Por Mohamed A. El-Erian.
No dia 6 de janeiro, o Departamento de Trabalho dos EUA divulgará o último relatório mensal sobre emprego do que foi um período histórico de oito anos de criação de vagas durante o governo de Barack Obama. O período confirmou algumas de nossas crenças sobre a economia, mas também expôs as limitações de nosso entendimento sobre uma situação de emprego com mudanças estruturais.
Aqui estão três conclusões importantes sobre este período, além das implicações no curto e longo prazo.
1. A economia dos Estados Unidos pode perder muitos empregos rapidamente. Felizmente, também pode se restabelecer como um dos melhores motores globais de criação de postos de trabalho.
Com o furor da crise financeira no começo de 2009, os primeiros meses do governo Obama foram marcados por um dramático número de demissões, chegando a 8 milhões de postos eliminados enquanto a taxa de desemprego subia para mais de 10 por cento. A causa imediata foi o mau funcionamento dos mercados financeiros, que afetaram até as transações de negócios mais básicas, tais como o financiamento ao comércio e o crédito aos fornecedores. E, com a atividade econômica em colapso no resto do mundo, serviu como um vívido lembrete de que as economias de hoje, sofisticadas e hiperconectadas, são particularmente vulneráveis a “paradas repentinas” das finanças globais.
Depois que agressivas políticas de intervenção ajudaram a normalizar os mercados financeiros, tanto localmente quanto internacionalmente, o rápido ritmo de demissões deu lugar a um período histórico de forte geração de empregos. No geral, o Departamento de Estatísticas informa que mais de 14 milhões de empregos foram criados no período, quando os EUA recuperaram sua posição de motor de crescimento global, apesar de os desafios terem sido maiores do que em épocas anteriores. No processo, a taxa de desemprego caiu para menos de 5 por cento, um nível amplamente considerado como sinal de “pleno emprego”.
2. Nem todos os aspectos do mercado de trabalho estão se comportando “normalmente”, e aqueles que não estão continuam sendo uma incógnita.
Embora muitos empregos tenham sido criados na impressionante recuperação dos obscuros dias da crise financeira global, outros elementos do mercado de trabalho não reagiram como esperado com base na experiência histórica.
Os reajustes salariais permaneceram bastante anêmicos, embora o contexto indicasse escassez de mão de obra. Além disso, a taxa de participação na força de trabalho, de 62,7 por cento em novembro de 2016, não conseguiu subir em relação aos menores níveis em décadas, enquanto a relação emprego/população parece estar estagnada no baixíssimo nível de 59,7 por cento.
Fatores cíclicos, como a adoção de uma política macroeconômica desequilibrada, que tem se apoiado excessivamente e por muito tempo em medidas monetárias não convencionais, e que não usou suficientemente a política fiscal, desempenharam um papel. Felizmente, isso pode ser corrigido se um Congresso mais eficiente permitir uma resposta com uma política mais abrangente, que favoreça a “Main Street” (o americano médio) tanto, se não mais, quanto “Wall Street”. Mas suas influências restritivas podem parecer fracas diante das influências mais estruturais e seculares, como demografia, globalização e tecnologia. Essas questões mais complexas também contribuem para dois outros enigmas econômicos, os da estranhamente lenta produtividade e dos investidores corporativos estranhamente hesitantes.
3. Esses fatores estão relacionados com uma realidade maior e ainda mais complexa que está gradualmente se impondo sobre o funcionamento do mercado laboral: a natureza mutável do trabalho.
Começamos a entender aos poucos até que ponto a natureza do trabalho está em processo de mudança, particularmente com inovações que permitem novas formas de fazer as coisas e que substituem outras, às vezes, abruptamente. Uma força particularmente potente a esse respeito vem da influência do progresso tecnológico, da inteligência artificial, de big data e da mobilidade, que estão em constante mudança. Com uma compreensão analítica apenas parcial da dinâmica de um mercado de trabalho em mutação e com a polarização política que limita uma evolução oportuna das políticas, o aparato da elaboração de políticas tem encontrado dificuldades em acompanhar as realidades em campo. Com isso vêm os riscos de sucumbir agora às tentações de políticas (tais como protecionismo e regulação sufocante para proteger o que está ultrapassado) que, embora confortavelmente familiares, podem negar a realidade em vez de se adaptarem a ela e moldá-la para fornecer melhores resultados sociais.
Esses três fatores vêm acompanhados de um conjunto bastante variado de projeções para o que está por vir, começando pelo relatório de emprego de dezembro.
No curto prazo, os EUA provavelmente continuarão a criar empregos, mostrar algum tipo de ganho salarial e, talvez, até ver uma pequena alta na taxa de participação. Tudo isso será parte do pouso suave de vários meses do mercado de trabalho, no qual a criação mensal de empregos totaliza, em média, 150.000 postos, o aumento salarial anual está perto de 3 por cento e a relação emprego/população sobe, mas muito lentamente. É um ambiente que irá validar o sinal do Federal Reserve de três altas do juro em 2017, e, dependendo da extensão da política de reequilíbrio, aqui e na Europa, colocará uma maior pressão de valorização sobre o dólar.
No longo prazo, o mercado de trabalho continuará a evoluir de uma maneira que favorece capacitações mais sofisticadas, transforma atividades mais simples por meio de uma expansão da economia do compartilhamento e coloca uma pressão ainda maior sobre atividades que exigem qualificação mediana ou baixa. Até que ponto isso se traduz em maiores instabilidades socioeconômicas e amplifica as políticas da ira está longe de ser predestinado. Vai depender muito da política da reação.
Um conjunto de respostas de políticas proativas, tais como o fortalecimento da aquisição de qualificações, reforma educacional e aumento de programas de adaptação, já conta com um notável grau de consenso político e analítico, assim como ações de capacitação, tais como maior gasto em infraestrutura, eliminação de distorções tributárias e aumento da eficácia de incentivos fiscais. Algumas medidas que são mais defensivas, como o reajuste do salário mínimo, também estão ganhando força. E há o conceito significativamente mais polêmico da renda básica universal. Neste caso, as transformações no mercado de trabalho precisariam ser muito mais profundas e mais perturbadoras para que esta medida aparentemente simples, mas, na verdade, complexa e difícil de implementar, tenha uma probabilidade razoável de ver a luz do dia.
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