Por Mohamed El-Erian.
Com a economia dos EUA ainda abaixo de seu potencial e os enormes obstáculos para o crescimento no restante do mundo, a divulgação da ata da reunião de julho sobre a política econômica do Federal Reserve, nesta semana, deveria suscitar muito interesse entre os economistas e os participantes do mercado. Vejo cinco áreas em que a ata poderia contribuir para dar uma ideia de como as autoridades percebem o balanço de riscos e quais medidas elas poderiam tomar.
1) Empregos e salários
O mercado de trabalho parece muito mais forte após os dados decepcionantes do mês de maio, com os empregadores gerando muitos empregos, o crescimento salarial aumentando e a taxa de desemprego permanecendo relativamente baixa. Isso indica que a estagnação está desaparecendo, mas com uma importante ressalva: a taxa de participação da força de trabalho está se recuperando de um valor perto do mínimo de várias décadas, o que é uma boa notícia, sugerindo que a economia ainda não atingiu o pleno emprego (o ponto além do qual a inflação tende a se tornar um problema). O que não sabemos — e é aí onde a ata pode dar algumas pistas — é quanto falta, na perspectiva das autoridades do Fed, para atingir a meta do pleno emprego.
2) Produtividade
A produção por hora dos trabalhadores dos EUA vem em baixa. Isso contribuiu para a divergência entre o mercado de trabalho robusto e a economia geral, onde o crescimento continuou frustrantemente baixo nos seis primeiros meses deste ano. Os economistas têm várias explicações para esse desempenho ruim da produtividade, que vão de falhas dos indicadores a forças de longo prazo muito mais significativas. Pode ser que na ata as autoridades do Fed forneçam algumas indicações, mas elas estarão longe de serem decisivas.
3) Inflação baixa
Mais de sete anos de recuperação econômica se passaram e o Fed ainda não atingiu a meta de 2 por cento de inflação. A ata pode lançar luz sobre até que ponto as autoridades estão dispostas a admitir a possibilidade de que isto seja muito mais do que uma insuficiência cíclica e de que fatores seculares e estruturais mais profundos — como as influências desinflacionárias internacionais e as mudanças tanto no mecanismo de transmissão monetária quanto no processo de formação dos salários — podem estar envolvidos. Como destacou o presidente do Fed de São Francisco, John Williams, em comentários recentes, também há certa discussão — embora bastante polêmica — sobre se o Fed deveria elevar sua meta de inflação para mitigar o risco persistente de deflação.
4) Ameaças externas
As autoridades do Fed sem dúvida ficaram aliviadas de a decisão do Reino Unido, em referendo, de sair da União Europeia não ter provocado distúrbios graves na economia da Europa nem nos mercados financeiros. No entanto, estes ainda são os primeiros dias do que promete ser um período prolongado de negociações entre o Reino Unido e seus parceiros europeus, com eventuais repercussões econômicas, institucionais e políticas. Com os números recentes de crescimento sinalizando cautela tanto na Europa quanto no Japão, o Fed terá que acompanhar de perto os efeitos do que continua sendo uma economia mundial frágil. O que não está claro, porém, é o peso que o Fed confere às influências internacionais em relação às nacionais. A ata pode ajudar nesse sentido.
5) A efetividade das políticas do Fed
Desde o primeiro dia as autoridades do Fed reconheceram que suas políticas experimentais contemplavam o risco de consequências imprevistas e até mesmo de danos colaterais. Ao sinalizar, em agosto de 2010, o começo da QE2 — uma segunda rodada de compras de títulos com o objetivo de estimular o crescimento – o então presidente do conselho Ben Bernanke apontou para uma equação de “benefícios, custos e risco”. O impacto líquido fica cada vez mais incerto quanto mais longo for o período em que o país depender dessas medidas extraordinárias para resolver seus problemas econômicos. Um risco grande — que as autoridades poderiam hesitar em discutir abertamente — é que um estímulo monetário tão extenso quanto este conduza à instabilidade financeira que, por sua vez, poderia prejudicar o consumo e o crescimento.
Em suma, creio que a ata retratará que a economia dos EUA está forte o bastante para suportar as forças contrárias externas, mas ainda tem dificuldades para funcionar a todo vapor e recuperar seu potencial de longo prazo. Mesmo que o Fed mantenha uma postura cautelosa, medida e baseada nos dados, admitindo que ainda existam áreas de incerteza analítica, isso não significará necessariamente que o banco central sinalizará inação.
Há um reconhecimento crescente, no Fed e em outros lugares, de que as expectativas de um período ainda mais prolongado com taxas de juros ultrabaixas podem comprometer a integridade, a solidez e o funcionamento eficaz do sistema financeiro. Por isso, o Fed deixará a porta aberta para um aumento dos juros em setembro, e muito mais aberta para dezembro — na esperança de que as políticas do país possam deixar de depender excessivamente do banco central e adotar uma resposta mais abrangente, com medidas mais equilibradas de gestão da demanda, reformas estruturais para aumentar o dinamismo da economia, ações para lidar com os focos de endividamento excessivo e uma coordenação global muito melhor.
(Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial nem da Bloomberg LP e de seus proprietários.)
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