Perspectiva de inflação atrapalha última etapa do QE na Europa

Por Alessandro Speciale com a colaboração de Jana Randow, Piotr Skolimowski, Carolynn Look, Zoe Schneeweiss, Catherine Bosley e Mark Deen.

Para o presidente do Banco Central Europeu, a última etapa do percurso talvez seja a mais longa.

Após quatro anos de medidas não convencionais e uma recuperação econômica cada vez mais firme, o objetivo de Mario Draghi de trazer a inflação de volta talvez esteja além do alcance. Porém, há sinais discretos de pressão sobre os preços e uma eventual discussão em setembro sobre a retirada de estímulos talvez não resulte em qualquer decisão até outubro, disseram pessoas a par das conversas.

Durante o recesso de sete semanas, o alto escalão do BCE terá tempo suficiente para pensar se a retomada econômica da região é capaz de aguentar a retirada do apoio do banco central e alimentar sozinha o avanço dos preços. Quando indagado sobre o assunto na quinta-feira, Draghi deu uma resposta clara: “Ainda não chegamos lá.”

“Ainda não há evidência clara de aceleração da inflação”, disse o economista Christian Schulz, que trabalha no Citigroup em Londres. “Considerando a lentidão disso, é um problema que estará com o BCE por muito tempo. A paciência precisa ser parte importante do recado deles.”

O adiamento de uma decisão sobre o futuro da flexibilização quantitativa (QE) faria com que acontecesse depois das eleições na Alemanha, no final de setembro. Draghi terá a oportunidade de definir o tom da discussão quando discursar na tradicional reunião de Jackson Hole, no Estado americano de Wyoming, no mês que vem.

Atualmente, o compromisso do BCE é desembolsar 60 bilhões de euros (US$ 70 bilhões) por mês comprando dívidas pelo menos até dezembro. Repetidas vezes, as autoridades avisaram que qualquer redução seria gradual, mas mesmo assim têm opiniões diferentes sobre o cronograma e ritmo exato de qualquer retirada dos estímulos.

Em entrevista coletiva à imprensa, Draghi foi deliberadamente vago sobre o momento da decisão. Ele disse que o Conselho Geral da instituição discutiria mudanças no “outono”, mas se negou a dar detalhes, mesmo quando lhe perguntaram se 7 de setembro entraria na estação. O outono no Hemisfério Norte começa oficialmente em 22 de setembro.

Recuperação ‘robusta’

O ponto de virada da política monetária foi vislumbrado no mês passado, quando o Conselho Geral atualizou sua avaliação para os riscos à perspectiva econômica. Deixando para trás o viés para baixo, o novo entendimento é que esses riscos estão “amplamente equilibrados”. O grupo também eliminou a menção à possibilidade de novo corte na taxa básica de juros. Draghi reiterou essa avaliação na quinta-feira, mas enfatizou a necessidade de cautela.

A falta de pressão sobre os preços é mais intrigante para a instituição em vista da recuperação “robusta” da economia da região. Esse descasamento foi destacado no relatório do BCE divulgado nesta sexta-feira, que reúne projeções de especialistas e se refere ao terceiro trimestre. O relatório mostrou uma perspectiva mais contida para a inflação e melhora no cenário de expansão da economia até 2019.

Na quinta-feira, Draghi declarou estar confiante que eventualmente o crescimento se traduzirá em salários e preços mais altos, como reza a teoria econômica, embora a crise financeira global e as reformas no mercado de trabalho que vieram em seguida possam ter abalado esse relacionamento.

Não houve nova menção às “forças reflacionárias” citadas no discurso de Draghi em 27 de junho, que desencadeou uma disparada dos títulos de renda fixa. Quando perguntado sobre o assunto, Draghi minimizou a importância do comentário dele, explicando que “você tem reflação quando o nível de preço caiu abaixo da linha tendencial e se recupera”.

“Eles querem ter as mãos livres, provavelmente para levar em conta as condições financeiras na trajetória de retirada dos estímulos”, disse o economista Marco Valli, da UniCredit, em Milão. Quando acontecer, “espero que seja gradual”.

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