Os preços das commodities ainda não tocaram fundo

Por A Gary Shilling.

Fica difícil não perceber que os preços das commodities vêm afundando. Parece que o preço de tudo o que se cultiva ou se extrai do solo – do petróleo e o gás até o açúcar e o cobre – declinou 46 por cento desde o começo de 2011, provocando falências e a consolidação do setor.

Prepare-se para outros grandes declínios.

De maneira direta ou indireta, os países desenvolvidos consomem a maioria das commodities. Contudo, o crescimento econômico e a demanda por produtos baseados em commodities se mantêm fracos porque a América do Norte e a Europa continuam desfazendo seus excessos financeiros. A anterior expansão veloz da dívida, que ajudou a alimentar o crescimento robusto, está sendo revertida.

O PIB real dos EUA sobe a uma taxa anual de apenas 2,2 por cento desde que a recuperação comercial começou em meados de 2009 – cerca de metade da taxa que se esperaria após uma recessão –. A zona do euro manca a uma taxa anual de crescimento de 1,2 por cento, sendo que a recuperação da recessão de 2007-2009 foi interrompida por uma leve desaceleração em 2011-2013. A média de ganhos econômicos na economia do Japão, que anda e para, tem sido de apenas 1 por cento.

Agora, o mundo vai pelo oitavo ano de um ciclo de desalavancagem. A esse ritmo, provavelmente demore mais do que a média histórica de dez anos para completá-lo.

Enquanto isso, a oferta de quase todas as commodities é enorme e está crescendo. A China se uniu à Organização Mundial do Comércio no final de 2001 e, não por coincidência, os preços das commodities levantaram voo no começo de 2002. À medida que a fabricação industrial passou da América do Norte e da Europa para a China, o país absorveu a produção mundial de commodities. De 2000 a 2014, a proporção de consumo mundial de cobre da China deu um salto de 12 por cento para 43 por cento. A porção das aquisições de minério de ferro feitas pela China disparou de forma similar de 16 por cento para 43 por cento, e o alumínio passou de 13 por cento para 47 por cento.

Por volta de meados da década de 2000, os produtores de commodities industriais estavam deslumbrados pela demanda aparentemente insaciável da China e cometeram o mesmo grande erro que sempre ocorre em todos os ciclos econômicos: eles presumiram que a demanda em disparada da China duraria indefinidamente.

Os produtores empreenderam projetos enormes cuja conclusão costuma demorar uma década. Entre eles estiveram a escavação de minas de cobre na América Latina, a remoção de minério de ferro no Brasil e a produção de carvão na Austrália. Toda essa capacidade nova começou a entrar em funcionamento em 2011, quando ficou claro que o retorno ao crescimento econômico mundial veloz esperado para depois da recessão não estava ocorrendo.

A pressão descendente sobre os preços das commodities tem sido amplificada nos últimos meses pela percepção de que o crescimento econômico na China está desacelerando. Na verdade, isto não é novidade. A China não cresce independentemente, mas possui uma economia impulsionada pelas exportações. Ela importa matérias-primas e equipamentos que utiliza para produzir bens manufaturados, em grande parte para exportações.

Mas a demanda contida na América do Norte e na Europa pelas exportações chinesas tem desacelerado o crescimento econômico na China. Enquanto isso, o excesso de investimentos em cidades-fantasma e a construção de infraestrutura excessiva, nos quais a China se engajou a fim de criar empregos, geraram dívidas enormes. Eu estimo que a taxa verdadeira de crescimento ajustado pela inflação na China seja de cerca de 3 por cento a 4 por cento, metade do número oficial de 7 por cento.

Poucos investidores e a maior parte da mídia ignoraram a dependência da China do Ocidente e a desaceleração do seu crescimento até que as bolsas caíram pelo penhasco em junho. Agora, o índice de Xangai apresenta uma baixa de 40 por cento apesar dos esforços desajeitados e insensíveis de Pequim para apoiar as ações. A desvalorização do yuan seguiu pouco depois.

