Por Richard Miller.
O banco central dos EUA finalmente está conseguindo apertar as condições financeiras, mais de dois anos após começar a subir os juros. O problema é que o impacto está sendo maior no exterior do que dentro de casa.
O aumento dos rendimentos dos títulos do Tesouro americano e a recuperação do dólar abalaram os mercados emergentes. Investidores estão reavaliando a capacidade de pagamento de países que se endividaram muito por meio da emissão de títulos denominados em dólares. Já a economia americana está com força total: a previsão média é de expansão anualizada ao redor de 3 por cento nos últimos três trimestres deste ano, embalada por uma generosa dose de estímulo fiscal.
“Lembra aquele velho ditado: os EUA espirram e o resto do mundo pega resfriado”, disse Ethan Harris, responsável global por pesquisa econômica do Bank of America Merrill Lynch, em Nova York.
Ninguém espera que o nervosismo nos emergentes impeça que o presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, e seus colegas se decidam pelo segundo acréscimo na taxa básica de juros de 2018, na reunião dos dias 12 e 13 de junho. Os especialistas estarão de olho em quantos aumentos adicionais as autoridades vão sinalizar para o resto do ano – se um ou dois. O economista-chefe do JPMorgan Chase para os EUA, Michael Feroli, acredita em dois.
Desde que o Fed começou a subir os juros, em dezembro de 2015, as autoridades esperavam que as condições financeiras se restringissem. Em vez disso, durante boa parte desse período, as bolsas subiram, os spreads de crédito se estreitaram e o dólar se depreciou.
Há poucos meses, a situação começou a mudar. O avanço da inflação nos EUA e os repetidos acréscimos nos juros pelo Fed começaram a limitar o apetite por risco. As autoridades “estão conseguindo o que querem”, afirmou Feroli. “Alguns fatores começaram a se mover na direção de regular o ritmo de crescimento.”
Nos países emergentes, a restrição das condições financeiras causou turbulência, especialmente naqueles expostos a mudanças bruscas no sentimento do investidor por causa de questões domésticas. A Argentina abriu negociações urgentes com o Fundo Monetário Internacional para obter uma linha de crédito e tentar conter a queda do peso. Já a Turquia enfrenta uma crise de confiança.
Em vista do comportamento dos investidores, o Instituto de Finanças Internacionais na semana passada reduziu em US$ 43 bilhões a projeção para a entrada de capital nos mercados emergentes em 2018 para US$ 1,2 trilhão – em linha com o ano passado.
“As flutuações no sentimento do investidor ficaram mais abruptas e maiores em termos de escala, com incertezas acerca da trajetória do dólar e dos juros nos EUA provocando miniciclos de ascensão e queda nos fluxos em carteira”, afirmou o relatório do instituto sediado em Washington.
Até agora, o estrago não foi tão ruim quanto o observado durante o chamado “taper tantrum”, em 2013, quando uma sugestão do então presidente do Fed, Ben Bernanke, de que o banco central poderia reduzir as compras de títulos causou um colapso nos mercados emergentes.
Dívidas em dólar
O raciocínio predominante antes era que o dólar forte era bom para a maioria dos países porque tornava suas exportações mais competitivas no gigantesco mercado americano. No entanto, o aumento do endividamento em dólar de nações emergentes — 10 por cento somente no ano passado para US$ 3,7 trilhões, segundo o Banco de Compensações Internacionais (BIS) – significa que esses tomadores de recursos enfrentam dificuldades de financiamento com a apreciação do dólar.
“Quando o dólar se valoriza, os créditos bancários internacionais se dão mal”, explicou Valentina Bruno, professora da American University, em Washington, que pesquisa o assunto, também em parceria com economistas do BIS.
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