Investimentos sustentáveis: da estratégia à realidade

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Nos últimos anos, foi dramático o aumento do valor de ativos financeiros globais que visam a sustentabilidade e a integração de questões ambientais, sociais e de governança nas análises de investimento e engajamento de acionistas. Não surpreende que muitas gestoras de fortunas familiares (family offices) estejam abraçando estratégias próprias de investimento sustentável.

Apesar dos desafios, diversas gestoras de fundos, prestadoras de serviços e controladoras de ativos fazem progressos reais e encontram formas realistas de analisar dados que são frequentemente formatados de modo inconsistente e extraídos de fontes não completamente confiáveis.

Superando obstáculos

Pesquisas do Instituto Mundial de Recursos (WRI) ilustram os obstáculos enfrentados pelos investidores. Em 2015, essa organização se comprometeu com a aplicação de pesquisas e doações para avançar práticas de investimento sustentável no mercado tradicional, transferindo capital para companhias que se empenham em criar um futuro mais sustentável.

O mercado está pronto para os investimentos sustentáveis e existe um “entusiasmo tremendo, especialmente por parte dos proprietários dos ativos”, disse Elizabeth Lewis, responsável pela área no WRI. O rápido crescimento do mercado cria uma infraestrutura que dá cada vez mais apoio aos investimentos sustentáveis, incluindo novos padrões, dados e produtos para medir desempenho.

Apesar desse progresso, o mercado ainda é imaturo. “Diversos gargalos permanecem e impedem a adoção maior dos investimentos sustentáveis”, afirmou Lewis.

De fato, os investidores ainda enfrentam problemas, apesar dos muitos fatores que incentivam o investimento sustentável, sendo o mais importante a evidência crescente de correlação relevante entre sustentabilidade corporativa e desempenho financeiro.

Um desafio é a elaboração de estratégias de investimento alinhadas às políticas ambientais, sociais e de governança do family office. Esse esforço costuma se deparar com inércia, sistemas limitados, prestação de contas e dados inadequados, além de lacunas na cadeia de investimento.

A inércia frequentemente resulta de questões humanas — terminologia confusa, falta de atenção dos conselhos de diretores e definições distintas de obrigação fiduciária. Além da falta de sistemas adequados para tomada de decisões, insuficiências nos dados e na cadeia de investimentos são desafios de natureza estrutural.

Por exemplo, é comum haver dados sobre as atividades ambientais, sociais e de governança de determinado setor ou empresa, mas de forma espalhada e inconsistente — especialmente quando se originam em mercados emergentes. Por exemplo, encontrar os “maiores poluidores” durante o processo de seleção não necessariamente ajuda a identificar peças da solução, como empresas que desenvolvam tecnologias para limitar as emissões de carbono.

Quanto às lacunas na cadeia de investimento, em se tratando de investimento sustentável, os donos de ativos não têm os produtos necessários para preencher uma carteira verdadeiramente global em todas as classes de ativos. Diversos produtos têm foco limitado ou escala insuficiente para preencher uma carteira global da qual um investidor institucional precisa.

Segundo Lewis, o WRI adotou uma abordagem tripla a essas questões:

• Desenvolver sistemas práticos para ajudar investidores a avançar da discussão à implementação.
• Fazer com que as pesquisas da organização cheguem aos investidores, colocando análises em formatos e plataformas que eles de fato utilizem.
• Estimular a oferta no mercado para preencher lacunas existentes.

“Trabalharemos com gestores de investimentos e outros para construir um produto baseado nos sistemas que usam os objetivos de desenvolvimento sustentável e as pesquisas do WRI, que proporcionarão as informações certas para permitir decisões de investimento melhores”, ela explicou.

Soluções exigem esforço

O trabalho do WRI claramente ajudou a mapear o território de investimentos sustentáveis e soluções para proprietários de ativos. Em um webinar recente, o especialista em aplicações da Bloomberg, Lee O’Dwyer, descreveu um desses proprietários, a Fundação Heron, como “grande exemplo de alinhamento de missões”. No entanto, segundo a diretora e presidente da fundação, Clara Miller, esse alinhamento exigiu um esforço extraordinário.

Quando o trabalho começou há cinco anos, a ideia parecia simples: “somente descobrir o que tínhamos”. Não foi nada simples. Para obter uma visão verdadeira de sua carteira, Miller conta que a Fundação Heron precisou analisar os empreendimentos e não a classe de ativos. A lógica? “É lá que o impacto realmente acontece”, ela explicou.

A fundação examinou 7.000 posições de investimento e descobriu que algumas eram contrárias a sua missão. “Nossa missão é ajudar pessoas a sair da pobreza e nós investíamos na (administradora de prisões) Corrections Corporation of America e em algumas das instituições de empréstimo mais predatórias do país”, ela disse. “Aprendemos muito.”

As descobertas da fundação foram um alerta e, em dezembro de 2016, sua carteira atingiu alinhamento de 100 por cento. Para chegar lá, trabalhou de perto com seus gestores de investimento para criar diretrizes que descrevessem os tipos de ativos desejáveis.

Para Miller, manter a carteira 100 por cento alinhada com seus objetivos “significa otimização contínua exatamente da mesma forma que se faz com a otimização financeira da carteira”. A fundação agora vê missão e finanças de forma conjunta na carteira, o que pode ser “uma tarefa ambiciosa”.

Será que esse trabalho vai ficar mais fácil? Miller entende que muitos sistemas estão disponíveis, mas também vê “selvas de dados” e “desertos de dados”. Ela destacou a falta de bons padrões de dados que sejam comparáveis de setor para setor.

“Acho que a realidade é que precisamos criar e investir no desenvolvimento de infraestrutura muito robusta, incluindo gestores focados especificamente em questões ambientais, sociais e de governança”, ela disse.

“Não deveríamos pensar nisso como algo diferente dos investimentos. Se vamos sobreviver a este século ou aos próximos 10 anos, isso precisa se tornar o padrão para investimento e gestão de todas as companhias.”

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