por cento das reservas globais são denominadas em dólares. O euro ocupa um distante segundo lugar, com 20 por cento ou US$ 1,93 trilhão. O resto se distribui entre moedas como a libra esterlina, o iene e o dólar canadense.

Há muito tempo se discute a necessidade de diminuir a hegemonia do dólar na economia global. A introdução do euro, em 1999, precedeu um movimento de diminuição da participação do dólar nas reservas internacionais que durou uma década. Depois disso, havia poucos motivos para se acreditar no euro como resposta.

A participação do euro nas reservas atingiu seu ponto máximo de 28 por cento em 2009. Mas reveses como a crise da dívida europeia, o colapso da Grécia e a decisão do Reino Unido de sair da UE abalaram a confiança na moeda única. Agora, dois motivos sugerem que o euro vai ganhar prestígio.

A economia da zona do euro cresceu 2,3 por cento no ano passado, o ritmo mais rápido em uma década e quase quatro vezes a média do período. Politicamente, a união está mais sólida, especialmente após a eleição de Emmanuel Macron à presidência da França em maio, indo contra a onda anti-UE.

Talvez tão importante quanto os dois fatores internos seja o fator externo Trump. Há pouca dúvida de que, no longo prazo, o protecionismo americano pode prejudicar a posição do dólar no mundo.

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