Como a maioria das outras moedas também está se desvalorizando frente ao dólar, a cotação comercial ponderada do yuan caiu 30 por cento desde maio de 2011, e a China quer a moeda baixe ainda mais para incentivar as exportações em uma economia que está enfraquecendo. A fim de evitar que o yuan atrelado colapse – e acomodar o fluxo de dinheiro que está saindo rapidamente da China – o governo vendeu cerca de US$ 400 bilhões dos seus quase US$ 4 trilhões em reservas de moeda estrangeira para comprar yuan.

Forças adicionais estão deprimindo os preços das commodities além do excedente geral de oferta em relação à demanda. Várias companhias mineradoras de rochas duras estão tão imersas em projetos novos que são obrigadas a terminá-los. Fechar os empreendimentos custaria mais caro do que as perdas em que elas registrariam com a venda da produção pelos preços atuais.

As maiores produtoras de minério de ferro do mundo – a Rio Tinto, a BHP Billiton e a Vale – continuam produzindo quantidades enormes de minério apesar de que os preços caíram 70 por cento, de US$ 189 por tonelada em fevereiro de 2011 para US$ 57. As empresas acreditam que podem expulsar produtores menos eficientes, como aqueles na Índia, que talvez não tenham poder de permanência.

Algumas commodities, especialmente o alumínio, são produzidas em países desenvolvidos como os EUA e o Canadá. Segundo o manual tático, quando a demanda cai e os lucros entram em queda livre, os donos fecham as fundições. A queda da oferta compensa parte da pressão descendente sobre os preços.

Mas a maior parte do cobre, utilizado em numerosos produtos manufaturados, de carros e instalações de encanamento até computadores, é extraída em países em desenvolvimento como o Peru, Zâmbia e o Chile. Eles precisam da receita das exportações de cobre para pagar suas dívidas em moeda forte. Portanto, quanto mais baixo o preço do cobre for, maior a quantidade física de cobre que eles devem produzir e exportar para ganhar o mesmo montante de dólares. E quanto mais cobre eles exportam, mais baixo o preço fica, em uma espiral descendente autoalimentada.

De forma similar, o Brasil subsidiou a exportação de açúcar, cujo preço caiu 67 por cento desde fevereiro de 2011, e sem dúvida será forçado a colocar mais dinheiro no setor. Oitenta das 300 usinas de açúcar na região Centro-Sul, onde 90 por cento do açúcar brasileiro é produzido, já estão fechadas. Os estoques são os maiores em 35 anos. As usinas insolventes estão tentando vender tanto açúcar quanto for possível para gerar caixa, o qual tem deprimido os preços mundiais do açúcar.

Enquanto isso, as importações de açúcar na China caíram 25 por cento em agosto em relação há um ano. A pressão é aumentada pelo fato de que o real brasileiro caiu 33 por cento no que vai deste ano. A Standard Poor’s cortou o rating da dívida do país para junk em setembro. Consequentemente, as dívidas denominadas em dólares dos produtores brasileiros de açúcar estão se tornando quase impossíveis de pagar.

Como no caso do minério de ferro, os sauditas estão tentando aproveitar os preços baixos para expulsar outros grandes produtores de petróleo bruto. Eu expliquei anteriormente por que isto poderia resultar em preços do petróleo de US$ 10 a US$ 20 por barril.

Enquanto os preços do mercado superarem o custo marginal, mais (e não menos) produção será encorajada para compensar a receita perdida. Alguns produtores elevarão a produção mesmo que os preços caiam abaixo dos custos marginais.

A Rússia depende das exportações de energia para cobrir os custos das importações e dos gastos do governo. Por causa do colapso nos preços do petróleo e das sanções do Ocidente, a Rússia está desesperada por ganhar moeda estrangeira.

Esta coluna não necessariamente reflete a opinião do conselho editorial da Bloomberg LP ou de seus donos.

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