Outlook regulatório do Golfo para 2024

Este artigo foi escrito por James Duncan e Christian Benson, especialistas em assuntos regulatórios e governamentais da Bloomberg.

Após um ano de profunda instabilidade geopolítica, contínua interrupção tecnológica e um stress econômico mundial, a região do Golfo está estrategicamente utilizando reformas regulatórias para fortalecer sua presença nos mercados financeiros internacionais e se estabelecer como um destino para investimento, inovação e ideias.

2024 deverá ser um ano crucial para as jurisdições do Golfo, à medida que elas buscam essa agenda de reformas, buscando estabelecer padrões globais e desenvolver a sofisticação e profundidade de seus mercados financeiros.

Evolução regulatória como um impulsionador da diversificação

Sinônimo de vastas reservas de petróleo e gás, o Golfo está embarcando em um projeto de transformação e diversificação para proporcionar estabilidade econômica de longo prazo e incentivar o investimento. Isto acompanha rápidas mudanças demográficas, com as demandas de uma classe média jovem, educada e em crescimento, ajudando a impulsionar tal transformação.

Portanto, os formuladores de políticas em toda a região estão cada vez mais focados em desenvolver uma estrutura regulatória sólida para os mercados de capitais, a fim de atrair a confiança de investidores locais e estrangeiros. Embora diferentes países tenham suas próprias abordagens e prioridades, este artigo faz um balanço das principais iniciativas regulatórias financeiras em andamento em 2024 nos seguintes temas:

  • Trading e mercados;
  • Finanças verdes;
  • Finanças digitais; e
  • Risco, capital e estabilidade financeira.

Trading e mercados

Os formuladores de políticas do Golfo estão considerando mudanças na estrutura do mercado para incentivar as negociações e os investimentos na região. A proteção ao investidor se mostra um tema crescente na região, com a proteção dos direitos dos investidores e a defesa de práticas comerciais justas vistas como condições necessárias para atrair e reter capital.

O Catar embarca em um ambicioso programa de reforma da estrutura de mercado, enquanto a Autoridade do Mercado Financeiro busca avançar o mercado de capitais do Catar para o status de “desenvolvido”. No âmbito do Plano Estratégico do Catar para 2023-2027, o país deve desenvolver códigos de governança para empresas financeiras, uma estrutura para os mercados de renda fixa e iniciativas para empresas cotadas nos mercados primário e secundário. A negociação de derivativos é outra área de foco para os formuladores de políticas do Catar, com um anúncio em março passado de que a Autoridade Reguladora do Centro Financeiro do Catar desenvolveu uma nova estrutura regulatória para derivativos cotados nas bolsas. Especificamente, o lançamento das Regras de Mercados e Bolsas de Derivativos de 2023 permite o estabelecimento de uma bolsa de derivativos, bem como de uma contraparte central de compensação para garantir o ajuste eficiente das negociações. A Qatar Stock Exchange está prestes a lançar uma bolsa de derivativos para oferecer aos investidores a oportunidade de negociar opções e contratos futuros de ações locais e o índice de ações do Catar (QSE).

A Arábia Saudita avançou significativamente no desenvolvimento de sua estrutura para os mercados de capitais, e este ritmo de reforma deve continuar ao longo de 2024, em linha com programa Vision 2030. A Autoridade do Mercado de Capitais (CMA) recentemente aprovou regras para aumentar o investimento estrangeiro nos mercados de ativos, reduzindo as diferenças de divulgação entre investidores estrangeiros qualificados e outras categorias de investidores. Juntamente com o foco nos mercados de capitais de ações, a CMA está intensificando sua atenção nos mercados de capitais de dívida, buscando nomear uma empresa como fornecedora de um sistema alternativo de negociação para Sukuk e instrumentos de dívida por meio de um processo de licitação. Ao longo de 2024, é provável que haja novos avanços no desenvolvimento regulatório dos mercados de capitais de dívida da Arábia Saudita.

Finanças verdes

Embora a sustentabilidade tenha sido um aspecto importante e de longa data das diversas estratégias de visão do Golfo, as finanças de transição ganharam destaque na região após a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP28). Um importante impulsionador por trás do esforço de diversificação econômica da região é garantir que os investidores globais conscientes de questões ambientais, sociais e de governança (ESG) não deixem de considerar a região em suas estratégias de alocação de investimentos.

Com a conclusão da COP28 no fim de 2023, a arquitetura regulatória de finanças sustentáveis em toda a região do Golfo já toma forma, e 2024 verá um esforço regional mais amplo para harmonizar as regulamentações.

Como anfitrião da COP28, os Emirados Árabes Unidos (EAU) emitiram uma série de anúncios para acelerar a transição para uma economia sustentável. Por exemplo, a Federação dos Bancos dos Emirados Árabes Unidos pretende mobilizar mais de um quarto de bilhão de dólares em finanças sustentáveis até 2030, conforme a estrutura regulatória de finanças sustentáveis anunciada no verão de 2023. Além disso, o Grupo de Trabalho de Finanças Sustentáveis dos Emirados Árabes Unidos emitiu sua terceira declaração pública durante a COP28, concentrando-se em três objetivos principais para melhorar a governança corporativa com foco na sustentabilidade, os relatórios de sustentabilidade, e o desenvolvimento de uma taxonomia de finanças sustentáveis.

Olhando mais adiante, o Central Bank of Bahrain (CBB) emitiu no final de 2023 exigências de divulgações ESG que se aplicarão a uma ampla gama de empresas cotadas em bolsa e instituições financeiras a partir do fim de 2024.

