Inflação no Brasil não deve recuar para centro da meta tão cedo

Por David Biller.

Por que no Brasil a inflação permanece tão persistentemente alta apesar de haver ainda mais aumentos de taxa de juros no horizonte? A resposta, em uma palavra, é indexação.

Resquício do período de hiperinflação dos anos 1990 no país, quando os aumentos anuais de preços atingiram picos de mais de 6.000 por cento, a indexação foi desenvolvida para proteger as empresas e os cidadãos brasileiros da depreciação do poder de compra ligando determinados custos, como salários, à inflação.

A inflação caiu desde então e atualmente está em 10,67 por cento. Mas com a indexação, os preços de tudo, desde a eletricidade até os gastos com saúde, ainda estão subindo com base em uma série de fórmulas que levam em conta os custos setoriais e um dos muitos índices de inflação do Brasil. Significa, também, que um choque temporário poderia ser computado nos próximos anos. Como resultado, o Barclays diz que o Brasil tem a maior persistência de inflação de todos os mercados emergentes.

Por exemplo, o salário mínimo é elevado com base no PIB de dois anos anteriores, mais a inflação do ano anterior. Isso significa que seu valor aumentou acima da inflação deste ano, aplicando mais pressão para que todos os salários subam. A tarefa do Banco Central de desinflar a economia fica mais difícil quando os consumidores obtêm aumentos reais de salário.

O aluguel é ajustado por um índice composto não apenas pelos preços ao consumidor, mas também pelos preços do atacado; isso significa que o maior fator único de ajuste de um aluguel é a flutuação da soja nos mercados de commodities. Isso também pode criar um ciclo retroalimentador. Os preços mais elevados no atacado aumentam os aluguéis, que então são computados no lado de consumo do índice e, assim, aumentam o aluguel novamente. É pior que kafkiano, diz Paulo Picchetti, pesquisador da divisão de estatísticas públicas do Ibre, o Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas, “porque Kafka é ficção e isso é o mundo real”.

Há também aumentos nos preços que não são estabelecidos formalmente e não contam com uma lógica clara. As empregadas domésticas é que informam aos empregadores o aumento de seus preços, como se cada um recebesse um memorando em casa. Aline Passos, 38, ficou chocada ao saber que as mensalidades da creche de sua filha no Rio de Janeiro tiveram aumentos superiores à inflação — 18 por cento.

“No início de cada ano há um aumento, por causa do aumento dos índices, então eu imaginava que ia subir um pouco, mas acho que subiu demais”, disse Passos por telefone.

Os aumentos exorbitantes podem ter como motivo a abrangência que a inflação ganhou. A difusão aumentou e, segundo a Bloomberg Intelligence Economics, em dezembro a média móvel de 12 meses atingiu seu nível mais alto em pelo menos nove anos. Isso aumenta a inércia impulsionando algumas pessoas a aumentar os preços, mesmo quando isso não se justifica.

“Quando todos os preços estão subindo, quando há muita dispersão de preço, é mais fácil realizar um aumento furtivo”, disse Alberto Ramos, economista-chefe do Goldman Sachs Group para a América Latina, por telefone.

Quem remarca preço também utiliza as projeções de inflação para fazer seu próprio ajuste e ultimamente as expectativas dispararam. A perspectiva dos traders para 10 anos, por exemplo, subiu para aproximadamente 9 por cento.

Tudo isso deixa a inércia inflacionária no nível mais alto em mais de uma década, segundo Ramos, do Goldman. Bem recentemente, em 2013, um choque inflacionário demorava quatro a cinco meses para diminuir substancialmente. Agora leva cerca de um ano e meio.

Não fosse pela inércia inflacionária, os aumentos nos preços ao consumidor em 2016 seriam 1,5 ponto percentual menores — mais próximo do centro da meta do governo, de 4,5 por cento, segundo Flávio Serrano, economista sênior do banco de investimento Haitong em São Paulo. No ritmo atual, os economistas consultados pelo Banco Central preveem que a inflação não recuará para o centro da meta antes de 2019 — dois anos mais tarde que o pretendido pela autoridade monetária.

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