Por Charlie Devereux.
A desaceleração da inflação na Argentina vai impulsionar o mercado doméstico de dívida, permitindo a redução de riscos à medida que o país passa a captar mais por meio de títulos denominados em moeda local, afirmou a Fitch Ratings.
A Argentina é o país mais dependente de financiamento externo entre seus pares na América Latina, sendo especialmente vulnerável ao aumento dos pagamentos quando o peso sofre depreciação acentuada, explicou James McCormack, responsável global por classificação de risco soberano da agência.
“Geralmente o que vemos em mercados emergentes é que, quando a inflação cai e se espera que permaneça sustentavelmente mais baixa, os mercados de títulos em moeda local tendem a ficar bem melhores”, disse McCormack durante entrevista em Buenos Aires. “Governos de mercados emergentes em todo o mundo cada vez mais dependem de financiamento em moeda local, retirando o risco cambial do balanço.”
O desafio para as autoridades agora é convencer investidores a colocar dinheiro em uma moeda que, segundo projeções, vai se desvalorizar mais de 8 por cento até o fim do ano que vem, ao passo que a inflação (agora em 23 por cento ao longo de 12 meses) corrói o retorno.
É improvável que a meta de inflação seja atingida neste ano. O presidente do banco central, Federico Sturzenegger, afirmou na última quarta-feira que manterá a política monetária agressiva e está preparado para apertar mais se necessário, pois pretende cumprir a meta de inflação de 10 por cento até o fim de 2018.
Aproximadamente 18 por cento da dívida total da Argentina, de US$ 231,4 bilhões, é denominada em pesos, de acordo com dados compilados pela Bloomberg. No Brasil, cerca de 97 por cento da dívida é denominada em reais.
Isso significa que a Argentina sofre do que os economistas Ricardo Hausmann e Barry Eichengreen chamaram de “pecado original”, em estudo apresentado durante uma conferência do Federal Reserve em 1999. Ou seja, ao tomar empréstimo em dólares, o governo se expõe ao risco de depreciação da moeda local em caso de problemas da economia doméstica e a crise se exacerba.
Em setembro de 2016, a Argentina vendeu títulos com taxa fixa denominados em pesos pela primeira vez em nove anos, refletindo a confiança na estratégia do governo de combate à inflação. O ministro da Fazenda, Luís Caputo, afirmou à Global Capital em novembro que a Argentina dependia demais do financiamento externo e que a prioridade dele seria desenvolver o mercado doméstico.
A Fitch elevou a classificação para a dívida de longo prazo em moeda estrangeira da Argentina para B em maio de 2016, após a resolução de uma batalha de uma década com investidores em torno de títulos colocados em moratória. A nota atual é cinco níveis abaixo do grau de investimento.
A Argentina precisa conter o déficit primário do orçamento e reduzir a razão dívida-PIB para a nota subir novamente, disse McCormack. Embora o governo do presidente Mauricio Macri tenha atingido suas metas fiscais até agora, as mesmas não foram ambiciosas quando comparadas ao objetivo do ano que vem, de estreitar o rombo em 1 ponto percentual para 3,2 por cento do PIB, ele explicou.
O governo vem diminuindo subsídios nas contas de eletricidade, mas talvez precise também baixar os salários dos funcionários públicos para atingir as metas, acrescentou.
“O que gostaríamos de ver para a classificação de risco melhorar é um perfil de dívida que melhore com o tempo”, afirmou McCormack. “Nas próximas revisões da Argentina, vamos entender mais a fundo o que o governo está adotando para resultar em saldo primário melhor.”
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