Enquanto o Reino da Arábia Saudita está nos estágios iniciais do desenvolvimento de uma estrutura específica para ESG, as autoridades assinaram um acordo no ano passado delineando o compromisso do Reino com o desenvolvimento de uma taxonomia ESG e a criação de uma estrutura de divulgação para empresas cotadas em bolsa. Sob a liderança do GCC Exchanges Committee, a Arábia Saudita está posicionada para promover a conscientização sobre ESG em toda a região.

Conforme o setor de finanças islâmicas continua a crescer e se desenvolver, as autoridades estão integrando considerações de sustentabilidade ao trabalho já em andamento para harmonizar a estrutura financeira islâmica. Os Emirados Árabes Unidos emitiram princípios orientadores e um roteiro para promover as finanças islâmicas sustentáveis, incluindo normas prudenciais, diretrizes de divulgação e um cronograma específico para implementação.

Finanças digitais

Com a tecnologia remodelando o comportamento dos investidores e as mudanças econômicas mais amplas, a região do Golfo busca adotar uma abordagem aberta para promover a inovação e o investimento. Consequentemente, uma série de iniciativas relacionadas às finanças digitais estão em andamento para 2024.

Os Emirados Árabes Unidos estão emergindo como uma potência em IA com uma série de iniciativas sob a 2031 National AI Strategy (Estratégia Nacional de IA para 2031). Isto inclui seu próprio ministério governamental para IA e seu próprio modelo de linguagem de grande escala de código aberto, conhecido como Falcon. Mais recentemente, o Departamento de Desenvolvimento Econômico de Abu Dhabi (ADDED) e a Mohamed bin Zayed University of Artificial Intelligence (MBZUAI) concordaram em desenvolver juntas soluções otimizadas por IA para pequenas e médias empresas (PMEs).

A Arábia Saudita também está determinada a se tornar um centro de investimento em IA. Para fornecer às empresas mais flexibilidade, o Reino aprovou uma série de alterações em suas regras de privacidade de dados para alinhá-las mais de perto com outras normas internacionais. As empresas dentro do escopo da diretiva têm até 14 de setembro de 2024 para entrar em conformidade. O Catar também está explorando uma estrutura regulatória para IA, com mais detalhes a serem divulgados ainda este ano.

A Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos assinaram a “Declaração de Bletchley” na primeira Cúpula de Segurança de IA, em novembro do ano passado, e a voz do Golfo no debate internacional sobre a regulamentação da IA deve crescer.

Em resposta ao desenvolvimento de ativos digitais, as autoridades passaram a adotar abordagens diferentes. Os Emirados Árabes Unidos estão se posicionando como um polo global de atividades de ativos digitais e criaram uma estrutura regulatória avançada com este fim. Especificamente, Emirados individuais, como Dubai, lideraram esta agenda ao estabelecerem o primeiro regulador independente para ativos digitais do mundo e ao adotarem uma estrutura regulatória abrangente para fornecedores de serviços de ativos virtuais. Paralelamente, a Autoridade de Valores Mobiliários e Commodities dos Emirados Árabes Unidos começou a receber pedidos de licença de empresas interessadas em fornecer serviços de ativos digitais.

Em contraste, países como o Catar e o Kuwait adotaram uma abordagem diferente. Por exemplo, o regulador do Kuwait proibiu todos os tipos de transações com moeda virtual, incluindo pagamentos, investimentos e mineração.

O fortalecimento da resiliência operacional e a prevenção de riscos cibernéticos são prioridades-chave para os formuladores de políticas do Golfo em 2024. O plano estratégico do Catar compromete-se a desenvolver diretrizes para a implementação de uma estrutura nacional de segurança cibernética, e a autoridade nacional de segurança cibernética da Arábia Saudita continua seu trabalho para fortalecer a preparação para o crime cibernético no Reino.

Risco, capital e estabilidade financeira

Em consonância com a agenda regulatória global, os reguladores do Golfo adotam proativamente padrões globais para aprimorar a estabilidade dos setores bancário e de seguros.

A implementação das normas de capital bancário de Basileia está prevista para ser um tema-chave mundial de 2024.

  • A Autoridade Monetária da Arábia Saudita (SAMA) lançou a implementação oficial das reformas bancárias de Basileia III a partir de 1o. de janeiro de 2023, e o trabalho está em andamento para garantir que os modelos de risco sejam efetivamente calibrados. Para refletir o impacto dessas reformas, a SAMA também atualizou a estrutura prudencial para os riscos de capital dos bancos sauditas.
  • Embora o setor bancário do Catar tenha permanecido, em geral, resiliente diante da volatilidade do preço do petróleo, graças às reservas de capital, o Catar está se preparando para a implementação total dos requisitos de capital revisados de Basileia III a partir de 1o. de janeiro de 2024.
  • A Autoridade de Serviços Financeiros de Dubai (DFSA) buscou comentários públicos antes da finalização das regras para implementar as normas de risco de crédito bancário e de contraparte sob o Basileia III.

Desenvolver uma estrutura regulatória baseada em risco para o setor de seguros é uma prioridade estratégica para muitos países do Golfo, alinhada com uma variedade de jurisdições globais. Os Emirados Árabes Unidos foram o primeiro país da região a implementar totalmente um modelo baseado nos princípios-chave de Solvência II da UE, e o Catar deve seguir e implementar disposições semelhantes, conforme estabelecido em seu último Plano Estratégico.

Como parte da Visão do Reino para 2030, a Autoridade de Seguros da Arábia Saudita iniciou suas operações em novembro do ano passado como um novo regulador unificado e independente para o setor de seguros. Isto fornecerá as bases de uma estrutura regulatória de seguros baseada em riscos internacionalmente reconhecida, à medida que a Arábia Saudita busca desenvolver seu setor de seguros para apoiar a transformação mais ampla do país.

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