Por Ezra Fieser e Pablo Gonzalez.
Empresas da América Latina não têm conseguido resistir às baixas taxas de juros.
Com o corte dos juros pelos bancos centrais e investidores famintos por retorno, as empresas voltaram aos mercados de dívida no país e no exterior nas últimas semanas. Deixando de lado a desaceleração econômica e a incerteza política na região que os mantinham à margem, esses emissores agora mudam o cenário do que tinha tudo para ser um ano lento para ofertas de títulos.
Após uma série de emissões desde o início de setembro, as vendas de dívida em dólar de empresas devem subir cerca de 30% este ano, para mais de US$ 50 bilhões, segundo a Fitch Ratings. As vendas de títulos corporativos estão perto de bater recorde no Brasil, que lidera a recuperação dos mercados de dívida local. Embora a maior parte da captação seja para administração de passivos, um aumento da alavancagem na região mostra que empresas do México ao Chile captaram recursos para financiar novos planos de investimento, sinalizando uma perspectiva otimista de crescimento.
“As empresas devem retornar ao mercado para financiar investimentos em crescimento”, disse Omotunde Lawal, gestor de portfólio da Barings, que administra cerca de US$ 4,3 bilhões em dívidas corporativas de mercados emergentes. As empresas “não estavam no mercado por várias razões, como ciclo eleitoral, recessão, etc. Portanto, os níveis de dívida haviam caído.”
É claro que algumas das maiores ofertas de títulos este ano foram de empresas que se beneficiaram dos juros baixos para refinanciar dívidas nos próximos dois anos. Esse foi o caso de algumas das maiores companhias da região, como a petroleira estatal mexicana Pemex, que vendeu US$ 7,5 bilhõesem títulos para refinanciar dívidas de curto prazo, e a gigante de carnes JBS, que emitiu US$ 2 bilhões em títulos para pagar dívidas com cupons mais altos.
“Definitivamente, grande parte disso é administração proativa de passivos”, disse Jay Djemal, diretor sênior de pesquisa de crédito para América Latina na Fitch.
No entanto, há sinais de que mais empresas estão entrando em ritmo de expansão. No mês passado, a Codelco, maior produtora de cobre do mundo, a mineradora Minera Mexico e a petroleira argentina YPF venderam dívida para financiar investimentos. Até um emissor do Paraguai, a Rutas 2 & 7 Finance, conseguiu acessar o mercado internacional com a venda de US$ 457,6 milhões em títulos de cupom zero e retorno de 5%, em operação coordenada pelo Goldman Sachs e Itaú Unibanco.
O yield da oferta da empresa paraguaia é o mais baixo de todos os tempos para um título sem grau de investimento da América Latina com prazo de pelo menos 10 anos, segundo Baruc Saez, responsável de banco de investimento do Itaú para a região.
Esse salto das emissões poderá continuar no próximo ano se a atividade econômica ganhar ritmo. A expansão econômica regional deve acelerar de 1,1% em 2019 para 2% no próximo ano, de acordo com a estimativa mediana de economistas consultados pela Bloomberg.
“À medida que o crescimento retornar a países como México e Brasil, veremos mais investimentos e empréstimos”, disse Lawal.
A relação dívida líquida/Ebitda – um indicador importante de endividamento – deve subir para 2,35 vezes no fim do ano em relação a 1,94 em dezembro de 2018. O nível de endividamento de empresas do índice MSCI Emerging Markets Latin America mostra tendência de queda desde 2016, segundo dados compilados pela Bloomberg.
Bancos centrais do México, Brasil, Peru e Chile reduziram os juros nos últimos meses para tentar impulsionar o crescimento econômico. Os custos mais baixos de financiamento levaram a um aumento das emissões de dívida local, uma tendência mais pronunciada no Brasil, onde um recorde de R$ 117 bilhões em títulos foi emitido por empresas.
Outros US$ 3,2 bilhões devem ser emitidos antes do fim do ano, segundo a XP Investimentos, maior corretora do país. Cerca de metade das ofertas será com instrumentos isentos de impostos, que não podem ser usados para refinanciamento de dívida. Bancos de investimento dizem que observam uma mudança de perfil, passando da administração de passivos para o financiamento de aquisições ou investimentos de longo prazo. Enquanto isso, investidores migram para a dívida corporativa devido às menores taxas dos títulos públicos.
“A expectativa para o próximo ano é de aumento de financiamento para investimentos e ainda maior relevância do mercado de capitais nas captações”, disse Felipe Wilberg, chefe global de mercado de capitais de dívida do Itaú.