Por Cristiane Lucchesi, Vanessa Dezem e Gerson Freitas Jr.
Virar a página do escândalo de corrupção no Brasil é a prioridade número um da Odebrecht, mas a maneira como a empresa vai realizar essa façanha ainda gera bastante discussão.
O grupo, cujo alcance se estende do petróleo à construção e dos EUA à África, está buscando reconstruir sua reputação enquanto negocia acordos de delação premiada em diversos países e tem de lidar com uma dívida de R$ 94,5 bilhões e uma multa de US$ 3,5 bilhões por corrupção a ser paga em 23 anos. Um plano estratégico delineado em reunião a portas fechadas em dezembro e a ideia de venda de ações da construtora não tem sido suficiente para tranquilizar os investidores. Os US$ 750 milhões em títulos perpétuos da companhia, que são garantidos pela construtora, são negociados abaixo de 46 centavos de dólar, acumulando queda de quase 28 por cento nos últimos dois meses.
É cada vez maior o receio de que a empresa possa queimar caixa mais rapidamente nos próximos meses à medida que a ampliação das investigações de corrupção em outros países latino-americanos ameaça travar parte dos recursos de uma venda de ativos que somaria até R$ 12 bilhões (US$ 3,8 bilhões).
A Odebrecht, que durante meses negou qualquer irregularidade e posteriormente, em dezembro, se declarou culpada de corrupção, está praticamente sem crédito novo há mais de dois anos, o que a forçou a tomar empréstimos de suas unidades mais rentáveis ou a vender ativos a elas, em um momento em que outras três subsidiárias têm problemas para quitar dívidas. Enquanto isso, o braço da empresa no setor da construção viu sua lista de projetos diminuir à medida que os países latino-americanos foram atingidos pela recessão.
“Se eles não começarem a fechar novos projetos rapidamente, as preocupações com a liquidez serão crescentes,” disse Sean Glickenhaus, um analista de renda fixa no UBS AG em Nova York. “Você começa a ler sobre mais países querendo banir ou bloquear a Odebrecht de participar em qualquer projeto do setor de infraestrutura, e isso seria realmente um problema.”
“Estamos superando a parte mais mais difícil dessa jornada, que sabíamos que seria longa”, disse a assessoria de imprensa da Odebrecht. A holding está trabalhando com a suposição de que nenhuma de suas unidades terá que pedir recuperação judicial, acrescentou.
A Odebrecht assinou acordo de delação premiada no Brasil e se declarou culpada em Nova York, em dezembro, por pagar propinas com o objetivo de conseguir contratos lucrativos, violando a Lei de Práticas Corruptas Estrangeiras dos EUA. Mas a divulgação do documento do acordo nos EUA gerou investigações em outros países, como Peru, Colômbia, Equador e Panamá, que desde então proibiu a empresa de participar em novos projetos.
O presidente do Peru, Pedro Pablo Kuczynski, defendeu que os recursos provenientes da venda do gasoduto Sur Peruano e da usina hidrelétrica Chaglla, dois dos ativos mais valiosos do plano de desinvestimento da Odebrecht, sejam colocados em uma conta separada para cobrir danos se a empresa for declarada culpada. A Odebrecht informou que está negociando acordos de leniência e que espera continuar em todos os países onde opera.
“O que é importante ressaltar”, afirmou a assessoria de imprensa, “é que todas as partes envolvidas neste processo — bancos, investidores e governos — têm negociado de forma produtiva na busca de uma solução que atenda ao interesse comum.”
Mesmo antes de as novas investigações colocarem em risco a liquidez futura da empresa, a Odebrecht tomou empréstimos de US$ 400 milhões da Odebrecht Engenharia & Construção desde o último trimestre de 2015, dos quais só US$ 50 milhões foram pagos. É provável que mais dinheiro tenha sido emprestado no quarto trimestre de 2016, segundo a Fitch Ratings Ltd.
Os empréstimos contribuíram para que a posição de caixa da construtora fosse reduzida em cerca de US$ 615 milhões nos nove meses terminados em setembro, segundo a Fitch. O caixa da construtora terminou o último trimestre de 2016 em US$ 1,5 bilhão, diz o UBS. A Moody’s Investor Service disse que a posição de caixa do grupo era de cerca de R$ 17,5 bilhões em junho de 2016, em comparação com uma dívida de R$ 94,5 bilhões.
A Braskem SA, a empresa petroquímica que a Odebrecht controla com 50,1 por cento de participação, pagou um dividendo extra de R$ 1 bilhão em outubro. Em 27 de janeiro, anunciou a compra de uma fatia controladora de R$ 610 milhões da Cetrel, empresa de processamento de lixo industrial, da Odebrecht Utilities.
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