Por Andrew Rosati.
Após mais de 70 dias de protestos contra o presidente Nicolás Maduro, os duros confrontos políticos na Venezuela ficaram reduzidos a um grupo seleto.
As manifestações contrárias ao governo antes atraíam públicos de mais de um milhão de pessoas, mas o uso de gás lacrimogêneo e jatos d’água durante semanas pela polícia dissuadiu os manifestantes casuais. Os que restaram são mais estridentes, mais disruptivos e estão mais dispostos a enfrentar as forças de segurança que, em contrapartida, intensificam sua reação. O resultado é que a pressão crescente criou uma sensação de tumulto nas ruas da Venezuela em um momento em que os líderes da oposição prometem a continuidade dos protestos.
“Este é um país acostumado a respostas imediatas, mas as pessoas já não perguntam ‘até quando?’ e sim ‘o que vem a seguir?’”, disse Miguel Pizarro, um deputado de 29 anos que faz parte da coalizão de oposição.
Os partidos de oposição, que formam uma aliança frágil, tentam derrubar o regime socialista que governa o país desde que o ex-presidente Hugo Chávez assumiu o poder, há quase duas décadas. Com o colapso da economia, a agitação social engoliu a maior parte das grandes cidades e confrontos violentos, saques e incêndios criminosos têm se arrastado por dias no interior do país. Até mesmo os pobres — que há tempos formam a base do governo socialista — foram às ruas quando serviços e produtos básicos deixaram de chegar às favelas do país.
Os convites para protestos promovem uma dissidência pacífica, mas os manifestantes endureceram suas táticas ao baterem de frente com a polícia. Impedidos de marchar na capital, eles erguem barricadas com lixos e detritos para bloquear o trânsito. Eles atiram pedras e coquetéis Molotov na guarda nacional em confrontos que se arrastam pela noite. Ônibus e edifícios do governo foram incendiados.
Após dois meses e meio de manifestações que deixaram 70 mortos e milhares de feridos e presos, a principal exigência da oposição — novas eleições — ainda não aparece no horizonte. Pizarro, um dos principais defensores das manifestações, alerta que a mudança será lenta e que “as ruas são um meio, não o fim”.
Mas a massa pacífica está se dispersando lentamente para continuar com a vida. Os restaurantes permanecem abertos nos bairros relativamente prósperos de Caracas enquanto confrontos sangrentos são travados a poucas quadras de distância. Por toda a cidade, alguns moradores das favelas e trabalhadores dizem não ter notícias sobre protestos. Outros contam que evitam participar de manifestações por medo, cansaço ou simplesmente pela necessidade de ganhar dinheiro para sobreviver.
Os que sobram, em grande parte, são militantes cada vez mais acostumados ao perigo. Novas cenas de violência continuam inundando as páginas do Facebook e do Instagram em meio ao aumento do número de mortos e feridos. Imagens sangrentas são postadas todos os dias.
Na semana passada, um manifestante de 17 anos foi morto na capital a passos de distância de Pizarro, o deputado. O parlamentar, que estava tranquilo e eloquente na véspera do ocorrido, estava agora tremendo ao falar com os jornalistas.
“Para que isso deixe de acontecer, precisamos mudar esse país”, disse ele em lágrimas.
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