Por Mario Sergio Lima.
Duas mulheres participarão da reunião do Comitê de Política Monetária quando o Banco Central decidir a taxa básica de juros nesta quarta-feira, fato inédito na história de uma instituição ainda atrasada nas questões de gênero.
Ao tomar posse no início do mês no comando dos Assuntos Internacionais, Fernanda Nechio tornou-se apenas a quarta mulher na diretoria do Banco Central em 55 anos, juntando-se a Carolina de Assis Barros, diretora de Administração, que assumiu o cargo em 2018. Apesar desse avanço de representatividade feminina no conselho de nove membros, menos de um quarto dos funcionários do BC são mulheres, uma percentagem que pouco cresceu última década.
“Fico feliz de já estarmos vendo isso acontecer e de fazer parte dessa tendência. A presença crescente de mulheres hoje nessas posições e o marco histórico de termos duas mulheres hoje no Copom são fatos que devem ser encarados como um processo natural e que podem servir de incentivos à entrada de novas mulheres na nossa profissão”, disse Fernanda. “Minha intenção é de continuar contribuindo nessa direção.”
Como em grande parte do mundo, o Brasil também entrou no debate sobre igualdade de direitos e representação feminina. As mulheres ocupam apenas uma fração pequena de assentos no Congresso e uma percentagem proporcionalmente baixa de cargos de liderança em empresas, enquanto ganham um salário 20% menor, em média. Elas gastam quase o dobro do tempo que os homens nas tarefas domésticas, de acordo com o IBGE.
Para Fernanda, a sub-representação de mulheres economistas e as suas redes de apoio limitadas equivalem ao mesmo tipo de desafios enfrentados pela primeira geração de estudantes universitárias. Ela escreveu sobre ações destinadas a aumentar o número de mulheres no Fed de São Francisco, onde trabalhou anteriormente como consultora de pesquisa. E espera que mais mulheres entrem em campo no Brasil no futuro.
“É um momento importante, mas estamos em 2019, isso não deveria ser comemorado agora, deveria ter acontecido há mais tempo. Apresenta um avanço em diversidade, mas em igualdade ainda estamos muito longe”, diz Luciana de Oliveira Ramos, professora da FGV Direito e especialista em questões de gênero.
As barreiras de entrada estão entre os primeiros desafios que as mulheres devem enfrentar, segundo Andrea Chamma, ex-vice-presidente do Bank of America Merrill Lynch e atual membro do conselho em várias empresas. Para serem promovidas, as mulheres muitas vezes precisam trabalhar mais do que os homens e comprovar desempenho, enquanto eles são muitas vezes promovidos apenas na expectativa, disse ela.
O que diz nossa economista
“Quando comecei a trabalhar como economista no final dos anos 90, era muito comum eu ser a única mulher na sala quando visitava empresas para falar com executivos sobre as perspectivas econômicas. A mensagem implícita parecia ser que as mulheres eram boas como conselheiras, mas não como tomadoras de decisão. Ter mais mulheres no Copom parece ser um sinal – ainda que seja incipiente – de que essa mensagem está finalmente mudando”
– Adriana Dupita, economista da Bloomberg para América Latina
Apesar desses obstáculos, as mulheres alcançaram alguns dos postos mais proeminentes do mundo na área econômica. Janet Yellen tornou-se a primeira a dirigir o Federal Reserve, enquanto Christine Lagarde foi escolhida para chefiar o Banco Central Europeu, depois de comandar o Fundo Monetário Internacional.
No Brasil, Fernanda e Carolina terão a tarefa crucial de ajudar a definir a política monetária em um período de desaceleração do crescimento e diversos riscos globais. Ao alcançar posições de poder, as mulheres também podem mudar as culturas do local de trabalho para permitir mais diversidade, disse Carolina.
“Quem alcança postos de liderança possui um papel decisivo na construção de ambientes que favoreçam a inserção das mulheres”, disse Barros. É importante “inspirar pelo exemplo, encorajar as mulheres a ter um plano de voo e acreditar em seu potencial para conquistá-lo”.