Política puxa o dólar. E o dólar segura otimismo do BC

Notícia exclusiva por Josué Leonel.

A Ata do Copom divulgada nesta quinta-feira mostra um Banco Central mais preocupado com a inflação do que parecia na semana passada, quando seu comunicado sinalizou que a alta da Selic para 14,25% poderia ter sido a última. Para analistas do mercado, o dólar, que disparou acima de R$ 3,56 hoje, reagindo à crise política, é o principal motivo desta cautela mostrada pelo BC.

O parágrafo da ata que chamou a atenção do mercado foi o 31, no qual o BC disse que “os riscos remanescentes (…) exigem que a política monetária se mantenha vigilante em caso de desvios significativos das projeções de inflação em relação à meta”.

Alguns bancos, como o francês Société Générale, já estimam o dólar acima de R$ 4,00 no final do ano, como ocorreu em 2002, antes da eleição de Lula. Como o câmbio afeta os preços dos produtos importados e também pode reduzir a oferta de produtos exportáveis no mercado doméstico, a desvalorização do real pode ameaçar o objetivo do BC de levar a inflação de volta à meta de 4,5% em 2016.

O problema da alta do dólar, segundo José Márcio Camargo, economista-chefe da Opus Gestão de Recursos, é que ela tem sido alimentada por fatores imprevisíveis, como a crise política. Ele prevê câmbio a R$ 3,80 no final do ano, mas não descarta alta ainda maior se a crise não for equacionada. “Com esta crise política e a piora fiscal, o dólar ainda tem muito espaço para subir.”

Para Roberto Padovani, economista-chefe da Votorantim Ctvm, o dólar tem subido ’’sem ancoragem’’ e, junto com a deterioração das contas públicas, torna mais difícil o trabalho do BC de convencer a sociedade de que a inflação vai voltar para a meta. “A ata mostra que a batalha do BC para melhorar as expectativas ainda não terminou”.

O cenário mais provável ainda é de o BC manter o juro estável, diz Carlos Kawall, economista-chefe do Banco Safra. Contudo, ele considera que a alta da Selic poderá ser retomada se o dólar atingir níveis maiores, entre R$ 3,80 e R$ 4,00, de forma sustentada, com o novo patamar vindo para ficar.

Vale lembrar que não necessariamente a alta do dólar vira inflação. Camargo, da Opus, observa que o impacto sobre os preços domésticos, no caso de commodities como o petróleo e os produtos agrícolas, depende também dos preços externos, que recentemente têm caído. Se o dólar sobe mas as commodities caem, o valor destes produtos em reais, que é o que conta para a inflação, não muda, e então o efeito sobre a inflação é pequeno ou até mesmo nulo. Contudo, se as commodities pararem de cair e o dólar continuar subindo, o impacto será maior e o BC terá de agir.

Não foi só o dólar que gerou comentários mais cautelosos do BC na ata do Copom. Kawall, do Safra, lembra que, mesmo após o governo reduzir a meta fiscal, o BC não descartou que o efeito fiscal sobre a inflação ainda será positivo, mas isso ocorreria “em menor intensidade”.

O Goldman Sachs destacou em relatório ainda que o BC, embora tenha apontado enfraquecimento do mercado de trabalho, manteve uma avaliação conservadora. Para o BC, “ainda prevalece risco significativo relacionado, particularmente, à possibilidade de concessão de aumentos de salários incompatíveis com o crescimento da produtividade, com repercussões negativas sobre a inflação”.

Para pelo menos uma parte do mercado, a expectativa era de que o BC divulgasse uma ata mais leve, na mesma linha do comunicado da semana passada. Contudo, o BC surpreendeu. “A ata veio mais dura. Mostrou que a trajetória das expectativas de inflação ainda não está onde o BC quer”, diz Camargo.

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