Por Katia Porzecanski.
Risadinhas e piadas sobre a “mulher desagradável” ecoam pelos pregões quando Hillary Clinton aparece na TV. A explicação condescendente do chefe de que isso não passa de ‘conversa de vestiário’de homens, então deixe para lá.
Nunca foi fácil ser mulher em Wall Street. Mas, para muitas, esta época de eleição polarizadora nos EUA abriu feridas antigas — e, em alguns casos, feridas novas — porque a mordacidade contagiou o ambiente de trabalho.
A questão transcende a política pessoal. Tanto republicanas quanto democratas afirmam que a candidatura de Donald Trump e Hillary Clinton provocou um nível muito maior de reflexão sobre o machismo no setor financeiro dos EUA. E, independentemente de quem ganhar na próxima quinta-feira, essas questões não vão desaparecer.
Entrevistas realizadas com mais de uma dúzia de mulheres de todo o espectro de Wall Street — dos 28 aos 66 anos, representantes de empresas tanto de pequeno quanto de grande porte — compõem um retrato complexo de como esta eleição está modelando as conversações no ambiente de trabalho e o comportamento no setor.
Muitas mulheres mais velhas que ocupam cargos seniores dão de ombros e dizem que pelo menos as coisas estão melhores do que eram. Alguns fatos básicos confirmam esse argumento: as mulheres agora representam quase metade da mão de obra da indústria financeira, o treinamento contra assédio se tornou norma e diversas firmas deram início a iniciativas para reduzir a marginalização feminina. Muitas mulheres mais jovens que estão tentando subir na hierarquia, no entanto, afirmam que a discriminação deixou extremamente claro que ainda há um longo caminho pela frente.
Principais preocupações
Entrevista após entrevista, duas preocupações principais surgiram. Elas estão incomodadas com o aumento das brincadeiras inadequadas que perceberam entre seus colegas do sexo masculino à medida que a campanha de Trump avançava. E elas se perguntam como vão avançar na carreira se seus colegas questionam se Hillary é apta para a presidência pelo fato de ela ser mulher.
Muitas mulheres afirmam que a discriminação, sutil ou não, é inevitável em um setor dominado por homens. De fato, elas temem que falar abertamente sobre isso prejudique sua carreira. A maioria das entrevistadas pela Bloomberg falou sob condição do anonimato, porque receia perder o emprego ou ser excluída pelos colegas. Como disse uma delas, a política de gênero é um problema ignorado: a maioria das mulheres quer falar sobre isso, mas poucas acham que podem.
Uma executiva de um grande hedge fund, que afirmou ser republicana, disse que ouvir colegas homens menosprezarem Hillary — “potencialmente a pessoa mais poderosa do mundo” — de formas que nunca fariam com um homem fez com que ela se perguntasse o que eles dizem dela pelas costas.
Uma gerente sênior de outro hedge fund, que é democrata, disse que, embora Hillary tenha seus defeitos, muitos dos ataques ferinos que ela escuta dos homens “soam muito parecidos com as críticas que posso imaginar que eles fazem a mim: ela é ríspida demais, não se adequa ao papel feminino, ela se veste como um homem, ela é desagradável”.
“Essa questão é enorme, enorme”, continuou ela. “Ou você é mulher, ou você é líder. Existe uma crença de que você não pode ser ambos.”
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