Este artigo foi escrito por Kate Lee, líder global de Regulatory Data Solutions, e Thomas Labbe, gerente do Regulatory Data Product da Bloomberg.
Desde a entrada em vigor do IFRS 9, em janeiro de 2018, as instituições financeiras passaram a aplicar padrões rigorosos na classificação e mensuração de instrumentos financeiros. No centro desse cenário está o teste de Pagamentos Exclusivos do Principal e dos Juros (SPPI), que determina se os fluxos de caixa contratuais de um ativo financeiro estão alinhados a um acordo básico de empréstimo.
Aparentemente simples, esse requisito tornou-se um desafio para as empresas, envolvendo tanto questões operacionais quanto de gestão de dados, especialmente à medida que os produtos financeiros se tornam mais complexos e passam a incorporar funcionalidades ligadas aos princípios de sustentabilidade.
Nesse cenário, este artigo analisa como as mudanças do IFRS 9 impactam o teste SPPI para títulos vinculados à sustentabilidade e como as equipes de risco, contabilidade e dados podem se preparar para as novas demandas de dados e compliance.
O que é o teste SPPI no IFRS 9?
A classificação de um ativo financeiro sob o IFRS 9 depende:
- do modelo de negócios no qual o ativo é mantido; e
- das características de fluxo de caixa contratuais, avaliadas pelo teste SPPI.
Se os fluxos de caixa forem de pagamentos exclusivos do principal e dos juros sobre o saldo principal, o ativo pode se qualificar para custo amortizado ou valor justo por meio de outros resultados abrangentes (FVOCI). Caso contrário, ele deve ser mensurado pelo valor justo por meio do lucro ou prejuízo (FVTPL).
Esse teste garante que instrumentos com alavancagem, funcionalidades acionárias semelhantes ou derivativos incorporados que alterem as características básicas do empréstimo sejam excluídos do tratamento de custo amortizado ou FVOCI.
O impacto das emendas do IFRS 9 no teste SPPI e nos recursos de cupom
Em 30 de maio de 2024, o International Accounting Standards Board (IASB) emitiu emendas ao IFRS 9 e IFRS 7, após a Revisão pós-implementação (PIR) dos requisitos de classificação e mensuração. Um dos principais pontos de esclarecimento foi o tratamento dos instrumentos financeiros com mecanismos de ajuste de cupom, um tema que ganhou enorme relevância com o avanço das finanças sustentáveis.
Essas emendas têm o objetivo de elucidar se os recursos de ajuste de cupom, como taxas de juros vinculadas à sustentabilidade, afetam a avaliação do SPPI. Quanto a elas, é importante ressaltar:
- as emendas destacam que os termos contratuais que causam variações nos fluxos de caixa com base em metas de sustentabilidade ainda podem passar no teste SPPI, desde que consistentes com um acordo básico de empréstimo;
- isso inclui os títulos vinculados à sustentabilidade (SLBs), mesmo sem menção explícita a eles na norma.
Tais mudanças entrarão em vigor para os períodos de preparação de relatórios anuais com início em ou após 1º de janeiro de 2026, o que concede às empresas pouco tempo para adaptar seus sistemas e metodologias.
O desafio dos dados no SPPI para títulos vinculados à sustentabilidade
Embora as diretrizes de contabilidade estejam mais refinadas, elas trazem um desafio maior no que diz respeito a dados. Em especial, as empresas precisam identificar termos contratuais detalhados, geralmente escondidos na documentação, para determinar o compliance com os critérios SPPI, em um universo atual de mais de 1.100 títulos vinculados à sustentabilidade.
Considere o título emitido pela Wienerberger AG em 4 de outubro de 2023 (FIGI BBG01JHDRVZ4). Esse título oferece um cupom de 4,875% e vencimento em 4 de outubro de 2028. Ele inclui dois indicadores-chave de desempenho (KPIs): o KPI 1 monitora o escopo 1 e 2 de emissões de GEE, e o KPI 2 mede a receita gerada por produtos de construção alinhados a edifícios net-zero. O não cumprimento da Meta de Desempenho de Sustentabilidade (SPT) para o KPI 1 resultará em um aumento de 25 pontos-base (bps) por ano no cupom, com efeito a partir de 4 de outubro de 2027. Da mesma forma, o não cumprimento do SPT 2 acionará um aumento de 50 pontos-base por ano, a partir da mesma data.
O aumento máximo possível do cupom, de 75 pontos-base, é expressivo, sobretudo para um título com cupom de dígito único. Esse acréscimo representa um impacto relativo substancial de aproximadamente 15,4% (0,75%/4,875%), indicando uma mudança material no rendimento efetivo do título, o que provavelmente levaria a uma falha no teste SPPI. Em contraste, o título do Capital Airport Group, emitido em 27 de agosto de 2021 (FIGI BBG012C4X0K3), trouxe uma margem de 10 pontos-base sobre um cupom de 3,45% na emissão. Esse valor provavelmente atenderia aos critérios do SPPI.
Além da avaliação inicial, outro desafio está em rastrear corretamente a data de observação e a data efetiva de qualquer aumento no cupom. Após essas datas, os ativos passam a atender ao teste SPPI, já que não há mais aumentos a considerar.
Como podemos ajudar?
Como preparação para a implementação prevista para 2026, a equipe de Dados Regulatórios da Bloomberg está revisando o sistema de regras utilizado na aplicação do teste SPPI de todos os instrumentos que apresentam aumentos de cupom não relacionados a crédito. Também serão adicionados novos campos que permitam quantificar a magnitude e a materialidade dos esses aumentos de cupom, como por exemplo:
- aumento cumulativo de pontos-base, caso os eventos não relacionados a crédito sejam acionados; e
- aumento cumulativo do cupom como uma porcentagem do cupom original.
Ambas as métricas poderão ser analisadas em conjunto com os resultados do teste SPPI (IFRS9_SPPI_TEST) e o atributo (IFRS9_SPPI_ATTRIBUTE).
Vale destacar que as empresas podem automatizar e escalar a determinação do SPPI, não apenas no momento da emissão, mas também ao longo de toda a sua duração.
As Soluções de Dados Regulatórios da Bloomberg estão disponíveis imediatamente via Data License para uso corporativo em escala pelo website data.Bloomberg.com, com entrega via SFTP, API REST ou em ambiente de nuvem.
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