Por Vanessa Dezem, Peter Millard e Arie Shapira.
Foram necessários menos de 10 dias para decidir privatizar a maior empresa de energia da América Latina.
Felizmente para o governo brasileiro, que tem dificuldades para fechar suas contas, já havia alguém entusiasmado com a ideia. Quando o Ministério de Minas e Energia chegou até presidente da Eletrobras, Wilson Ferreira Jr. com a proposta, ele decidiu abraçar o projeto.
“A decisão de privatizar a empresa deve transformar a Eletrobras em uma corporação como a Embraer ou a Vale”, disse Ferreira por mensagem na terça-feira, um dia após o anúncio. “Isso permitirá que a Eletrobras seja muito mais competitiva em comparação com seus concorrentes globais.”
A privatização não era a primeira opção, de acordo com uma pessoa próxima às discussões. A ideia inicial do governo era espremer valor da Eletrobras com a venda de algumas de suas concessões de usinas de energia, gerando assim caixa para o governo enfrentar sua crise fiscal, disse a pessoa, que pediu anonimato porque a informação não é pública. O plano, contudo, não era bom para a empresa, por isso o Ministério de Minas e Energia propôs a privatização. Foi o sinal verde.
Era certo que Ferreira ficaria encantado com a ideia — ele recebe o crédito do mercado por ter transformado a CPFL Energia na maior empresa privada do setor do Brasil. É conhecido por sua capacidade de vender bem ativos e por sua habilidade de aumentar os lucros. Ele foi a “solução de mercado” do governo para substituir um nomeado político em junho de 2016.
Ferreira, 58, estará à frente da jogada mais recente e ousada de uma empresa que está passando por uma reestruturação massiva, em meio a uma economia vacilante. Apesar dos possíveis obstáculos pela frente, os investidores estão muito felizes com a proposta: as ações da empresa subiram 49 por cento em Nova York e São Paulo, maior alta em pelo menos duas décadas. Os futuros no Ibovespa ampliaram os ganhos devido ao entusiasmo contínuo com o plano.
Já trabalhando
O executivo já vinha avançando na reestruturação da Eletrobras, ignorando a instabilidade econômica e política que sacudiu a confiança dos investidores, reduziu os valores dos ativos e gerou crescentes dívidas. Além de privatizar a empresa — o que poderá gerar até R$ 20 bilhões (US$ 6,3 bilhões) para os cofres do governo –, ele irá vender subsidiárias de distribuição e ativos eólicos e de transmissão de energia, além de reduzir drasticamente a folha de pagamento da companhia.
“Todas as semanas acontece algo novo e surpreendente no Brasil, então se pararmos para analisar cada evento ficaremos paralisados”, disse Ferreira em entrevista na sede da empresa, no Rio de Janeiro, na semana passada, antes do anúncio da privatização. “A decisão que tomamos foi esquecer tudo isso com o objetivo de acender uma luz no fim do túnel.”
Sua meta é reduzir a bilionária dívida da empresa e retomar os investimentos em grandes projetos de energia, inclusive em países vizinhos. O ideal é que boa parte do trabalho para isso seja concluída até o fim do ano, disse o CEO.
Redução de dívidas
A Eletrobras tem o título de maior tomadora de dívidas do ranking da Fitch Ratings para a América Latina, segundo relatório de 16 de agosto. Em junho, a dívida líquida da empresa chegou a R$ 23,4 bilhões (US$ 7,3 bilhões). O objetivo de Ferreira é reduzir a relação entre dívida e Ebitda para quatro vezes nos próximos cinco meses, contra uma relação de 7,8 vezes de quando ele assumiu o cargo.
O CEO já vendeu a primeira de sete de suas subsidiárias de distribuição de energia no início deste ano por cerca de R$ 2,2 bilhões. O resto deverá ser negociado até o fim de 2017, juntamente com participações em 74 empresas de propósito específico que administram parques eólicos e linhas de transmissão. A Eletrobras deverá embolsar cerca de R$ 5 bilhões com essas vendas, disse ele.
“Não faz sentido investir em parques eólicos pequenos”, disse ele.“Somos mais úteis quando lidamos com grandes projetos de energia, como usinas nucleares, hidrelétricas e grandes linhas de transmissão.”
A venda de subsidiárias também reduzirá o número de funcionários da empresa, juntamente com um plano de demissão voluntária, em 47 por cento em relação aos 23.000 atuais. A economia estimada é de R$ 1,8 bilhão por ano.
Ainda assim, o plano de reestruturação da empresa como um todo — que está avançando mesmo com a privatização — enfrenta resistência, disse Ferreira. Os analistas dizem que as reações políticas são também um dos possíveis obstáculos à privatização.
A empresa “opera historicamente sob influência de várias figuras políticas que podem não se entusiasmar muito” com a privatização, escreveram analistas do Itaú BBA liderados por Pedro Manfredini em nota que também citou a possível oposição dos sindicatos.
“As coisas que estamos fazendo dependem do governo: temos políticos e pessoas nas empresas de distribuição que não querem a privatização”, disse ele. “Estamos lutando.”
Entre em contato conosco e assine nosso serviço Bloomberg Professional.