O sonho do Canal da Nicarágua

Por Michael McDonald.

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É difícil ver progresso no canal feito pela China e avaliado em 50 bilhões de dólares.

A pequena cidade de El Tule, na Nicarágua, aparece como um ponto fundamental naquele que será o maior projeto de infraestrutura que a região já viu, com a construção de um canal de 50 bilhões de dólares que deve percorrer 274 quilômetros da costa leste a oeste do país.

Entregue dois anos atrás pelo presidente Daniel Ortega a um empresário chinês obscuro chamado Wang Jing, a concessão exige que El Tule seja destruída, basicamente apagada, para abrir espaço para o canal antes que caia no lago e se encontre com o Oceano Pacífico alguns quilômetros depois.

A ideia é que o canal consiga atrair várias das grandes embarcações que o Canal do Panamá — localizado a apenas 482 quilômetros ao sudoeste — teve dificuldades, historicamente, em acomodar.

O prazo para o fim da construção foi definido em 2020. Ainda assim, uma visita de quatro dias por El Tule e regiões próximas marcadas como cruciais para o início da construção parece reforçar a crença, compartilhada por especialistas dentro e fora da Nicarágua, de que esse projeto não vai ser realizado.

Os moradores da cidade não veem nenhum sinal de operários do canal em meses. É verdade que, como os defensores do canal gostam de lembrar, obras públicas desse tamanho tendem a acontecer aos trancos e barrancos. O próprio Canal do Panamá levou décadas em obras. Contudo, para um projeto que fez tão pouco sentido para diversos especialistas, que se mostraram céticos desde o início, a falta quase completa de progresso inicial — combinada com as dificuldades de conseguir financiamento — está apenas aumentando essas dúvidas.

Sverre Svenning, especialista em navegação na norueguesa Fearnley Consultants AS, acredita que o plano de expansão do Canal do Panamá, de 5 bilhões de dólares, vai conseguir acomodar melhor os maiores cargueiros. O tráfego, no geral, ele afirma, não é forte o suficiente para sustentar uma segunda rota. Há, também, o trabalho gigantesco de engenharia e os desafios ambientais que precisam ser superados, como, por exemplo, garantir que os vulcões do país não causem problemas ao canal, afirma Eric Farnsworth, vice-presidente do Conselho das Américas. “Estou bastante cético”, disse.

Ainda que Wang, um bilionário que fez fortuna prioritariamente no setor de telecomunicações, não tenha recebido apoio oficial de Pequim, especialistas em China afirmam que é pouco provável que ele tenha fechado o acordo sem ter tido sinal verde do governo do seu país.
 

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Ao aumentar sua influência por toda a América Latina e no restante do mundo em desenvolvimento, o histórico da China nesses megaprojetos é irregular. Diversos deles foram congelados mesmo depois de as empresas começarem a trabalhar, como o resort de 3,5 bilhões de dólares nas Bahamas e a reforma na refinaria da Costa Rica de 1,3 bilhão de dólares. Em resposta aos questionamentos nesta semana, o grupo de Wang, HKND, baseado em Hong Kong, disse que a construção do porto na costa do Pacífico vai começar ainda neste ano, discurso que foi feito também em Manágua por Manuel Colonel Kautz, o chefe da organização do governo responsável pelo canal.

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