O ajuste fiscal vai tirar o Brasil da crise?

Notícia exclusiva por Josué Leonel.

Voltar a crescer a taxas superiores ao desempenho medíocre dos últimos anos exige mais do que a aprovação do ajuste fiscal. O ajuste é indispensável para livrar o Brasil da temida perda do grau de investimento, mas não assegura necessariamente a volta do vigor econômico. Para isso, as mudanças terão de ser mais amplas e profundas.

A boa notícia é que, ainda em estágio preliminar, as mudanças estão sendo sinalizadas em várias frentes. No campo macroeconômico, mudanças estão em curso tanto na área fiscal quanto no combate da inflação. E crescem os sinais de que as licitações e vendas de ativos estatais entram com mais força na agenda do governo.

As concessões de estrutura podem abrir ao Brasil “oportunidades enormes’’; são uma grande oportunidade de o Brasil melhorar a eficiência e voltar a crescer em ritmo mais sustentado nos próximos anos, diz o ex-ministro da Fazenda e sócio-gestor da Tendências Consultoria Maílson da Nóbrega. Atrair o capital privado será essencial sobretudo na realidade atual, quando até mesmo investimentos públicos são sacrificados pelo ajuste fiscal.

Evitar o risco de um longo período de baixo crescimento, contudo, exige uma “mudança cultural’’ no governo e no Congresso em relação ao papel crucial do investimento privado e à responsabilidade fiscal. É preciso acabar com a “visão equivocada” de querer determinar a taxa de lucros dos investidores’’ e de que ajuste fiscal é ’’coisa de neoliberal, de FMI’’, diz o ex-ministro.

Ao contrário de tentar impulsionar o PIB a qualquer custo, como se tentou no 1º mandato da presidente Dilma, é necessário focar no aumento do ’’PIB potencial’’, que representa a capacidade de um país crescer sem pressões de inflação ou déficit em conta corrente. Para isso, segundo Maílson, a única receita é aumentar a produtividade, criando um ambiente de negócios previsível para os investimentos. ’’Investimos só 17% do PIB, o que mal dá para repor a depreciação’’.

No caso do ajuste fiscal, embora as medidas enfrentem resistências no Congresso, o ex-ministro cobra também um maior engajamento da presidente Dilma. “Sem a liderança da presidente, prevalece um ambiente de irresponsabilidade no meio político, em uma mistura de ideologia com ignorância que gera um coquetel explosivo”.
Votações recentes no Senado, que mutilam as medidas de corte de gasto e criam novas despesas, são exemplos citados pelo ex-ministro. O governo tenta disciplinar o acesso ao seguro-desemprego após explosão nos gastos com estes benefícios. No caso do seguro-desemprego, os gastos explodiram em um período de desemprego historicamente baixo, evidenciando uma distorção que a equipe econômica considera necessário ser corrigida, mas que passa a ser defendida por setores do Congresso como direitos dos trabalhadores.

“Depois que se cria um benefício social, o governo não consegue mais reverter, ainda que se prove que ele é insustentável economicamente”. Ao mesmo tempo, em pleno ajuste fiscal, observa Maílson, o Senado aprovou aumento para o Judiciário, justamente um setor que já tem salários altos mesmo para padrões internacionais. “Essa cultura política é um obstáculo à correção de erros”.

Mesmo a oposição é cobrada por Maílson a agir com limites em sua prerrogativa de se opor ao governo. ’’O PSDB está fazendo o que o PT fazia quando era oposição. Votou contra o fator previdenciário, criado no governo FHC, o que é incompreensível’’.

Embora o ajuste fiscal possa não ser suficiente para recuperar a competitividade da economia, ele é indispensável para evitar o pior, que seria o Brasil perder o grau de investimento. “Se o ajuste fiscal não sair, apertem os cintos. Vamos entrar em uma crise muito brava”.

Caso perca o grau de investimento, avalia o ex-ministro, o Brasil deixará de participar de um mercado de capitais de US$ 15 trilhões para disputar recursos em um mercado de apenas US$ 1,5 trilhão. Este mercado menor é o destinado aos ’’países junk’’, considerados devedores duvidosos, que recebem menos financiamentos e ainda pagam mais caro. O Brasil sofreria uma piora abrupta, com o dólar podendo bater em R$ 4,00, ao contrário da melhora que houve quando o grau de investimento foi conquistado, que foi mais gradual.

O medo do rebaixamento do rating, que esteve por trás da deterioração vista nos mercados em março, foi aliviado pelas mudanças já sinalizadas ou em vias de implementação pelo governo. Isso ajudou o dólar a se acomodar, embora ainda com volatilidade, ao redor de R$ 3,00 nas últimas semanas. Ao mesmo tempo, alguns indicadores de confiança pararam de piorar. A expectativa de volta do crescimento, porém, ainda é tímida.

Economistas do mercado pesquisados pela Bloomberg esperam um PIB de +1,2% em 2016 e +2% em 2017, números ainda muito baixos comparados à expansão em torno de 4% da década passada, embora melhores comparados à recessão de 1% esperada para 2015 e à estagnação em 2014. O risco de um desastre com o rebaixamento diminuiu. Mas a ameaça de o País seguir no crescimento medíocre dos últimos anos ainda persiste e deve exigir muito trabalho.

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