Por Mark Whitehouse.
Quase uma década depois da crise que quase derrubou o sistema financeiro global, os mercados ainda não demonstram muita confiança nos bancos. É um fenômeno preocupante que governantes da Europa e dos EUA preferem ignorar.
É compreensível que, depois de anos de negociações e milhares de páginas de novas regras, as autoridades reguladoras queiram declarar missão cumprida. Elas mudaram o modo de supervisionar o sistema, reorganizaram os mercados de derivativos, sujeitaram os bancos a testes de estresse periódicos e instituíram uma infinidade de exigências de prestação de contas. Para aumentar a capacidade dos bancos de absorver perdas, as autoridades exigiram centenas de bilhões de dólares em capital adicional.
Porém, como ressaltou o ex-secretário do Tesouro americano Larry Summers, os mercados aparentemente não acreditam que os bancos estejam mais saudáveis. Isso se reflete na forma de avaliação do patrimônio líquido dos bancos — ou seja, o quanto os ativos que as instituições relatam excedem seus passivos. No início da década de 2000, geralmente os investidores estavam dispostos a pagar US$ 2 ou mais por US$ 1 em patrimônio contábil, sinalizando que confiavam na contabilidade dos bancos e esperavam lucros significativos. Agora, mesmo após a disparada das bolsas após a eleição de Donald Trump à Casa Branca, os cinco maiores bancos dos EUA são avaliados ao redor de US$ 1,16 por US$ 1 em patrimônio contábil. Os cinco maiores bancos europeus são avaliados por ainda menos.
O que se passa? Uma das explicações é a queda da lucratividade. As previsões de crescimento econômico são bem menores do que em 2007 e os investidores não podem esperar que os bancos ganhem tanto dinheiro. Além disso, os novos regulamentos demandam que os funcionários se ocupem mais com coleta de dados, avaliação de riscos e elaboração dos piores cenários possíveis.
No entanto, a taxa de retorno menor não basta para explicar toda a diferença. A confiança tem papel importante também. Após uma crise na qual instituições supostamente bem capitalizadas se viram em apuros, é compreensível que os investidores não tenham muita fé nos números apresentados pelos bancos. Talvez os investidores estejam reconhecendo o que o ex-comandante do Banco da Inglaterra Mervyn King chama de “incerteza radical”: é impossível prever e designar probabilidades a tudo o que pode dar errado com um banco.
Qual é o caminho? Simplificar os regulamentos pode ajudar. Muitas das regras mais onerosas surgiram porque os bancos resistem à abordagem elegante de aumentar significativamente o capital para absorver perdas. Mesmo tendo captado tanto nos últimos anos, o patrimônio líquido dos maiores bancos representa, na média, aproximadamente 6 por cento do total de ativos (segundo padrões contábeis internacionais). Se a parcela fosse mais próxima de 20 por cento (o suficiente para enfrentar algum desastre imprevisto e ainda manter uma boa capitalização), os bancos inspirariam maior confiança e exigiriam menos supervisão.
Ao tornar os acionistas mais responsáveis por perdas, o capital adicional também poderia criar incentivo para destravar valor, por meio da divisão dos bancos de maior tamanho e complexidade em pedaços mais administráveis e inteligíveis.
Porém, o patrimônio líquido apenas não é suficiente. Qualquer instituição que dependa de captações de curto prazo para realizar investimentos de longo prazo pode ser motivo de pânico no mercado, com repercussões em toda a economia. Somente uma reestruturação muito mais radical do sistema financeiro poderia tratar dessa fraqueza. King, por exemplo, propõe um sistema no qual o banco central efetivamente garante todas as dívidas de curto prazo e restringe severamente os tipos de investimentos que podem ser financiados com as mesmas.
Junto com exigências maiores de reservas de capital, essa abordagem permitiria a eliminação de quase todas as outras regras.
Os mercados deram o alerta: a mudança fundamental que a crise exigia não se concretizou. A batalha por mudanças incrementais causou exaustão e não consertou um sistema falho. Talvez seja necessário outro enorme desastre para a lição ser aprendida.
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