Por Ben Bartenstein e William Mathis.
Investidores que encararam décadas de crises de dívida em países como Argentina e Grécia estão percebendo um fenômeno estranho: o desaparecimento dos calotes.
Tumultuadas moratórias soberanas na primeira década deste século reacenderem temores em Wall Street da crise da década de 1980. No entanto, as taxas de inadimplência desde 2011 têm estado relativamente baixas para um período de queda nos preços das commodities e nos fluxos de capitais, de acordo com pesquisa elaborada por Carmen Reinhart, economista da Universidade Harvard, Vincent Reinhart, o economista-chefe da Standish Mellon Asset Management, e Christoph Trebesch, do Instituto Kiel para a Economia Mundial.
O motivo, segundo os pesquisadores, é que os juros nos menores níveis históricos incentivaram a demanda pelos títulos de maior rendimento, permitindo que países muito endividados continuassem rolando obrigações para décadas futuras sob termos mais favoráveis. Por sua vez, as economias em desenvolvimento, que geralmente apresentam maior risco de inadimplência, diminuíram seus déficits fiscais e em conta corrente. É perigoso presumir que as atuais condições de liquidez prevalecerão indefinidamente, mas a pesquisa mostra que problemas em um único país podem não causar efeito dominó.
Os episódios de inadimplência soberana “serão menores, mais isolados e sem as mesmas consequências sistêmicas”, disse Stuart Culverhouse, responsável por macroeconomia e renda fixa na Exotix, uma firma de pesquisas especializada em dívidas de alto risco. “Os principais mercados emergentes, que há 10 ou 15 anos eram o Velho Oeste e quase mercados de fronteira, se desenvolveram e se tornaram mais centrais, mais estabelecidos e mais fortes institucional e politicamente.”
Os calotes não sumiram completamente. No ano passado, a S&P Global Ratings colocou cinco países na categoria de default seletivo: Moçambique, Belize, El Salvador, República do Congo e Venezuela.
Nações como Líbano e Equador também são consideradas problemáticas e podem enfrentar problemas adiante. O risco de não pagamento pode aumentar na próxima década com o vencimento de dívidas roladas, além do fato de novos mercados de fronteira se voltarem para os mercados de capitais para contornar déficits orçamentários, explicou Federico Kaune, responsável por dívida de mercados emergentes da UBS Asset Management.
Ele cita as décadas de 1960 e 1970, quando muitos países em desenvolvimento — em especial Argentina, Brasil e México — captaram grandes volumes de dinheiro junto a credores internacionais para tocar projetos de infraestrutura em meio ao rápido crescimento da atividade econômica. A dívida externa da América Latina mais do que quadruplicou entre 1975 e 1983, quando chegou a US$ 315 bilhões, o equivalente a mais de 50 por cento do PIB da região. Quando o crescimento econômico estacionou, os calotes dispararam, levando bancos comerciais a trocar empréstimos de recebimento duvidoso pelos chamados Brady Bonds.Kaune teme que a história se repita.
Porém, os últimos anos foram marcados por poucos calotes, mesmo em conjunturas que no passado causaram desastres. Historicamente, períodos de grandes oscilações nos fluxos internacionais de capital e dos preços das commodities — como o observado na economia mundial desde 2011 — coincidiram com algumas das piores crises de dívida. Todos os seis grandes movimentos de aumento dos calotes desde 1800 ocorreram após o término de uma fase de grande influxo de capitais globais, de acordo com os pesquisadores. Isso não deve acontecer desta vez.
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