Impeachment, Brexit, petróleo e Trump: O que esperar para as moedas da América Latina?

A maioria das moedas-latino americanas surpreendeu os mercados com ganhos em relação ao dólar em 2016, apesar dos diversos obstáculos em nível global, como preços fracos das commodities, a decisão do eleitorado britânico de sair da União Europeia e a vitória inesperada de Donald Trump na eleição presidencial dos EUA, além de turbulência política em nível local, incluindo o impeachment no Brasil e a rejeição do acordo de paz na Colômbia.

O desempenho superior de todas as moedas latino-americanas — com exceção do peso mexicano — durante um período difícil intrigou participantes do mercado e intensificou incertezas sobre a direção das taxas de câmbio depois do Ano Novo. Neste contexto, a Bloomberg promoveu um webinar, em 30 de novembro, com o tema: “Impeachment, Brexit, petróleo e Trump: O que esperar para as moedas da América Latina?”

Ralph Cope, especialista sênior em derivativos da Bloomberg, ressaltou durante a apresentação que essas moedas conseguiram avançar neste ambiente desafiador graças aos juros baixos no mundo desenvolvido, que obrigaram investidores a buscar retorno em outras regiões. “Conseguimos superar esses obstáculos por causa da busca por rendimento nos mercados emergentes”, explicou Cope, destacando a “maciça recuperação no carry trade”.

A tendência altista foi contida pela vitória surpreendente de Trump no início de novembro, que valorizou o dólar e deixou investidores no mundo todo se perguntando o que as políticas do presidente eleito vão significar para comércio global, inflação e juros nos EUA – variáveis com impacto substancial sobre os fluxos comerciais e fluxos de investimento em carteira e sobre a atividade econômica em todos os países ao sul da fronteira.

“A maior parte das políticas que ele mencionou durante a campanha implica riscos adicionais para a América Latina”, disse Felipe Hernandez, o economista da Bloomberg Intelligence para a América Latina, enfatizando o aumento do protecionismo comercial (os EUA são o maior ou segundo maior parceiro comercial da maioria dos países da região), o efeito dos planos de gastos em infraestrutura sobre a política monetária dos EUA, além de mudanças nas leis de imigração (que podem reduzir remessas especialmente importantes para o México e a América Central).

“A questão se resume a Trump duro ou Trump leve”, explicou Cope, se referindo a até que ponto o presidente eleito vai cumprir promessas feitas durante a campanha. “O futuro da globalização pode ter uma mudança estrutural. Trump é contra a globalização.”

Além da postura de maior protecionismo comercial, os planos de gastos do novo governo podem elevar a inflação e o endividamento dos EUA e obrigar o banco central (Federal Reserve) a apertar mais a política monetária.

As cotações praticadas nos mercados globais de renda fixa refletem esse cenário e, com o aumento da taxa básica de juros dos EUA, os fluxos de capital para a América Latina certamente serão prejudicados, de acordo com Lizzette Lara, especialista sênior em renda fixa e derivativos da Bloomberg. “Juros maiores pelo Fed serão um enorme desafio para o mercado, de diversas maneiras”, ela afirmou durante a apresentação.

Com tantos pontos de interrogação sobre as políticas do novo governo dos EUA e seu impacto sobre a atividade econômica e os mercados financeiros no mundo todo, as projeções dos analistas para as taxas de câmbio na América Latina em 2017 variam muito, com enorme dispersão para a maioria delas, e para o peso colombiano em especial. Para o peso mexicano, o perdedor do ano, os analistas enxergam espaço para correção, mas o país é o mais exposto a todos os riscos relacionados aos EUA.

“Os analistas estão muito divididos quanto à perspectiva para as taxas de câmbio”, afirmou Hernandez. No entanto, após os ajustes ao longo do último ano, os níveis atuais estão mais alinhados aos fundamentos, uma vez que as autoridades locais usam o regime de câmbio flutuante para absorver choques externos. Assim, mesmo em um ambiente volátil, o espaço para quedas é limitado. “Isso não significa que as moedas não podem se depreciar, mas se isso ocorrer, o ajuste será muito menor do que o observado em 2014 ou em anos anteriores de grandes quedas.”

Fatores domésticos, como índices de inflação, política monetária, resultados fiscais, reformas estruturais, déficits em conta corrente e exportações também afetarão as flutuações dessas moedas em 2017 – e os investidores estarão de olho em oportunidades geradas por essas discrepâncias regionais.

“De um lado, podemos ver o banco central do Chile cortando juros; o Brasil tentando cortar juros e continuar com a ambiciosa agenda de reforma fiscal em 2017; as agências de classificação de risco sendo extremamente ativas em termos de elevação de notas na Argentina”, disse Lizzette Lara. “Haverá divergência na América Latina em termos de risco e recompensa.”

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